“Convocar novas eleições no Brasil é improvável política e juridicamente”, dizem especialistas eleitorais

Dilma Rousseff após votação em Porto Alegre - Foto: EBC
Dilma Rousseff após votação em Porto Alegre – Foto: EBC

A ideia aventada por alguns setores do governo Dilma Rousseff, de convocar novas eleições presidenciais neste ano, não faz o menor sentido, diz o cientista político Cláudio Gonçalves Couto, professor da FGV (Fundação Getulio Vargas): “É completamente impossível. Como ela vai aprovar isso?” Uma iniciativa dessa natureza exigiria o apoio de três quintos do Congresso, e o governo não controla nem um terço dos parlamentares. Na oposição, só a Rede, de Marina Silva, defende explicitamente essa tese.

O PSDB, que antes era favorável a essa proposta, hoje rejeita frontalmente essa ideia, sobretudo por motivos eleitorais. No último levantamento do Datafolha, em abril, o senador Aécio Neves (PSDB) tinha só 17% dos votos, atrás de Marina Silva (Rede), com 19%, e de Lula (PT), com 21%. Aécio vem caindo sistematicamente nas pesquisas: tinha 27% em dezembro, 24% em fevereiro, 19% em março, até chegar aos 17%. O senador José Serra (PSDB) caiu de 15%, em fevereiro, para 13% em março, e 11% em abril. O governador Geraldo Alckmin (PSDB) também caiu: passou de 14%, em dezembro, para 9%, em abril.

O desgaste político vem atingindo o PSDB como um todo, e não apenas um ou outro presidenciável: em novembro o PT tinha a preferência de 11% dos eleitores, contra 8% do PSDB; na pesquisa de abril, a preferência pelo PT se mantinha em 11%, mas o PSDB caiu para 4%. Ficou atrás até do PMDB, com 6%. 

Como explica Couto, com exceção de Marina, ninguém da coalizão oposicionista “tem motivo para apoiar essa ideia. O PSDB, pela sua indigência eleitoral, e o PMDB porque vai assumir o governo. E os demais partidos já se posicionaram para apoiar esse novo governo”. Eles já pagaram o preço para entrar na nova administração. Não possuem nenhuma razão para apoiar novas eleições agora. 

A rigor, uma medida desse tipo só tem uma função retórica: constranger Temer e seu círculo de apoiadores a declarar que não aceitam novas eleições.  E isso o próprio Temer já fez: ele declarou que a antecipação das eleições presidenciais para este ano é “golpe”. Diante da perspectiva de assumir o poder, ele não tem nenhum interesse em apoiar uma tese deste tipo, mesmo porque, segundo as pesquisas eleitorais, ele teria no máximo 2% das intenções de voto no caso de uma disputa presidencial. Mas essa ideia tem uma contrapartida indesejada para a própria Dilma: implicaria reconhecer que seu governo já não possui nenhuma chance para barrar o impeachment no Senado. 

Em termos jurídicos, a ideia também seria de difícil aceitação. Segundo advogado Arthur Rollo, doutor em direito pela PUC de São Paulo, a periodicidade do voto é uma cláusula pétrea da Constituição. “Está no artigo 60 da Constituição”: “Não existe essa possibilidade de modificar a periodicidade do voto por emenda. Se uma emenda desse tipo fosse aprovada, o voto estaria sendo desvalorizado”. A decisão final caberia ao Supremo Tribunal Federal. Além disso, existem dificuldades práticas: segundo o ministro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Henrique Neves, a convocação e a preparação de uma eleição presidencial exigiria pelo menos quatro meses.

Nas condições atuais,  novas eleições presidenciais só tenderiam a ocorrer no caso de um impeachment do próprio Temer pelo Congresso nacional ou em razão da cassação da chapa Dilma-Temer pelo TSE. Como Temer cometeu as mesmas manobras orçamentárias praticadas pela presidenta Dilma Rousseff, ele deveria, em tese, ser igualmente afastado pela Câmara.

Na prática, contudo, as “pedaladas fiscais” serviram apenas de um pretexto para o impedimento da presidenta. Já foram praticadas por pelo menos 16 dos atuais governadores e por muitos de seus antecessores – como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

A única possibilidade real de convocação de novas eleições presidenciais neste ano reside no TSE: a corte ainda vai avaliar a regularidade das doações eleitorais da empreiteira Andrade Gutierrez à chapa Dilma-Temer. Se o tribunal considerar que as doações foram irregulares, a chapa inteira tende a ser cassada – embora o vice-presidente venha tentando se desvincular das contas de Dilma.

Mas todo esse processo pode ser paralisado por um pedido de vista de apenas um ministro. Um exemplo: no dia 2 de abril de 2014, o ministro Gilmar Mendes interrompeu o julgamento de uma ação da Ordem dos Advogados do Brasil que questionava a constitucionalidade das doações de empresas a partidos e campanhas eleitorais. O ministro só levou o caso ao plenário no dia 16 de setembro de 2015 – um ano e cinco meses depois. Por essa razão, um processo no TSE pode demorar até 2018.   


Comentários

Uma resposta para ““Convocar novas eleições no Brasil é improvável política e juridicamente”, dizem especialistas eleitorais”

  1. A pesquisa neste momento é um recall da última eleição. Por isso Aécio e Marina Silva, que disputaram o último pleito levam vantagem. Alckmin aparece bem, mesmo tendo disputado a eleição presidencial 10 anos atrás.

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