20 dicas de livros imperdíveis para o começo de 2015

Ficção 

MIDDLESEX
Jeffrey Eugenides
Depois do sucesso de Virgens Suicidas, em 1993, Eugenides publicou contos em revistas como a New Yorker até lançar, em 2002, este Middlesex, romance cômico-lírico-épico que lhe rendeu o prêmio Pulitzer. O livro mostra a trajetória de Callie, nascida menina, mas que, carregada de hormônios masculinos, se transforma no pré-adolescente Cal. E é ele quem conta sua história, já adulto, morando em Berlim. Disposto a entender (e a explicar) o que o tornou um transexual, Cal busca nas origens longínquas de sua família grega (como a do autor) algum traço de mutação genética. Então, leva o leitor a percorrer momentos históricos, como a invasão dos turcos na Grécia, a Depressão de 1929, a Lei Seca e a ascensão e queda de Detroit, para onde se mudaram seus avós. Clássico

NOITES LEBLONINAS
João Ubaldo Ribeiro
Antes de morrer, em julho do ano passado, João Ubaldo trabalhava em uma série de contos. Sua ideia era retratar a boêmia carioca, mas só terminou dois dos textos, agora reunidos neste livro. O cenário são os bares e festas do Baixo Leblon, que ele conhecia como ninguém. Quem já leu A Casa dos Budas Ditosos e Viva o Povo Brasileiro vai reconhecer a verve culta e bem humorada do autor, que curtia a descrição de uma boa esbórnia. A edição, em capa dura, traz ainda um ótimo prefácio de Geraldo Carneiro. Entre outras coisas, Carneiro aventa a hipótese de que João Ubaldo, eterno perfeccionista, ainda mexeria nos textos. Lendo, é difícil acreditar.

NOSSA TERESA
Micheliny Verunschk
O subtítulo deste livro surpreendente revela o paradoxo que enfrenta a narrativa: “Vida e morte de uma santa suicida”. A jovem Teresa é vidente e opera milagres, o que leva o Papa a beatificá-la. Seus pais, no entanto, são ateus e não reconhecem seus feitos: ele, um cultor algo pedante das artes,
e ela uma cultora do corpo. Quando Teresa se mata, sua figura se agiganta. Mas há a questão do pecado
no suicídio, que o narrador, um velho cansado, prontamente refuta, lembrando do exemplo do próprio Jesus. A brasileira Verunschk já demonstrara ser uma poeta de mão cheia, tendo lançado, entre outros, Geografia Íntima do Deserto, finalista do Portugal Telecom. Este é seu primeiro romance.

PARROT E OLIVIER NA AMÉRICA
Peter Carey
O escritor australiano Peter Carey é um fenômeno: autor de 13 romances, entre eles Oscar e Lucinda
e A História do Bando de Kelly, ganhou por duas vezes o Booker Prize, talvez o principal prêmio de literatura em língua inglesa no mundo. Parrot e Olivier na América é de 2009 e, como seus demais livros, foi amplamente elogiado pela crítica – o New York Times chegou a dizer que “provoca aplausos
de pé do leitor.” Olivier é um personagem baseado no precursor da sociologia moderna Alexis de Tocqueville (1805-1859), autor do clássico A Democracia na América. Filho de um tipógrafo inglês, Parrot é seu improvável amigo e protetor. Juntos vão para os Estados Unidos, onde vivem uma série de aventuras.

A CIDADE & A CIDADE
China Miéville
Miéville, militante de esquerda formado na London School of Economics, é considerado
o melhor autor inglês de ficção científica desde J.G. Ballard. O estranho e fascinante A Cidade &
A Cidade é seu primeiro livro no Brasil. Traz todos os elementos do chamado new weird, gênero literário que mistura ficção futurista (ou especulativa), horror e policial noir. O inspetor Tyador Borlú tenta descobrir o assassino de uma jovem nos confins da Europa e acaba esbarrando num grupo sinistro chamado Brecha. Para complicar as coisas, sua cidade ocupa o mesmo espaço físico que outra, mas em uma dimensão diferente – a chave do mistério está justamente na passagem proibida de uma para outra.

