Cerca da Esplanada, muito barulho por nada

O mapa da manifestação - Reprodução
O mapa da manifestação – Reprodução

O mais recente foco do ódio é um conjunto de cercas metálicas provisórias que estão sendo instaladas no gigantesco canteiro central projetado por Lúcio Costa no meio da Esplanada dos Ministérios. O motivo das cercas é simples: garantir a integridade física de manifestantes pró e contra impeachment, como ponderadamente buscou explicar em um vídeo, bem didático, o jovem governador de Brasília, o socialista Rodrigo Rollemberg (assista abaixo).

Depois de dar entrevistas no fim de semana passado, junto com sua secretária de Segurança, a psicóloga Marcia Alencar, explicando com detalhes — incluindo um desenho bem explicado do esquema projetado para a gigantesca Esplanada –, o governador certamente foi surpreendido com a reação negativa daqueles que chamam a cerca de “Muro da Vergonha”. Para muitos, Brasília passou, com a medida, a ser dividida em duas, a Ocidental e a Oriental, em uma alusão ao já derrubado Muro de Berlim.

Para ter uma ideia do estado de ânimos, o MBL (Movimento Brasil Livre) chegou a pedir que os manifestantes contra o impeachment da presidenta Dilma Rousseff se concentrassem a quilômetros de distância. Fazendo uma interpretação no mínimo ousada da Constituição, eles exigiam exclusividade do espaço público alegando que haviam avisado com antecedência que ocupariam a Esplanada no domingo próximo, dia 17. Descartados pela secretária de Segurança, que citou o direito de todos se manifestarem em paz, a turma, a contragosto, acabou cedendo.

Dessa maneira, nesta sexta, sábado e domingo, milhares de pessoas ocuparão a Esplanada, entre elas os a favor e os contra o impeachment. No entanto, o Fla-Flu diante do Congresso está organizado, pelo menos em tese: à direita fica o grupo que apoia o impedimento e à esquerda, os contrários à esquerda – uma analogia interessante, sob todos os aspectos. E os manifestantes, na verdade, terão entre si não apenas as frágeis cercas metálicas, e sim uma pletora de PMs, PFs, policiais civis, bombeiros, enfermeiros, etc. etc, que ocuparão a faixa central.

Na cerca, a criatividade já se faz presente, com pixações variadas, sendo algumas, dentro do espírito do Bardo, bem humoradas. O que se espera é que, qualquer que seja o resultado da votação a ser conduzida pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (que teve pedido ao Supremo pelo Procurador Geral da República seu afastamento do cargo por “obstrução da justiça”), o pós-votação não transforme a bela Esplanada de Lucio Costa em batalha campal. Se isso acontecer, não vai adiantar a grande mídia, tão unilateral nos últimos tempos, divulgar editoriais chorosos, com muito pouco de mea culpa.

Sir William Shakespeare ficou famoso pelas grandes tragédias que escreveu, 500 anos atrás. Mas, se o bardo inglês estivesse nesses dias passeando por Brasília, certamente consideraria a situação politico-social-economica-cultural-educacional-jurídica por que passa o Brasil e sua capital, além dos grandes dramas e tragédias que o fizeram famoso por todo o sempre. 

Sir William certamente consideraria a situação mais adequada a ser descrita em uma comédia rasgada, como Much Ado About Nothing – Muito Barulho Por Nada. Na peça, uma espécie de troca-troca entre dois casais de apaixonados, envolvidos em intrigas e traições de falsos amigos, alguns na verdade interessados em uma das jovens, termina com tudo entrando nos eixos, depois de matar de rir as animadas plateias do Globe Theatre no século 16.

A discussão passional (como tudo que há tempos cerca os acontecimentos no Brasil depois da quarta vitória seguida de candidatos do PT – Lula, em 2002 e 2006, e Dilma, sua sucessora, em 2010 e 2014) contra candidatos tucanos, representantes do establishment, especialmente do Planalto de Piratininga (para usarmos uma classificação dos tempos do Bardo) — chegou a paroxismos que fariam Shakespeare pensar em Hamlet e dizer: “Ser ou Não Ser, Eis a Questão”.


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