Economista que comandou por mais tempo o Ministério da Fazenda durante toda a história da República, Guido Mantega assumiu a pasta em 27 de março de 2006, no primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, e ficou no cargo até 31 de dezembro de 2014, no final da primeira gestão de Dilma Rousseff. Ao longo desse período, o país cresceu em média 3,2% ao ano, contra 2,3% no governo Fernando Henrique Cardoso.
A diferença entre as administrações petista e tucana deve ser creditada à profunda mudança na política econômica, com a substituição de uma orientação ortodoxa, focada na obtenção de grandes superávits fiscais para permitir o pagamento dos juros, por uma estratégia desenvolvimentista, voltada para o crescimento do País.
Após sua posse, Mantega reduziu a meta de superávit primário de 3,6% para 2,8%, o que permitiu a mobilização de recursos para estimular a economia. Durante sua gestão, o País criou 16,6 milhões de empregos formais — a taxa média de desemprego caiu de 10%, em 2006, para 4,8%, em 2014. Esse crescimento foi alcançado sem colocar em risco o equilíbrio nas contas externas do País. Enquanto o governo FHC teve de recorrer ao FMI (Fundo Monetário Internacional) em 1998, 2001 e 2002, no governo Lula a situação se alterou radicalmente: o Brasil quitou a sua dívida com o FMI em 2005. As reservas do País aumentaram de US$ 37,8 bilhões, em 2002, para US$ 376 bilhões, em 2014. Isso permitiu que, em abril de 2008, a agência de avaliação de rating Standard & Poor’s concedesse ao Brasil o título de grau de investimento.
O maior desafio da gestão Mantega ocorreu logo em seguida: a crise mundial que se seguiu à quebra do Lehman Brothers, em setembro de 2008. Em 2009, o PIB brasileiro caiu 0,3%. Contudo, as medidas de estímulo à economia permitiram que a economia se recuperasse rapidamente, e em 2010 o País cresceu 7,5%, gerando mais de 2 milhões de empregos. Esse crescimento vigoroso impulsionou a candidatura de Dilma Rousseff à Presidência, que acabou eleita com 56% dos votos.
Mantido na pasta da Fazenda por Dilma, Mantega se viu às voltas com a persistente estagnação da economia mundial. Ele pôs em prática então um grande programa desenvolvimentista. O Banco Central reduziu a taxa básica de juros de 12,5% para 7,25% ao ano entre agosto de 2011 a abril de 2013 – o menor valor alcançado pela Selic desde sua criação, em 1986.
Além disso, o governo disponibilizou R$ 400 bilhões ao BNDES, para oferecer linhas de crédito às empresas. Mantega também editou medidas de proteção à indústria nacional, desonerou a folha de pagamento de 42 setores da economia e e lançou um enorme pacote de concessões para estimular investimentos em rodovias, portos e ferrovias.
Mas surgiram contratempos: a longa seca que atingiu o país encareceu os preços dos alimentos e os custos da energia elétrica. O Banco Central reagiu e começou a aumentar os juros, desarticulando toda a estratégia de Mantega, pois isso provocou um esfriamento da economia em 2014.
A partir daí, o ministro, que vinha sendo muito atacado por economistas ligados ao setor financeiro por suas medidas para reduzir os juros, passou a ser criticado também pelos empresários do setor industrial, que tanto tinham se beneficiado das medidas de fomento. No final de 2014, sob cerrado ataque das entidades empresariais, Dilma decidiu substituir Mantega por Joaquim Levy, secretário do Tesouro Nacional no governo Lula. Levy adotou uma política de austeridade fiscal que levou o PIB brasileiro a cair 3,8%, o pior resultado desde 1990, contrariando as promessas de campanha de Dilma e fragilizando o seu governo.
Depoimento
Na manhã desta segunda-feira (9), o ex-ministro da Fazenda foi levado coercitivamente até a Superintendência da Polícia Federal em São Paulo, onde chegou por volta das 9h45, para depor em um inquérito sobre irregularidades em processos no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), que estão sendo investigadas pela Operação Zelotes. O Carf é o órgão vinculado ao Ministério da Fazenda que julga recursos contra multas aplicadas a empresas pela Receita Federal.
Em novembro do ano passado, Mantega teve seus sigilos bancário e fiscal quebrados pelo juiz Vallisney de Souza Oliveira, responsável pela Zelotes, com o objetivo de investigar o relacionamento do ex-ministro com o empresário Victor Sandri, da Cimento Penha, que conseguiu reverter multas no valor de R$ 106 milhões no Carf.
Em sua defesa, Mantega esclareceu que nunca participou da escolha dos conselheiros do Carf, que eram indicados por um “conselho de notáveis” formado por funcionários do Ministério da Fazenda e da Receita Federal. O ministro da Fazenda apenas assinava as nomeações. Explicou ainda que seu relacionamento com Sandri se devia ao fato de ter vendido um terreno ao empresário, 20 anos atrás.
Em relação ao depoimento, o advogado José Roberto Batochio afirmou que “Mantega respondeu a todas as perguntas e tudo foi esclarecido”. Disse ainda que “a condução coercitiva foi totalmente ilegal e arbitrária”: “O Mantega já prestou depoimento neste mesmo inquérito. Quando foi chamado, ele foi”.
Biografia
Nascido em 7 de abril de 1949, em Gênova, na Itália, Mantega formou-se em economia na Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (USP). É professor de economia da Fundação Getulio Vargas, em São Paulo, e doutor em sociologia do desenvolvimento na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, com especialização no Institute of Development Studies da Universidade de Sussex (Inglaterra) em 1977.
Entre 1982 e 1987, Mantega foi professor de economia no curso de mestrado e doutorado da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e vice-reitor adjunto da instituição entre 1984 e 1987. Foi ainda diretor de orçamento e chefe de gabinete da Secretaria Municipal de Planejamento de São Paulo, de 1989 a 1992, durante a gestão de Luiza Erundina.
Assessor econômico de Luiz Inácio Lula da Silva de 1993 a 2002, foi um dos coordenadores do programa econômico do PT na campanha de 2002. Ápós a vitória de Lula, foi nomeado ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão, ocupando o cargo de janeiro de 2003 a novembro de 2004. Passou então a presidir o BNDES, cargo que exerceu até março de 2006, quando assumiu o Ministério da Fazenda.
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