Tudo sobre Sandman

Sandman_3_1aCapaO termo graphic novel foi criado pelo quadrinista norte-americano Will Eisner (1917-2005) para dar um status de arte às HQs da década de 1970. Era uma resposta à longa acusação (entre os anos 1930-60) de que os gibis deformavam a mente e o caráter de crianças e de adolescentes. As publicações passaram, então, a ser vistas como subprodutos da indústria do entretenimento para garotos bitolados (os nerds).

Mas Eisner fez algo a mais: dirigiu-se a leitores mais velhos ao transformar sua história de vida nos guetos de Nova York em uma narrativa complexa, profundamente reflexiva e carregada de emoção, e publicou em formato de livro, com o título Um Contrato com Deus. Alguns anos depois, o mercado das HQs assimilou essa proposta e a radicalizou, com obras para gente crescida que fizeram os grandes jornais americanos celebrá-las como acontecimentos no nível de grandes criações literárias.

Frank Miller contribuiu com O Cavaleiro das Trevas, uma visão pessimista de Batman na velhice, em que sua obsessão pela morte dos pais, quando era criança, foi tratada como um problema psiquiátrico grave. Alan Moore escreveu dois marcos do gênero, transpostos também para o cinema neste século: V de Vingança, cuja máscara do protagonista marcou as manifestações de junho passado no Brasil, e o monumental Watchmen.

Neil Gaiman contribuiu com a linguagem das graphic novels ao compor Sandman (O Homem da Areia), só que em formato de série, que se desdobrou em 75 números. No imaginário inglês, Sandman é uma espécie de bicho-papão, que inspirou o alemão E. T. A. Hoffmann (1776-1822) a escrever a novela O Homem da Areia e o roqueiro americano Roy Orbison a fazer o clássico In Dreams. Gaiman fez uma vasta exploração do personagem, que se desdobrou em álbuns e edições especiais. Mas o melhor mesmo é a coleção original, que a editora Panini dividiu em quatro volumes, e acaba de lançar o último.

São edições que valem a pena, reforçadas com informações extras, inclusive detalhes de produção. O escritor fez o que se poderia chamar de a grande criação pós-moderna das HQs, ao misturar o personagem gótico de Hoffman com terror literário e do cinema. Recorreu ainda a elementos da cultura pop, como o visual do cantor Robert Smith, líder da banda The Cure, para estabelecer uma narrativa literária que caminha independente dos desenhos. A soma de tudo isso é alta literatura que faz o leitor viajar por mundos de ricas imaginações e sensações, que parecem infindáveis, graças à mente inventiva de Gaiman. São histórias que encantam quem gosta de terror, fantasia, ficção científica, espiritismo, sonhos, astrologia, bruxaria, anjos, demônios, monstros.

O encerramento da coleção reúne as edições 57 a 65 e apresenta ainda uma história curta publicada na edição especial da revista Vertigo Jam 1 (O Castelo). Tudo com cores reconstruídas e dezenas de páginas de extras, como esboços, galeria de produtos baseados no universo de Sandman, o roteiro completo das histórias, textos e posfácio. Um bom motivo para descobrir que os quadrinhos evoluíram muito desde o tempo em que professores organizavam fogueiras para queimá-los nos pátios das escolas.

Sandman

Neil Gaiman. Editora Panini. 608 páginas.


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