Eugênio Bucci lança livro nesta terça-feira

Era 1º de abril de 2014, ano de eleições, quando o Sistema Cantareira registrava 13,4% do chamado volume útil. Lembra? Um momento alarmante, que exigia da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) algum esforço de comunicação pública para alertar a população. Uma mensagem clara sobre o problema, considerando as medidas necessárias para evitar o pior. E o que a companhia fez? 

Para o jornalista Eugênio Bucci, o comercial que a Sabesp começou a vincular naquela época não esclarecia a situação e ainda falava bem da empresa. “Nessas horas, somente empresas como a Sabesp apresentam soluções sérias e verdadeiras”, dizia um trecho do texto publicitário.

“Não se pode dizer que a Sabesp fez campanha eleitoral, mas se pode dizer com absoluta tranquilidade e segurança que a campanha da Sabesp em 2014 reforçou as teses do governo e que esse governo era candidato a reeleição, portanto a campanha da Sabesp foi mais favorável do que critica as causas do governo do Estado”, afirma Bucci

Não por acaso, A comunicação pública a serviço da verdade particular é o subtítulo de Estado de Narciso (Companhia das Letras), o novo livro de Bucci. Jornalista que já passou por diversos veículos do país, como Superinteressante e Quatro Rodas, e hoje é professor na Escola de Comunicação e Artes da USP, Eugênio viu os problemas da comunicação pública brasileira de perto quando foi presidente da extinta Radiobrás e integrou o Conselho Curador da Fundação Padre Anchieta.

Eugênio Bucci - Foto: Renato Parada
Eugênio Bucci – Foto: Renato Parada

Segundo o livro, como o caso da Sabesp evidencia, sendo só um de muitos exemplos, a comunicação pública brasileira oferecida pelo Estado em todas suas esferas (municipal, estadual, federal) sofre com o modo de operação atual, que fere na essência o que é de interesse público e desrespeita o conceito de democracia. “Esse é um traço da cena política brasileira, os políticos eleitos fazem a sua comunicação (particular) acionando também as estatais sob sua área de influência ou sob sua supervisão, com isso aumentam o poder de fogo”, comenta Bucci.

Originalmente apresentado como tese de livre‑docência para a ECA‑USP, Estado de Narciso nasceu da necessidade que o jornalista sentiu em enfatizar e analisar o problema, além de tentar responder perguntas que ele considera gravíssimas e urgentes: quando a comunicação pública virou palanque partidário e um negócio milionário?

Bucci contesta inclusive políticos de boa-fé, que sabem da existência do problema, mas consideram que temos questões mais graves para resolver antes. “Estão enganados”, assinala o autor, logo na introdução. “Trata-se de saber se a propaganda dita pública, a comunicação dita pública no Brasil fortalece a democracia ou solapa as bases de participação democrática. Eu procuro demonstrar que ela é menos democrática do que deveria e que ela atua contra os interesses republicanos e os direitos das pessoas, a começar pelo direito a informação”.

Para isso Estado de Narciso vai do ponto básico – indo atrás do conceito de comunicação pública –  até as questões mais particulares do assunto no Brasil e no mundo. Se a TV Cultura é lembrada por oferecer bons exemplos dentro de limitações e interferências governamentais, a BBC de Londres é perfilada como o padrão mais bem acabado de comunicação pública – nada de interferência do Estado no conteúdo editorial. Se em outras democracias a quantidade de propaganda pública é mínima, aqui temos o inverso. “Estamos em um país em que os governos estão entre os maiores anunciantes”, afirma Bucci.

De sua experiência pessoal, Bucci relata as dificuldades e problemas de suas passagens por instituições de comunicação pública. No Conselho Curador da Fundação Padre Anchieta, por exemplo, fala da dificuldade em obter vitórias, especialmente em questões polêmicas que considerava essenciais, como a extinção de anúncios comerciais. Em um caso, até o autor considera a situação patética – Bucci queria limar a transmissão dominical da missa católica em Aparecida do Norte, já que outras religiões não tinham o mesmo espaço. Resultado: A transmissão da missa continua lá na grade da TV Cultura até hoje.

Mas mesmo no panorama de derrotas e dificuldades, o jornalista ainda propõe soluções práticas – eliminar gastos com publicidade oficial dos governos,  extinguir a publicidade comercial nas emissoras pública, fim da obrigatoriedade da Voz do Brasil, entre outras iniciativas. Mas a dificuldade volta à tona: “Eu proponho medidas que só seriam possíveis com nova legislação, elas teriam que ser aprovadas no Congresso Nacional”. Alguém interessado no assunto?

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O ESTADO DE NARCISO – A comunicação pública a serviço da vaidade particular
Eugênio Bucci
Companhia das Letras
248 páginas 
R$ 34,90 

Lançamento + bate-papo 
Terça-feira, 14 de abril, às 19h30
Local: Auditório Freitas Nobre, no CJE, na ECA-USP — Av. Prof. Lúcio Martins Rodrigues, 443, Cidade Universitária — São Paulo, SP


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