Protótipos do mundo como ele deveria ser

Foto: Adriana Komives
Foto: Adriana Komives

Viajando pelo Brasil a trabalho, passei por dois lugares que me parecem ser sementes de um mundo em porvir. Um deles, em Pernambuco, está se formando atualmente por conta de um grupo de pais de alunos de uma escola Waldorf que resolveram se juntar e criar um condomínio ecológico para nele viver. Tudo isto ainda está começando, os lotes comprados ainda nem foram atribuídos (o serão por sorteio), a infra-estrutura está para ser iniciada com criação de ruas, aterro de um rio que se enche demais na chuva, mas já funciona o plantio em permacultura, a estação de tratamento de esgoto local, com tecnologia francesa e totalmente biodegradável e a escola para as crianças.

Logo mais, quem comprou os lotes na primeira leva poderá começar a construir, obedecendo as regras básicas : nada de cercas entre as casas, os telhados têm que ter espaço para os painéis solares e a triagem do lixo é obrigatória.

No plano de urbanização está prevista uma clínica de medicina regular e antroposófica, uma casa para idosos, um clubinho junto à represa, uns apartamentos que poderão ser alugados e cuja renda reverterá para o condomínio. O regimento vem sendo escrito pelo grupo que lidera a realização do projeto, e toda esta aventura está aberta à contribuição de quem venha ali morar. É gente que se conhece, pais que procuram dar aos filhos uma educação integrada com a natureza, para quem a alma e o corpo andam juntos e a criatividade é bem-vinda. As questões de segurança ainda terão que ser debatidas, haverá um pagamento de condomínio mais ou menos caro segundo as decisões que forem tomadas pelos moradores.

O outro lugar é uma ecovila junto a um centro holístico de cura. Fica na Bahia, de frente para um rio que deságua no mar aberto, em uma praia tão virgem quanto àquela que Cabral viu quando aqui chegou. Neste lugar, você pode vir estudar ou só passar uns dias, pode vir fazer um curso ou ficar morando um tempo. As coisas acontecem como devem acontecer. Às seis da manhã, com o nascer do sol, você também se levanta e vai fazer yoga, depois meditação e assim o dia começa saudável. A comida servida no restaurante do centro é deliciosamente vegana, nada de sofrimento animal para dentro do seu corpo. As pessoas trabalham nos projetos de permacultura, de bio-construção ou no laboratório de cosméticos e farmacêuticos biodegradáveis. Você não pode usar químicos pois não se deve fazer mal ao corpo da Terra, à pureza das águas que são aquelas em que você se banha. Os banheiros são secos e contribuem para a fertilidade do solo.

Muitos jovens estão ali, interessados em espiritualidade. Não há álcool nem drogas, pois não é preciso isto para se dançar e cantar nas noites de lua cheia em volta da fogueira ou no barzinho local. Cada pessoa encontra um trabalho que lhe convém e se torna útil à micro-sociedade. Mas o que mais me chamou a atenção foi o brilho nos olhos das pessoas, como que iluminadas pelo amor que rege o lugar. Amor a si, amor à Terra, amor ao outro. Parece bobo ? Mas não é. Quando se vive regido pela idéia/sentimento/certeza de que o que é bom para o outro é bom para si, muda uma chave social. O equilíbrio sempre instável se encontra no movimento de busca de si, de idéias para que esta consciência se expanda, pelas mãos e olhos dos jovens, de crianças que ali crescem integradas com os elementos que compõem o Universo. O mundo exterior tem também como chegar, pela internet que é lenta mas rola, pelas pessoas que vêm de fora, pelos moradores de um bairro simples há alguns quilômetros dali com quem existe troca de trabalho e de ação social.

Uma amiga ali encontrada me disse: somos uma geração revolucionária. Talvez ainda alcancemos esta nova que está silenciosamente ganhando espaço. Como disse Dona Naná para mim em Olinda, o bem vem comendo pelas bordas.

Podes crer.


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