Não Ficção 

À SOMBRA DO MEU IRMÃO
Uwe Timm
Um dos maiores sucessos editoriais na Europa, o relato de Timm, escritor nascido em Hamburgo, vendeu 250 mil exemplares só na Alemanha e já foi traduzido para 21 línguas. O livro se baseia no diário de seu irmão mais velho, escrito a lápis no front ucraniano durante a Segunda Guerra, onde ele morreu, aos 19, depois de ter as pernas amputadas. Sem nenhuma sombra de sentimentalismo ou julgamento, Timm tenta entender como se deu a participação do irmão na SS nazista, enfrenta os horrores guardados na memória da família e reflete sobre o peso da culpa e a consciência do povo alemão, além de descrever as experiências de parentes e conhecidos durante e depois da guerra.

OS GRANDES IMPOSTORES
Jan Bondeson
Livro divertido, mas sério em suas investigações – que envolveram pesquisas exaustivas e também uma boa dose de dedução e imaginação –, tenta traçar quais seriam as explicações para uma série de mistérios históricos nos últimos 200 anos. O sueco Bondeson, autor de diversos livros sobre anomalias anatômicas, curiosidades da zoologia e célebres crimes não resolvidos, utiliza muito de sua formação médica e provas como testes de DNA para avaliar as circunstâncias de casos como o de Kaspar Hauser, o menino aprisionado em um calabouço, que diziam ser o príncipe herdeiro de Baden, ou do Czar Alexandre I, que teria falsificado a própria morte e virado um eremita, vivendo na Sibéria por mais 39 anos.

IMPÉRIOS DO MAR
Roger Crowley
O pirata Barbarossa, espécie de Robin Hood islâmico, os violentos cavaleiros da Ordem
de São João, o grande imperador Carlos V e o também grande sultão Solimão são alguns dos personagens fascinantes que habitam essa narrativa de fôlego, do historiador britânico Crowley. Com talento de romancista, ele reconstitui a batalha de Levanto, travada em 1571 e clímax de mais de cem anos na disputa sanguinária pelo controle do Mar Mediterrâneo entre os reinos cristãos e os muçulmanos do Império Otomano. Pode-se considerar que o predomínio europeu no tabuleiro geopolítico dos séculos seguintes foi em grande parte moldado a partir desse episódio, que desfez o difícil equilíbrio das forças na região.

O BRILHO DO BRONZE
Boris Fausto
Quando adolescente, pouco depois da Segunda Guerra Mundial, o historiador Boris Fausto tentou manter um diário, mas desistiu em alguns meses e o jogou no lixo, pois aquilo estava virando um dever e não uma diversão. Mais de seis décadas depois, com a morte de sua mulher em 2010, voltou ao exercício de escrever quase todos os dias. Seria uma forma de enfrentar o luto. E dessa vez não desistiu.
O resultado é uma coleção de textos sensíveis e agudos que trafegam entre o registro da crônica, da memória e da reflexão. Se a dor da perda é uma constante, o senso de humor a ameniza, o que faz da leitura uma atividade tão comovente quanto prazerosa.

A AUTOBIOGRAFIA DE MARTIN
LUTHER KING
Clayborne Carson (org.)
Historiador da Universidade de Stanford, Carson reuniu textos autobiográficos de King (1929-1968), cartas e diários não publicados e filmes e gravações para compor esse livro como se fora escrito pelo próprio líder negro dos direitos civis. O leitor, assim, não apenas acompanha a trajetória de uma das personalidades mais importantes da nossa história, como tem diante de si um painel do período mais fervilhante do século passado, justamente quando King combateu, seguindo os princípios da não violência, a discriminação racial, e protestou contra as desigualdades econômicas e a loucura da guerra no Vietnã, tendo se tornado o mais jovem vencedor do Nobel da Paz, em 1964.

