O comércio varejista e o de bares e restaurantes lidam diretamente com o cliente final e são setores que servem de termômetro para a economia de um país. Na atual situação brasileira, com inflação e juros altos, crédito mais restrito e confiança reduzida, a busca por produtos e serviços diminui. As vendas no Estado de São Paulo tiveram o pior primeiro semestre desde 2009, com queda de 3,9% em relação ao mesmo período de 2014, de acordo com a Associação Comercial de São Paulo. Isso faz com que o lucro dos empresários caia e em alguns casos ocorra demissão de funcionários.
Em visita à Rua 25 de Março, ponto de comércio popular, nota-se desânimo. É o caso de Ivurim Peixoto, 60, dono da Peixoto Bolsas. Desde o início de 2015, ele diz que as vendas caíram cerca de 40% em relação ao ano anterior. Na tentativa de reajustar o negócio, a loja reduziu o quadro de funcionários de 20 para 12. “O mercado não permite mais erros. Estamos em momento de sobrevivência. Não é ganhar, mas reservar o que conseguiu.”
Outros comerciantes têm adotado estratégias mais radicais. Caso de Fabiano Serafim, 32, gerente do Universo das Calcinhas que, para compensar a queda de 20% a 30% no lucro, diminuiu o estoque de produtos da loja e está vendendo apenas mercadorias mais baratas. “O pessoal está segurando dinheiro.” A loja demitiu dois funcionários, ficando com 18 em atividade. No entanto, Serafim aposta que até o fim do ano as vendas melhorem.
Dados mostram queda nos dois setores da economia. Mas empresários tomam medidas ainda que restritivas com esperança de melhora
O Índice de Confiança do Consumidor (ICC) da Fundação Getúlio Vargas apontou, em julho último, o menor nível desde 2008. Para a coordenadora do estudo, Viviane Seda Bittencourt, a queda é influenciada pelo pessimismo e insatisfação em relação à economia e a piora da situação financeira das famílias.
Mas o dono do estabelecimento mais antigo da 25 de Março, Arinos Barros, 72, não sente efeitos da crise. Sua loja, o Comércio de Tecidos Moraes Machado, vende principalmente cobertores e artigos de inverno, itens que, segundo ele, saem com maior facilidade. “Os clientes de classes menos favorecidas, quando sentem fome e frio, gastam.”
Cenário
Em âmbito nacional, os números corroboram para uma visão negativa do comércio. As vendas tiveram queda de 4,5% em maio, comparado com o mesmo mês de 2014, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É a maior retração, considerando todos os meses, desde agosto de 2003 (-5,7%).
Na passagem de maio para abril, o recuo foi de 0,9%, o mais intenso para o mês desde 2001. Naquele ano, a queda também foi de 0,9%, segundo o instituto. Levando em conta apenas os meses de maio, a retração foi a mais intensa desde 2003 (-6,2%).
Jaime Vasconcellos, assessor econômico da Fecomercio, disse que já foram fechados 180 mil postos de trabalho no comércio. “Voltamos à fase do voo de galinha”, ele disse, referindo-se à interrupção dos surtos de crescimento. “O varejo paulista deve cair 4% até dezembro e a recuperação só ocorrerá em 2017.”
Para Marcel Solimeo, economista-chefe da Associação Comercial de São Paulo, o desemprego e menor crescimento da renda reforçam a ideia de que o comércio fechará com queda das vendas neste ano. Segundo ele, o setor terá movimento melhor no segundo semestre, no entanto, se comparado com o mesmo período de 2014, provavelmente haverá queda.
O presidente da Associação Comercial de São Paulo, Alencar Burti, relembra as crises de 1999, 2003 e 2009, indicando que a recuperação da economia virá em 2016. Confiando na necessidade de o governo realizar o ajuste fiscal em curso, o qual considera “amargo, mas correto”, Aldo Gonçalves, presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas do Rio de Janeiro, do Conselho Empresarial de Comércio de Bens e Serviços da Associação Comercial do Rio de Janeiro (ACRJ) e do Sindicato dos Lojistas do Rio (Sindilojas-Rio), teme que “a dose seja tão forte que mate o paciente”. O varejo vem demitindo e há várias lojas fechando, segundo o executivo.
