Os dois candidatos à Presidência da Argentina encerraram a campanha nessa quinta-feira (19) pedindo aos 32 milhões de eleitores que, no domingo (22), escolham entre a continuidade, do governista Daniel Scioli, ou a mudança, do oposicionista Mauricio Macri. “Mas não importa quem seja o vencedor, o sucessor da presidenta Cristina Kirchner vai ter que fazer ajustes na economia, para corrigir os desequilíbrios”, disse o economista Fausto Spotorno. “O que está em discussão não é que medidas serão tomadas, mas sim com que rapidez”, acrescentou.
Segundo Spotorno, o principal desafio vai ser reativar a economia argentina, que há quatro anos deixou de crescer, e aumentar as exportações. “Mas para isso, a Argentina vai ter que desvalorizar o peso, como o Brasil e a Venezuela, para ganhar competitividade”, afirmou. Desde outubro de 2011, quando Cristina impôs controles cambiais para impedir a fuga de divisas, surgiu um mercado ilegal. O dólar oficial vale hoje 9,6 pesos e o blue (paralelo), 15 pesos.
Tanto Scioli, quanto Macri prometeram eliminar as medidas que hoje limitam o número de dólares (ou de qualquer outra moeda estrangeira) que os argentinos podem comprar no mercado oficial. Mas, enquanto o candidato oposicionista promete fazer isso tão logo assuma, o governista fala numa mudança gradual.
“Acabar com o cerco de vez é arriscado, porque o Banco Central tem poucas reservas: dos US$ 26 bilhões existentes, apenas US$ 4 bilhões estão disponíveis para serem usados e pode haver uma corrida e uma desvalorização brusca”, disse Spotorno. “Por outro lado, esperar para fazer o inevitável também é arriscado porque, com o cerco, não podemos atrair investimentos, nem conseguir os dólares que precisamos para manter o câmbio estável”.
O empresário Mauricio Macri – fundador do partido conservador Proposta Republicana (PRO) e ex-presidente do clube de futebol Boca Juniors – disputa a Presidência pela aliança Cambiemos (Mudemos, em português). Ele diz ser o candidato da “mudança” – depois de 14 anos de governos do Partido Justicialista (Peronista), sendo que 12 de Nestor Kirchner (2003-2007) e de sua viúva e sucessora Cristina Kirchner.
O peronista Daniel Scioli – ex-campeão de motonáutica e ex-vice de Nestor Kirchner – e candidato da Frente para a Vitoria, promete governar com um estilo diferente dos kirchneristas, mais conciliador e aberto ao diálogo. Mas diz que vai manter os subsídios aos serviços públicos, planos sociais e fazer uma política econômica independente do Fundo Monetário Internacional (FMI).
“Mas, a verdade é que, no fundo, os dois têm propostas parecidas”, disse em entrevista o analista político Roberto Bacman. Segundo ele, Macri, na reta final da campanha, adotou um discurso mais “peronista”, prometendo manter as conquistas sociais do atual governo, enquanto Scioli afirmou que corrigirá os desequilíbrios herdados do atual governo, como a inflação anual de dois dígitos e reformar o Indec – o instituto que mede custo de vida e a pobreza na Argentina e que perdeu credibilidade, depois que o governo fez uma intervenção e modificou sua forma de calcular os índices.
De acordo com Spotorno, o problema é que o governo não tem dinheiro para continuar gastando em subsídios e planos sociais. “Se emitir moeda, a inflação, que supera os 25% anuais, continuará crescendo”, diz o economista. “As únicas fontes de financiamento externo hoje são as exportações, que caíram por causa do câmbio pouco competitivo”. Para ter acesso a empréstimos do exterior (inclusive para financiar as exportações), a Argentina precisa antes negociar com a minoria de credores (7%), que não aceitou renegociar a dívida externa, depois do calote de 2001, e que tem mantido o país, até hoje, em default (falta).
Na reta final da campanha, Scioli apostou na polarização: diante do avanço do adversário nas pesquisas de intenção de voto, que consideram Macri o favorito, ele não perde oportunidade para alertar os indecisos (cerca de 11% dos eleitores) sobre os “perigos” da mudança. E Macri continuou pregando a mudança, sem explicar bem o que fará. Segundo ele, se conseguir estabelecer regras claras para o mercado, atrairá os dólares argentinos que hoje estão no exterior ou escondidos nos colchões.
“Os argentinos têm o equivalente a um Produto Interno Bruto (PIB) fora do sistema financeiro nacional”, disse Spotorno. “Mas ninguém pode garantir quanto e em que tempo esse dinheiro vai voltar”, acrescentou. Até porque, Macri – se for presidente – vai governar com minoria no Congresso: a Frente para a Vitoria tem maioria própria no Senado e é a primeira minoria na Câmara dos Deputados.
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