Na véspera da realização do referendo sobre a continuidade ou saída (Brexit) do Reino Unido da União Europeia, é possível perceber que a campanha em favor da saída só ganhou ascendência quando colocou o problema da imigração no centro do debate. Os argumentos econômicos em favor da permanência do Reino Unido são muito fortes e os discursos das principais organizações empresariais e sindicais são explícitos na hora de estimar o custo, em termos de desemprego e recessão, que provocaria uma saída do bloco europeu.
O debate sobre temas políticos, principalmente no que diz respeito à recuperação da soberania sobre o controle das fronteiras, também indica o quanto a problemática da imigração é a verdadeira pergunta feita aos eleitores britânicos. No Reino Unido, as estimativas do Office for National Statistics para o ano de 2014 mostram 5,4 milhões de imigrantes numa população de 64,3 milhões (8,4% do total). Desses imigrantes, três milhões vieram da U.E. (Polônia, Irlanda, Romênia e Portugal) e 2,4 milhões do restante do mundo (Índia, Paquistão).
É pouco provável que uma vitória do Brexit afete quem já vive no Reino Unido, mas futuros imigrantes poderão enfrentar maiores dificuldades. Os principais líderes do movimento heterogêneo que milita pela saída do bloco europeu defendem a ideia de um sistema de imigração por pontos, parecido com o adotado pela Austrália. O modelo dá prioridade a profissionais qualificados, exige o domínio da língua inglesa e a adequação para um emprego previamente identificado. Essa proposta parece pouco sustentável.
O governo britânico, se quiser sair da União Europeia mantendo ao mesmo tempo o seu acesso ao mercado único europeu com 500 milhões de consumidores, terá de aceitar a livre movimentação de trabalhadores, como aconteceu com a Suíça e a Noruega. É bom lembrar que, quando um referendo aprovou na Suíça a limitação à entrada de imigrantes, a UE agiu rapidamente para impor sanções. Dois milhões de europeus moram e trabalham no Reino Unido.
Em contrapartida, 1,2 milhão de britânicos vivem em nações da UE (Espanha, França e Portugal principalmente). Qualquer medida contra imigrantes no Reino Unido poderia resultar em retaliação aos britânicos. O líder do Partido Trabalhista, Sadiq Khan, e Frances O’Grady, secretária-geral da federação sindical Trades Union Congress, sublinharam aos eleitores que têm de ter “100% de certeza” do que querem porque “não há volta atrás na sexta-feira de manhã”. Antes disso, Khan acusou a campanha em favor da saída da UE de ser não um “projeto de medo”, mas sim um “projeto de ódio”.
*François Huteau é cientista político e economista, doutor pelo Institut Études Politiques de Paris (Sciences-Po).
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