Bares e restaurantes
Dados da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes em São Paulo) apontam queda de 8% no movimento de bares e restaurantes da capital em relação ao primeiro trimestre de 2015, e de 13% em relação ao mesmo período em 2014. Segundo o presidente da associação em São Paulo, Percival Maricato, o setor sairá da crise este ano e ajudará a alavancar a economia e o emprego.
No entanto, na Vila Madalena, tradicional bairro boêmio da zona oeste de São Paulo, a história da crise é um pouco diferente. Quem trabalha na região diverge se a circulação caiu mesmo ou não. Alexandre Pires, 30, gerente-administrativo do bar Todos Os Santos, afirma que o movimento tem se mantido estável. “Investimos em estrutura e temos atrações ao vivo.”
Bares que oferecem ambientes calmos e tranquilos, como O Pasquim, têm enfrentado maior dificuldade. “Aquele cliente que vinha durante a semana só está vindo aos finais de semana”, afirmou Rogério da Silva, 30, gerente. Perto dali, Leonardo Prado, 56, dono do bar São Cristovão, sente diferente. Ele está otimista com o fluxo de pessoas em seu estabelecimento. Segundo Prado, houve um excesso de oferta com o boom da abertura de bares, lanchonetes e restaurantes, que renderam muito lucro nos anos 1990 e 2000. “Com exceção dos muito movimentados, não está se fazendo dinheiro fácil como se fazia antes. Mas há um excesso de reclamação.”
Alguns setores resistem e permanecem atentos a oportunidades. São casos e números animadores em período de adversidade econômica, agravada por crise política. Conheça aqui onde a economia se movimenta
Fusões e aquisições: com 401 operações concretizadas nos primeiros seis meses deste ano, o número de fusões e aquisições envolvendo empresas brasileiras registrou o terceiro melhor resultado para o período desde quando a KPMG iniciou seu estudo, em 1994, ficando atrás apenas do ano passado (406 transações) e 2012 (433 negociações).
Agricultura: a produção nacional de grãos deve chegar a 202, 226 milhões de toneladas. O clima ajudou, o mercado tem sido favorável e a questão cambial é um estímulo, de acordo com João Marcelo Intini, diretor de Política Agrícola da Conab.
Mineração: a produção de minério de ferro da Vale somou 85,3 milhões de toneladas entre abril e junho. Foi a segunda maior produção em um segundo trimestre: aumento de 7,4% em relação a igual período de 2014.
Telefonia: as vendas de smartphones avançaram 33% no primeiro trimestre, na comparação com igual período do ano passado. Atingiram 14,1 milhões de unidades, de acordo com a empresa de pesquisa IDC.
Micros e pequenas: a arrecadação de impostos dessas empresas totalizou R$ 34,2 bilhões de janeiro a junho deste ano, representando um aumento real de 6,73% sobre o mesmo período do ano passado.
Investimento externo A empresa alemã Haribo, fabricante de balas de goma em formato de ursinho, anunciou expansão fora da Europa, incluindo o Brasil.
Moda: a Riachuelo, com faturamento de R$ 7 bilhões anuais, mantém os planos de abrir mais 40 lojas ainda neste ano no País. A informação é de Flávio Rocha, presidente da rede.
Lazer: o público de cinema cresceu 5,1% no primeiro semestre deste ano, em relação ao mesmo período de 2014, com aumento de 12,5% nas bilheterias. Os dados são da empresa de monitoramento Rentrak.
Festas: foram gastos R$ 16,4 bilhões com casamentos, formaturas, aniversários, celebrações de debutantes e eventos corporativos no ano passado. O montante é 6,3% superior a 2013, segundo estudo do conduzido pelo Data Popular.
Os bancos privados continuam surpreendendo com lucros crescentes e expansão. O Itaú lucrou R$ 5,733 bilhões no primeiro trimestre deste ano – 26,8% a mais do que no mesmo período de 2014. O Bradesco obteve lucro líquido de R$ 8,71 bilhões neste primeiro semestre. O valor é 20,7% superior ao resultado obtido no mesmo período do ano passado (lucro de R$ 7,2 bi). O Banco também acaba de anunciar a compra do HSBC, por R$ 17,94 bi.
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