Poucos devem lembrar, mas após o encerramento do primeiro ato pró-impeachment da presidenta Dilma Rousseff (PT), realizado na avenida Paulista em 15.3.2015, um domingo, o governador paulista Geraldo Alckmin (PSDB) deu carta branca para a direção do Metrô paulistano liberar gratuitamente, por cerca de dez minutos, o acesso aos trens na estação Trianon-Masp, com a justificativa de evitar tumultos que pudessem resultar em feridos nas bilheterias e nas catracas. Além disso, para atender ao súbito aumento de demanda, segundo relato da Polícia Militar (leia abaixo em nota do portal R7) houve ampliação da composição da Linha Verde de 12 para 17 trens.
Nas redes sociais, em memes e posts, não foram poucos os que fizeram chacota, afirmando que o tumulto nas bilheterias foi causado pelo fato de os manifestantes serem majoritariamente de classe-média alta ou ricos e que, portanto, não tinham o hábito de utilizar transporte público ou desconheciam os benefícios diários do Bilhete Único.
Claro, a difusão da imprensa foi tão diminuta, e a sucessão de episódios esdrúxulos resultantes da polarização política deflagrada naquele início de 2015 foi tamanha, que o episódio de “generosidade” do governador tucano caiu no esquecimento da opinião pública. Mas a catraca livre (sonho de consumo dos militantes do MPL) destinada aos manifestantes da marcha pró-impeachment daquele longínquo domingo ainda está registrada em sites de alguns veículos de imprensa, como é possível atestar nos links abaixo.
Medida consensual entre Geraldo Alckmin e o prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT) validou, no último sábado (9), o aumento das tarifas de trem, ônibus e metrô de R$ 3,50 para R$ 3,80. Um dia antes, protesto organizado pelo Movimento Passe Livre São Paulo, realizado no centro da cidade, terminou em confronto entre manifestantes e a Polícia Militar. Programado para ter início às 17h desta terça-feira (12), o 2° Grande Ato Contra o Aumento teria início na Praça do Ciclista, situada no final da avenida Paulista, na altura do cruzamento com a rua da Consolação.
Como atesta publicação da página do coletivo independente Jornalistas Livres (saiba mais), cerca de uma hora antes, por volta de 16h10, centenas de homens da PM, dezenas de viaturas, – algumas da Rota –, motocicletas da Rocam e até o chamado Tanque Guardião – veículo militar, blindado, semelhante aos “caveirões” da PM do Rio de Janeiro, que custou aos cofres públicos cerca de R$ 5 milhões, cada – já estavam de prontidão na Praça do Ciclista, e no entorno das duas grandes vias públicas, para proibirem o acesso ao ponto de concentração dos manifestantes, divulgado no último sábado em evento criado, pelo MPL no Facebook.
Em 15 de março de 2015, no encerramento do protesto, Alckmin esbanjou espírito democrático em sua conta oficial do Twitter: “Hoje, foi mais um dia inesquecível para a história democrática brasileira. São Paulo, assim como a população de muitas cidades, manifestou-se espontânea, livre e pacificamente contra os rumos do País. A democracia sai fortalecida quando pessoas livres tornam públicas suas opiniões”, afirmou o tucano.
Naquele domingo de março de 2015, cidadãos vestidos com camisetas da CBF, muitos altivos por defender a ética e outros, saudosos da ditadura, fizeram questão de tirar selfies com integrantes da PM. Nem vestígio de cassetetes, bombas de efeito moral, gás-lacrimogênio, spray de pimenta, bala de borracha ou tocaias da corporação para evitar a concentração de manifestantes no vão livre do Masp.
Infelizmente nesta terça-feira, a julgar pela conduta da corporação comandada pelo tucano, não há vestígios do espírito democrático manifestado por Alckmin no começo de 2015. O protesto de hoje ainda está em curso. Às 20h05, no fechamento deste texto, o previsível confronto entre PM e manifestantes recrudescia. O desfecho deste segundo ato, provavelmente, repetirá a velha narrativa das manifestações ocorridas em solo paulistano desde as jornadas de junho: aprovação seletiva do direito à livre manifestação e mais um capítulo da escalada de repressão policial que, se não for estancada, com estratégias razoáveis, ponderadas e pautadas no respeito aos valores democráticos da Constituição de 1988, pode resultar em tragédia.
Duas catracas, duas medidas. Até quando?!
Em tempo: antes da manifestação desta terça-feira, o prefeito Fernando Haddad solicitou ao Ministério Público Estadual que monitore eventuais excessos cometidos pela PM durante os protestos (leia). A operação de guerra deflagrada hoje contra os manifestantes requer diálogo entre governador, prefeito, movimentos sociais e ações imediatas do Poder Público, em defesa do direito democrático à live manifestação, a fim de evitar que convulsões sociais, como as deflagradas após as truculentas ações da PM em 13 de junho de 2013, se repitam e deem início a um novo ciclo de violência, neste início de 2016, que já insinua perigosas animosidades.
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