Depois de circular por Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Curitiba e Tiradentes (MG), Matheus Nachtergaele retorna a São Paulo com o espetáculo Processo de Conscerto do Desejo, apresentado em curta temporada na capital paulista em maio de 2016. Concebida a partir de poemas escritos por sua mãe, por onde passa a peça tem comovido o público. Poeta amadora, Maria Cecília Nachtergaele tirou a própria vida em 1968, deixando o filho órfão quando ele tinha apenas três meses de idade.
Na montagem idealizada e dirigida pelo ator, com o brilho e a intensidade usuais, Nachtergaele dá voz à mãe que não conheceu. Acompanhado apenas da música de Luã Belik e Henrique Rohrmann, explora o universo lírico de Maria Cecília como quem lida com uma revelação. Segundo ele, os poemas foram a forma mais incisiva de se “encontrar” com a mãe, desenvolvendo a partir daí uma memória afetiva que não pôde construir. “Isso porque, finalmente, era a voz dela. Eram escritos, mas era a voz dela, cheia de subjetividade, de ironia, de tristeza e de alegria também”, explica o ator em entrevista à CULTURA!Brasileiros.
Além desse conteúdo textual, para construir o espetáculo Nachtergaele também contou com depoimentos de pessoas que conviveram com Maria Cecília. Essas memórias, no entanto, sempre deixavam escapar só o lado bom de sua mãe. Como o sucesso da peça acabou trazendo familiares distantes à plateia, o ator afirma que recentemente descobriu o lado mais zangado de sua mãe: “Ela era muito inteligente e artística, mas também muito explosiva, tinha acessos de ira”, diz.
Em meio a esse processo de descobertas, Nachtergaele soube ainda da existência de um bilhete de despedida deixado, em seu berço e a seu lado, por Maria Cecília. “Essa carta ficou retida nos autos da polícia, e ando aqui pensando se devo ou não ir atrás dela. Aliás, me espantou muito isso não ter sido entregue a mim, porque tudo da mamãe está comigo.”
Processo de Conscerto do Desejo é a realização de um desejo antigo de Nachtergaele. Desde que começou a fazer teatro na adolescência, ele tinha vontade de transpor os poemas de Maria Cecília para o palco, mas acreditava que não seria capaz de fazer algo bonito ou, temor maior, que seria doloroso demais lidar com essa criação.
Em 2015, a organização do Festival de Inverno Ouro Preto e Mariana convidou o ator para fazer a abertura do evento. Como ele não tinha nenhum espetáculo pronto, resolveu arriscar e finalmente prestar a homenagem a sua mãe. Decisão que foi cravada com a conclusão do tom correto que ele deveria impor ao espetáculo.
“Não acho que a arte é feita com a emoção à flor da pele. Ela é feita com a memória bonita de uma emoção, com o sentimento da emoção que move a obra. Trinta anos depois de ter recebido os poemas (os textos foram entregues ao ator quando ele tinha 16 anos), soube que era o momento. Esperei as coisas entrarem em um estágio de maturação em que eu pudesse simbolizar artisticamente o meu sofrimento e que também pudesse realmente fazer um espetáculo que não fosse doentio ou neurótico.”
A nova temporada paulistana de Processo de Conscerto do Desejo segue em cartaz até 30 de abril no Teatro Raul Cortez, com apresentações de sexta a domingo.
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