Nobre mecenas

castelo
A propriedade na região do Lácio que recebe encontros e apresentações de música erudita
Quando a italiana Giada Ruspoli, radicada no Brasil desde 1975, começa a falar sobre o passado de sua família, sentimos como se estivéssemos entrando em um livro de história ou em um conto sobre reis e príncipes. Descendente de nobres, papas e de uma santa (Giacinta Marescotti), Giada vem de um clã da “aristocracia preta”, como explica: “É diferente de monarquia porque é ligada ao papa. Ou seja, todos os nossos bens e heranças vêm dos papas”. Entre esses bens, o mais notável é o Castelo Ruspoli, em Vignanello, na Itália, que de fortaleza no século 9 foi transformado em convento beneditino e, posteriormente, doado pelo papa Paulo III (Alessandro Farnese) para sua sobrinha. De geração em geração, chegou às mãos de Francesco Maria Ruspoli, importante mecenas do século 18, quando se iniciou a forte relação entre o Castelo Ruspoli e a música barroca. Relação que tem continuação nos dias de hoje pelas mãos de Giada.

Foi na propriedade de Vignanello que Francesco hospedou importantes nomes da música clássica e barroca no século 18, como Scarlatti, Caldara, Hottetere e, o mais célebre deles, Gerog Friedrich Händel – nos dois anos que passou no castelo, ele compôs cerca de 50 cantatas e uma de suas principais obras, o oratório La Resurrezione. Foi com essa história em mente que, em 2009, cerca de dez anos após herdar o castelo junto à irmã, Giada decidiu criar o Prêmio Príncipe Francesco Maria Ruspoli, dedicado à música barroca. Após trabalhar muitos anos com artesanato, incentivando o intercâmbio cultural entre Brasil e Itália, Giada teve, em solo brasileiro, a inspiração para criar o concurso. “A Renata Pereira, do quarteto Quinta Essentia, me contou que estava fazendo mestrado sobre Hottetere e Ruspoli. Pensei que, se estavam estudando Ruspoli como um mecenas importante da música, era preciso fazer alguma coisa.”

Assim, Giada se tornou também uma espécie de mecenas do mundo contemporâneo. Levou para a Itália, para participar de palestras e eventos, músicos e pesquisadores brasileiros – como Zuza Homem de Mello – e se dedicou a organizar o prêmio de música barroca na Itália e, agora, no Brasil. Em sua sexta edição europeia (aberta para participantes de todo o mundo) e na primeira brasileira (aberta para participantes da América Latina e Caribe), o concurso se estabelece como um importante incentivo para instrumentistas e pesquisadores desse nicho da música clássica. O vencedor da primeira edição nacional, o chileno José Manuel Izquierdo Köning, além de receber o valor de R$ 3 mil, poderá acompanhar de perto a premiação da edição europeia em outubro, realizada no Castelo Ruspoli.

Giada, que estabeleceu laços fortes com o Brasil ao longo das décadas, mostra que uma nobre europeia pode se sentir em casa tanto no velho como no novo continente. “Estou sempre tentando juntar a cultura dos dois lugares. Afinal, isso é a minha história.” E a italiana mostra também que sua maior herança, ao menos para o mundo, não são castelos, propriedades ou dinheiro, mas sim a disposição de seguir incentivando a cultura, assim como fizeram alguns de seus antepassados.


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