‘Pequeno Segredo’ é um dos piores filmes dos últimos anos, diz crítico da Folha

Júlia Lemmertz e Mariana Goulart em cena do longa - Foto: Divulgação
Júlia Lemmertz e Mariana Goulart em cena do longa – Foto: Divulgação

O jornalista Alcino Leite Neto, ex-editor dos cadernos IlustradaMais! e hoje responsável pela Editora Três Estrelas, do Grupo Folha, fez uma avaliação bastante dura sobre o filme “Pequeno Segredo” para o jornal Folha de S.Paulo na edição desta terça-feira (13). “Pequeno Segredo” foi escolhido pelo júri reunido pelo Ministério da Cultura para representar o Brasil no Oscar, mas, segundo Alcino,  é “um dos piores filmes do cinema brasileiro dos últimos anos”.  

Segundo Alcino, o filme “é um oceano de clichês e sentimentalismo. A narrativa é piegas, as imagens são piegas, a banda sonora é piegas, a direção é de uma platitude sem fim. Nem a talentosa Júlia Lemmertz salva-se do naufrágio, enroscada em uma encenação monocórdia e maçante. Como já disseram um dia, um filme não se faz com boas intenções. É preciso talento. O diretor David Schurmann tem mais das primeiras que do segundo, infelizmente”.

De acordo com o crítico da Folha, o diretor “é incapaz de encontrar um enquadramento que não repita cartões-postais ou imagens de TV ou publicidade. Falta-lhe pulso para obter dos atores uma grande verdade por trás dos pequenos segredos”. O roteiro do filme se baseia em um livro escrito por Heloísa Schurmann, irmã do diretor, sobre a adoção, pela família, de uma menina que sofre um mal incurável.

Alcino diz que “a trama se desenvolve por tempos justapostos, passado e presente. Não é coisa fácil de fazer no cinema. E as soluções encontradas pelo roteiro não são felizes: tudo segue aos solavancos, as situações parecem repetitivas, os personagens se perdem, alguns são apenas espectros, como os irmãos Schurmann”.

Por isso, diz o crítico, a escolha do júri do Ministério da Cultura foi muito infeliz: “Havia 16 filmes para a escolha do júri. Muitos deles abordam temas sociais fortes, como a ganância dos empresários, a luta pela sobrevivência, a repressão policial nas favelas, o racismo, o enfrentamento com a instituição psiquiátrica, o desespero individual e o esfacelamento das famílias em face da pobreza. Mostram um Brasil conflituoso, mas enérgico, determinado e vibrante. O júri, porém, preferiu mostrar ao Oscar um país onde os sentimentos predominam sobre a política, os conflitos são mais de ordem psicológica que social, e valores dominantes são a generosidade, o carinho, o amor e a família. Sinal dos tempos”.

Essa opinião, contudo, não foi compartilhada por outro jornalista do Grupo Folha. Na opinião de Tony Goes, do site de F5, “Pequeno Segredo” talvez seja um “candidato mais forte do que Aquarius para representar o Brasil no próximo Oscar”. Na opinião do jornalista, o presidente da comissão, Bruno Barreto, “sabe que a Academia prefere narrativas mais hollywoodianas” e alega que  “Pequeno Segredo tem uma história edificante. E conta com nomes de prestígio internacional no elenco”.

Segundo Goes, “o próprio Bruno Barreto quis deixar claro que não escolheram necessariamente a maior obra-prima entre os 16 inscritos, mas um filme que dialogasse mais com os critérios da Academia”, e diz que “talvez a controvérsia nem tivesse começado se Marcos Petrucelli, apontado pelo Ministério da Cultura, tivesse renunciado à comissão. O crítico, que atacou com veemência o protesto político feito pela equipe de Aquarius no Festival de Cannes, poderia admitir que sua presença levantava questões e se retirado com elegância. Mas era direito dele ficar, e ficou”.

