Substituir “Pepe” Mujica: o principal desafio de Vázquez

“No se vá, el Pepe no se vá”, gritava a multidão quando o presidente eleito do Uruguai, Tabaré Vázquez, surgiu por uma das ruas que dão acesso a Plaza Independência, no centro de Montevidéu, para a cerimônia de despedida de José “Pepe” Mujica. Por alguns minutos, Vázquez caminhou ao lado do bloqueio que separava as pessoas dos secretários de Estado, acenando, tocando nas mãos que sobravam pelas grades e até conversando com alguns, mas sua presença se tornou irrelevante quando, subitamente, Mujica saiu pela porta do edifício presidencial com a sua mulher, a senadora Lucía Topolansky, também em direção ao povo, enlouquecido com a aparição do agora ex-presidente. Enquanto a imprensa corria para registrar uma imagem ou uma palavra de “Pepe”, os gritos aumentaram consideravelmente de tom: “no se vá, el Pepe no se vá”.

A imagem ocorrida na sexta-feira (27) não deve voltar a acontecer – já que Mujica provavelmente não vai interferir no governo do colega – mas é um retrato significativo do que Tabaré Vázquez deverá encontrar em seus primeiros meses de governo: a sombra do famoso ex-mandatário que, desde 2012, quando o canal inglês BBC publicou uma reportagem em que o chamava de “o presidente mais pobre do mundo”, se tornou um ídolo latino-americano. “Ele é um pop star, uma figura de Hollywood, um ícone do nosso país, de modo que vai ser difícil imaginar que outro seja o que ele foi nesse sentido de imagem”, analisa a publicitária Cecília Ordoñez.

Na semana passada, o instituto de pesquisa eleitoral uruguaio Equipos Mori divulgou que Mujica vai deixar o governo com 65% de aprovação, mesma média que ele mantém desde o início do seu governo. O dado é parecido com o de Vázquez no fim do seu primeiro mandato, quando saiu com 60%, mas o “fator Pepe” ainda não existia. Entre os eleitores do Frente Amplio, o partido de Mujica e Tabaré, por exemplo, o crescimento do primeiro é expressivo: 94% dos militantes do FA aprovam o governo de Mujica, enquanto 71% aprovava o de Vázquez quando ele entregou o poder, em 2010. Em dezembro, a entidade internacional Associação de Comunicação Política (ACOP) publicou uma lista em que “Pepe” aparece como o quarto presidente mais bem avaliado pela sua população do mundo, atrás de Vladimir Putin (Rússia), Rafael Correa (Equador) e Evo Morales (Bolívia).

A aprovação de Mujica é facilmente notada nas ruas. Nesta sexta-feira, a reportagem de Brasileiros conversou com diversas pessoas que foram assistir a cerimônia de despedida de Mujica. Ainda que alguns tenham críticas ao seu modo de governar, a grande parte admite que ele foi um bom presidente. “Ele vive o que ele fala, e isso é importante em um continente como o nosso”, afirma o motorista de ônibus Diego Capoli. “O que se espera é apenas que Tabaré Vázquez siga com a agenda do Frente Amplio, de mudança social, porque ser o Mujica ele não vai ser”, concorda o brasileiro Eduardo Machado, que vive no Uruguai desde a década de 90. “Tabaré não tem o mesmo carisma, não tem a mesma visão filosófica, é apenas um administrador, como qualquer outro bom político pode ser”, finaliza um terceiro, o segurança Jorge Cipriati.

Outros desafios

Além de superar a gestão de “Pepe” Mujica, Tabaré Vázquez também encontrará desafios econômicos e sociais, além de carregar a complicada missão de levar maconha para as farmácias, conforme determinado por essa administração. Na economia, principalmente, os principais parceiros comerciais do Uruguai, Argentina e Brasil, estão passando dificuldades, ao contrário do que foi no seu primeiro período no poder. Na política, ele mesmo afirmou na semana passada que seu novo governo “não será mais do mesmo” e que vai atacar “os problemas vertebrais da agenda do país”, como segurança pública, educação, saúde e infra-estrutura, áreas onde Mujica admitiu que não alcançou o progresso desejado.


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