Clássico

A REDOMA DE VIDRO
Sylvia Plath
Este é certamente um dos livros mais emblemáticos do início dos anos 60, pré-revolução sexual. Esther Greenwood, a narradora, uma jovem do interior dos EUA, vai para Nova York trabalhar como estagiária em uma revista feminina. Enredada pelo glamour da metrópole, ela, no entanto, sucumbe a uma crise e acaba internada numa clínica psiquiátrica. Único romance da poeta Sylvia Plath, foi lançado em 1963, a poucas semanas de seu suicídio, cometido aos 30 anos. Ela deixou dois filhos pequenos (do casamento malfadado com o também poeta Ted Hughes, de quem havia se separado há cinco meses) e uma poderosa obra confessional, que trata particularmente da angústia feminina.

MEU COMPANHEIRO DE ESTRADA
Maksim Górki
Da orelha de Otto Maria Carpeaux: “Górki cumpriu para as camadas baixas do povo russo a mesma missão que Dickens cumprira para as classes médias na Inglaterra”. Considerado o primeiro proletário autêntico da literatura russa, Górki (1868-1936), de família humilde e figura singular no mundo intelectual, admirado por Tolstói e Tchekhov, participou ativamente dos movimentos sociais que culminaram na revolução de 1917, tendo sido preso e exilado pelo regime tsarista. Selecionados por Schnaiderman, os contos deste livro mostram suas andanças pela gigantesca Rússia e o retrato único que fez de seu povo, que nunca havia sido representado – e tão bem! – por um dos seus.

O PORTAL
Natsume Soseki
Última parte da trilogia iniciada com Sanshiro (1908) e E Depois (1909), O Portal foi lançado no Japão em 1910 e logo se tornou um grande sucesso. Soseki (1867-1916) já era o escritor reconhecido do clássico Eu Sou um Gato, de 1905. O livro traz as marcas que fizeram com que o autor fosse considerado o pai do modernismo japonês na literatura, além de ser comparado a Machado de Assis, por conta do estilo cristalino e do uso de elipses e subentendidos. Descreve o cotidiano de um casal de meia-idade, recluso há anos e em meio a uma crise matrimonial. O surgimento do irmão mais novo do marido torna a situação ainda mais sufocante, trazendo à tona um trauma familiar delicado e nunca resolvido.

VIDA E DESTINO
Vassili Grossman
Muitos críticos sustentam que esse é o Guerra e Paz dos tempos modernos. Para George Steiner, é um livro que “eclipsa quase tudo o que se passa por ficção séria no Ocidente hoje”. Os elogios não parecem exagerados quando se conhece a história do romance. Grossman esteve nos campos de batalha e acompanhou os soldados russos em Stalingrado. Ele não apenas descreve a batalha crucial para
o desenlace da Segunda Guerra Mundial, como situa partes da trama épica em campos de concentração nazista e campos de prisioneiros de Stálin, revelando o terror de ambos os lados. Por conta disso,
o livro, originalmente lançado em 1960, foi confiscado pela KGB, permanecendo inédito até a metade
dos anos 1980.

ODISSÉIA
Homero
Edição caprichada da famosa obra do século 8 a.C., de 12 mil versos, atribuída ao poeta cego Homero, traz uma nova tradução – a sétima para o português. O gaúcho Werner, professor de literatura grega
na USP, levou dez anos na empreitada, o mesmo tempo gasto por Ulisses em suas peripécias, na tentativa de voltar para casa depois da Guerra de Troia. Sua opção foi pela oralidade e fluência. O livro ainda traz ensaios introdutórios dos especialistas Richard Martin e do próprio tradutor, e um artigo
do escritor e professor de filosofia Luiz Alfredo Garcia-Roza, além de um texto de Kafka um poema de Kaváfis. A editora também lançou uma versão luxuosa, com 26 colagens encartadas do artista plástico
Odires Mlászho.

