A sensação recente dos meios acadêmicos foi o livro de Thomas Piketty, O Capital no Século 21, considerado um dos mais importantes textos de economia da atualidade. O lançamento de Thomas Piketty e o Segredo dos Ricos se debruça sobre a badalada obra, em 12 artigos que esmiúçam as ideias do economista.
Ladislau Dorbow, professor da PUC-SP e consultor da ONU, põe o dedo na sua ferida predileta: consumir tanto para quê? “Estamos administrando o planeta para uma minoria, através de um modelo de produção e consumo que acaba com os recursos naturais, transformando o binômio desigualdade/meio ambiente numa autêntica catástrofe em câmara lenta.” Dowbor encerra seu artigo listando as maiores fortunas do País, segundo a revista Forbes. Impossível não notar: essencialmente composta por bancos, empresas de comunicação, construtoras e companhias que exploram os recursos naturais. “Um divórcio crescente entre quem enriquece e quem contribui para o País.”
Há dois textos do próprio Piketty, que reforçam as provocações sobre a injustiça tributária que, no limite, enriquece os ricos e empobrece os pobres. Kostas Vergopoulos, professor da Universidade Paris 8, aprofunda a análise nos Estados Unidos, onde a desigualdade só tem crescido e até mesmo o liberal ex-secretário do Tesouro do governo Clinton, Lawrence Summers, coloca mais lenha na fogueira: “E se o capitalismo não puder ser reformado e estiver preso na armadilha da estagnação secular?”.
O jornalista Hervé Kempf escreve sobre os efeitos da desigualdade econômica no meio ambiente. Segundo ele, entre 20% e 30% da população mundial consome de 70% a 80% dos recursos retirados anualmente da biosfera. É o retrato da má distribuição de renda, uma vez que aos mais ricos não interessa consumir menos e, consequentemente, ditar um ritmo menos nocivo à natureza.
“As reformas recentes têm acentuado uma anomalia no Brasil: aumento da tributação sobre o consumo em detrimento da tributação da renda, agravando o quadro de desigualdade”, concluem Fátima Gondim e Marcelo Lettieri, auditores da Receita Federal. Segundo eles, a política tributária deve se tornar um instrumento de combate à pobreza e de redução das desigualdades sociais.
Já o professor da Unicamp Luiz Gonzaga Belluzzo explica como a crise no capitalismo foi fruto da subserviência dos governos aos ditames do capital financeiro. A mobilidade do capital financeiro associada à centralização do capital produtivo à escala mundial suscitou, de acordo com ele, surtos intensos de demissão de trabalhadores, pela “maníaca obsessão com a redução de custos”.
A “cara” do mercado financeiro é o tema de Geoffrey Geuens, da Université de Liège. A existência de revolving doors, portas giratórias entre setor público e privado, dá margem à personificação desse imperador das finanças. É muito comum que ex-presidentes de Bancos Centrais ou ex-secretários do Tesouro migrem sem cerimônia para grandes instituições financeiras, e vice-versa, o que dá uma boa medida da promiscuidade dos interesses.
As omissões na obra de Piketty são abordadas por Russell Jacoby, professor da Universidade da Califórnia. Para tanto, retoma o velho Karl Marx e mostra como teoricamente o teórico do socialismo foi muito além em sua análise da gênese da desigualdade. Jacoby faz críticas severas à, digamos, superficialidade de Piketty e suas sugestões de impor ajustes de cima para baixo.
É uma leitura que independe da obra original. Sempre bom analisar as raízes da desigualdade em um mundo onde metade da riqueza pertence a 1% da população.
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