Integravam o júri do Ministério da Cultura Adriana Scorzelli Rattes, ex-secretária de Cultura do Rio de Janeiro; Luiz Alberto Rodrigues, sócio-diretor da Panda Filmes; George Torquato Firmeza, Diretor do Departamento Cultural do Itamaraty; Marcos Petrucelli, comentarista de cinema da rádio CBN; Paulo de Tarso Basto Menelau, da Moviemax; Silvia Maria Sachs Rabello, presidente da Abeica (Associação Brasileira de Empresas de Infra-estrutura de Indústria Cinematográfica e Audiovisual); Sylvia Regina Bahiense Naves, assessora técnica em Acessibilidade do Audiovisual  da SAV do MinC; e os cineastas Carla Camurati (“Carlota Joaquina, Princesa do Brasil”) e Bruno Barreto (“O que É Isso, Companheiro?”).

Os apoiadores do governo Michel Temer desencadearam uma intensa campanha virtual contra o filme Aquarius, de Kleber Mendonça Filho, que já venceu quatro festivais de cinema no exterior, depois que a equipe do filme protagonizou um protesto contra o impeachment da ex-presidente Dilma Roussef no Festival de Cannes, em maio. Marcos Petrucelli, um dos integrantes do júri do Ministério da Cultura, criticou o diretor. Dois diretores de cinema abriram mão de concorrer à indicação para o Oscar em apoio a Kleber Mendonça Filho: seu conterrâneo Gabriel Mascaro, de Boi Neon, e Anna Muylaert, de Mãe Só Há Uma. Ana e Mascaro anunciaram que não participariam mais da peneira realizada pelo Ministério da Cultura em solidariedade a Mendonça Filho e a equipe de Aquarius.   

Após a escolha de “Pequeno Segredo”, Anna Muylaert, por meio de sua página de Facebook, criticou a decisão: “Do meu ponto de vista o maior prejudicado não foi nem é Kleber e sua equipe e sim o cinema brasileiro. Houve sim uma grande batalha nos últimos anos em várias esferas, Ancine – Manoel RangelEduardo Valente sem falar do Cinema do Brasil – pessoas e entidades que vem lutando tanto pela qualidade do cinema brasileiro quanto por sua visibilidade no exterior. Ora Kleber Mendonca fez um filme – goste-se ou não – importante, extremamente bem dirigido e que conquistou uma vaga na competição de Cannes – a mais difícil do mundo. Alem disso, está tendo sucesso de público e de crítica no seu país de origem. Escolher outro filme para representar o Brasil agora – um filme que ninguém viu – não é apenas uma derrota para Aquarius – Filme , é antes de tudo uma mudança de rumo nos paradigmas de qualidade que viemos construindo todos nós juntos há anos. O que esperar do futuro? Que os amigos de Michel Temer sejam daqui pra frente os grandes autores do cinema brasileiro – independentemente de sua qualidade ou mesmo de sua representatividade junto ao público? A resposta é triste e é: provavelmente sim”.

Kléber Mendonça Filho também se manifestou pelo Facebook: “É bem possível que a decisão da comissão esteja em total sintonia com a realidade política do Brasil, ou seja, é coerente e já esperada. Para além de decisões institucionais via Governo Brasileiro, AQUARIUS tem conquistado internacionalmente um tipo raro de prestígio, e isso inclui distribuição comercial em mais de 60 países enquanto já se aproxima dos 200 mil espectadores nos cinemas brasileiros, com um tipo de impacto popular também raro. Mais ainda, é um filme que já faz parte da cultura e desse tempo, num ano difícil no nosso país. No final das contas, AQUARIUS é um filme sobre o Brasil, que está no filme da maneira mais honesta possível.”

No número 3 de CULTURA!Brasileiros dedicamos 20 páginas a Aquarius, em entrevistas com Sonia Braga, capa da edição, e Kleber Mendonça Filho. Leia excertos inéditos na versão impressa publicados em nosso site. E, na edição 99 de Brasileiros, de agosto de 2015, a diretora Anna Muylaert foi tema da reportagem de capa, na ocasião em que lançou Que Horas Ela Volta?, antecessor de Mãe Só Há Uma.


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