Infanto Juvenil

CIÊNCIA ANIMAL
Nicola Davies
Os seis títulos da coleção Ciência Animal respondem, com humor, “como e por que os animais fazem o que fazem”. Cada volume traz informações curiosas sobre um aspecto específico do mundo dos bichos, com texto informal e ilustrações divertidas. Explicam, por exemplo, como os animais se comunicam, quais os mais perigosos e os mais resistentes, por que alguns são gigantes e outros minúsculos, por que comem uns aos outros e, é claro, quais as peculiaridades do cocô de cada espécie. Todos os volumes apresentam esquemas e diagramas informativos, bem dosados com quadrinhos engraçados, além de índice e glossário no final.

A CONTRADIÇÃO HUMANA
Afonso Cruz
Narrado do ponto de vista infantil, o texto elenca inúmeras contradições humanas observadas na rotina cotidiana: uma tia que adora pássaros, mas os prende em gaiolas; um vizinho que toca músicas tristes ao piano e sente-se feliz; o porteiro que sempre olha para os lados ao atravessar a rua, mas não olha para o lado quando aparece um pobre. Dilemas éticos e temas filosóficos são tratados com humor
e leveza. As ilustrações em preto, branco e vermelho compõem com uma tipografia que lembra anúncios antigos e às vezes remete aos diários. Uma combinação bastante coerente, já que texto e imagem parecem amplificar as observações íntimas e sensíveis das crianças sobre o mundo que as cerca.

VAZIO
Catarina Sobra
Nesta narrativa visual composta com desenho, recorte, carimbos e pinceladas, a premiada autora e ilustradora portuguesa apresenta um singular personagem que contrasta com os demais por sua quase invisibilidade e constante sensação de vazio. Seu corpo vazado em branco nas páginas coloridas é preenchido por elementos presentes nos lugares por onde passa e, em seguida, novamente esvaziado. O percurso que o homem-vazio percorre é repleto de delicadezas e refinado humor. Até que no meio do caminho, uma surpresa: o encontro repentino com uma mulher de corpo também vazado. Ela caminha em sua direção e os corpos brancos se cruzam, deixando transparecer algo em comum que secretamente carregam. De alta poeticidade e intensa beleza plástica, para todas as idades.

O QUE EU
POSSO SER?
Mariana Zanetti e Silvia Amstalden
A instigante pergunta do título se desdobra ao longo do livro, convidando a olhar de modo inusitado as formas geométricas convencionais e usando-as como ponto de partida para ler este belíssimo livro-imagem. A pergunta “O que eu posso ser… se for quase um retângulo?”, por exemplo, tem como possíveis respostas a haste de um barquinho em uma banheira, uma vela de aniversário, o tronco de um coqueiro. A beleza das imagens, a variedade das perspectivas e o detalhamento das cenas maravilham diante da multiplicidade de coisas que se pode ser. A dupla de ilustradoras paulistas assina em conjunto
a obra e lança um desafio ao leitor nas páginas finais: criar diversos desenhos, a partir de uma mesma forma.

O LENÇO BRANCO
Viorel Boldis. Ilustrações de Antonella Toffolo
A parábola do filho pródigo ganha nova versão nesta narrativa em primeira pessoa, escrita por um premiado autor romeno, e tem como cenário uma cidadezinha em meio às colinas da Transilvânia. Exaltando a simplicidade e o trabalho com a terra, o narrador conta sua infância, marcada pelo contato com a natureza e a presença de um pai tirano. O lenço branco pendurado na janela era o sinal combinado com a mãe para liberar sua volta à casa, depois das severas repreensões do pai. Esse lenço branco, alçado a hipérbole na trama literária do texto, surpreende o leitor em um desfecho inesperado e tocante.


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