É nos fundos da Escola Estadual Caetano de Campos, no palco de um pequeno teatro, que se encontram cerca de 90 jovens. Sentados e empunhados de instrumentos musicais, eles tocam isoladamente, cada um deles. Há violinos, clarinetes, trombones, violoncelos, baixos acústicos e, provavelmente, mais alguns desses instrumentos hipnotizantes que me fogem à memória.
Até às 6 horas da tarde de uma terça-feira, fica difícil definir quais timbres se destacam mais. Eles se sobressaem uns aos outros e ainda não há harmonia. Por um breve momento, meninos deixam de lado seus violinos para se interarem de uma conversa ou outra com os amigos ao redor. Uma das meninas, uma violoncelista, está concentrada em manter uma postura impecável e os olhos atentos em sua partitura. Sentado, à penumbra da plateia, está o maestro Cláudio Cruz, que sozinho folheia calmamente as páginas de sua partitura.
Meia hora depois, o cenário do mesmo teatro e o som mudam. Há silêncio. Cruz sobe tranquilamente os degraus que o levam ao púlpito, onde logo mais seus braços ganharão uma cadência que só maestros e músicos entendem e os olhos leigos se admiram. O maestro cede à palavra e tão logo os instrumentos se rendem a uma harmonia straussiana e o Danúbio Azul atinge os ouvidos, os pulmões e todo o teatro.
Formada por 90 jovens entre 13 e 26 anos, a Orquestra Sinfônica Jovem do Estado de São Paulo (OSJESP) ensaia todos os dias das últimas duas semanas para a última apresentação do ano, quando no dia 22 de dezembro subirá ao palco da Sala São Paulo, no antigo centro da cidade, para tocar com o brasileiro Antonio Meneses. Nome representativo da música erudita no Brasil, Meneses hoje mora na Suíça e tornou-se figura presente em orquestras importantes mundo a fora, como a Filarmônica de Berlim, a Sinfônica de Viena e a Orquestra Concertgebouw de Amsterdã, entre tantas outras.
Há dois anos, a OSJESP passou por uma importante reestruturação encabeçada pelo seu regente titular Cláudio Cruz. Com uma trajetória na música erudita que somam mais de 30 anos e prêmios importantes na área, Cruz foi convidado pela Santa Marcelina Cultura, instituição que administra a Escola de Música do Estado de São Paulo Tom Jobim (EMESP), a dirigir e a reestruturar a orquestra formada hoje por 90 bolsistas.
O trabalho trouxe mudanças importantes que beneficiaram um grupo maior de jovens aspirantes à música. Há dois anos, a orquestra era formada por 50 jovens que recebiam bolsas de R$ 400. Hoje, os noventa músicos, todos também matriculados na EMESP, recebem uma bolsa auxílio de R$ 1.000, que, segundo o Cruz deve aumentar para o ano de 2014. “É uma ajuda importante para que eles possam se dedicar aos estudos e aos ensaios”, aponta. Aumentar o número de jovens também possibilitou um horizonte maior: “Agora somos uma orquestra que pode tocar qualquer repertório, barroco, clássico, romântico e moderno. Podemos tocar qualquer peça feita para uma sinfônica e isso é muito importante”.
Com a reestruturação também vieram convites de peso. Este foi o segundo ano consecutivo da OSJESP na Alemanha. Neste ano, eles se apresentaram no Young Euro Classic, um dos mais importantes festivais de orquestras jovens que tem sede em Berlim. Lá, os noventa músicos brasileiros e o maestro Cláudio Cruz foram ovacionados após tocarem “Bachianas”, de Villa Lobos. “Acredito que fomos uma das melhores a se apresentarem em Berlim esse ano. Foi um sucesso inacreditável. Na semana passada, tivemos um teste interno onde avaliamos cada músico individualmente. E eu fiquei encantado. Eles estão melhorando muito e o trabalho tem surtido efeito na vida deles”, avalia.
Outro importante incentivo foi a criação do Prêmio Ernani de Almeida Machado, patrocinado pelo escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados. O prêmio é concedido anualmente aos cinco bolsistas com melhor desempenho, o principal deles é de R$ 60 mil, o maior concedido a uma orquestra jovem no Brasil e que deve ser utilizado em estudos no exterior. Os outros quatro bolsistas recebem o prêmio de R$ 15 mil cada, que devem ser investidos na compra de instrumentos ou no aprimoramento musical.
O violoncelista Matheus Silva Mello, de 18 anos, e a clarinetista Ariane Rovesse de Alencar Freitas, de 20 anos, foram dois dos vencedores do prêmio deste ano. Cada um ganhou R$ 15 mil. “Vou comprar um novo violoncelo”, conta Matheus que começou a estudar música ainda criança com o pai. Vindo de uma família de músicos, Matheus também se aproximou da música clássica na igreja que frequenta com a família. O pai domina instrumentos como o piano, trompete, violino e saxofone, já a mãe toca trombone também nas apresentações da igreja. Ao entrar para a EMESP – Tom Jobim, em 2012, e para a OSJESP, Matheus atingiu certas conquistas que não esperava tão cedo. Ir para a Alemanha foi uma delas. “A música é tudo o que eu tenho. Nunca pensei em fazer outra coisa”, conta o jovem Matheus, que sonha em ser solista e estudar música no país que conheceu pela primeira vez este ano.
Durante o ensaio, Ariane Rovesse de Alencar Freitas fica ao fundo no palco. Com os cabelos presos e atrás dos óculos de grau, Ariane à primeira vista parece ser uma menina tímida que encontrou uma forma de se expressar na música. Mas a voz doce não mostra hesitações e, articulada, Ariane fala sobre como conheceu o instrumento que toca desde pequena até hoje, o clarinete e avalia tudo que conquistou através da música. Nascida em Belo Horizonte (MG), aos 12 anos de idade Ariane e outros colegas foram convidados a tocarem na tradicional banda do seu colégio. “Fui mais por curiosidade e comecei a gostar”, conta.
Hoje, Ariane acaba de concluir o segundo ano no Bacharelado em Clarinete pela Universidade de São Paulo (USP). No seu segundo ano na OSJESP, Ariane já foi duas vezes a Alemanha e os planos de cursar um Mestrado em Música fora do país se aproximam cada vez mais. “Eu nunca imaginei conseguir as coisas que eu consegui. Eu nunca tinha entrado na Sala São Paulo e a primeira vez que eu fiz isso foi para tocar. E tão cedo, eu já saí do país. Então eu era uma menina que saiu de Minas Gerais, da casa dos pais, que só estudava clarinete e, hoje, ter esse retorno é incrível”, conta animada. “Eu sempre gosto de falar que desde que eu vim para São Paulo, cresci em termos técnicos, mas cresci mesmo como artista. Trabalhar com música me fez amadurecer”, completa.
Serviço
Orquestra Sinfônica Jovem do Estado de São Paulo e solista convidado Antonio Meneses
Sala São Paulo – Praça Júlio Prestes, 16, Luz
Dia 22 de dezembro, domingo, às 17h
Ingressos: R$10 (inteira) e R$5 (meia)
Duração: Aproximadamente 90 minutos
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