Erro do PT foi acreditar em governo de “conciliação de classes”, diz Luciana Genro

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Lucina Genro lidera as pesquisas de intenção de voto. Foto: Divulgação

Depois de ganhar projeção nacional na campanha presidencial de 2014, a candidata do PSOL, Luciana Genro, agora é candidata a prefeita de Porto Alegre. Lidera as pesquisas de intenções de voto com a promessa de tornar direta a participação da população nas decisões do município. Em entrevista à Brasileiros, Luciana fala de seus projetos para a cidade e comenta a “crise de identidade da esquerda brasileira”, principalmente após o afastamento da presidenta Dilma Rousseff. O processo que levou Michel Temer ao poder é pedagógico, diz, ao lembrar que a influência desmedida das oligarquias é uma das razões para a existência da esquerda, que aprendeu com os erros do PT a apostar no oposto.

Além de Porto Alegre, o partido figura entre os primeiros lugares nas pesquisas de intenção de voto também em São Paulo, Belém e Rio de Janeiro. “Há uma corrupção generalizada e um modo de operação dos partidos extremamente comprometidos com esquemas dos quais o PSOL não participa, e a população está identificando que não fazemos parte desse jogo.”

Questionada sobre o governo interino, Luciana pediu a união dos movimentos sociais para barrar as futuras medidas propostas pelo peemedebista, como a reforma trabalhista e o ajuste fiscal. Ela acredita que Dilma deveria convocar novas eleições caso volte ao poder, pois teria perdido a credibilidade ao adotar políticas conservadoras: “Ela inverteu seu discurso quando nomeou reacionários como o Joaquim Levy”.

Abaixo, os principais trechos da entrevista:

Brasileiros – Como a senhora justifica a ascensão do PSOL em âmbito nacional, com quatro candidatos figurando nos primeiros lugares nas pesquisas de intenção de voto?
Luciana Genro – Isso se deve a uma conjunção de fatores. Lideranças políticas com uma trajetória consolidada, como eu aqui em Porto Alegre, a Erundina nem se fala, o Freixo, o Edmilson, que são as candidaturas com principal força eleitoral. Ao mesmo tempo, uma grande degradação da política em si. Há uma corrupção generalizada e um modo de operação dos partidos extremamente comprometidos com esquema dos quais o PSOL não participa, e a população esta identificando que nós não fazemos parte desse jogo da política tradicional nem com a desmoralização que o PT vem sofrendo em nível nacional devido à corrupção e às políticas equivocadas tomadas pelo governo Dilma. 

Como a senhora enxerga o futuro da esquerda no Brasil?
Esse processo que levou Temer ao poder é muito educativo para a esquerda brasileira. Comprova que a política de conciliação de classes que o PT promoveu, essa política de governar com o PMDB e oligarquias políticas atrasadas, como Sarney, Collor, não é capaz de garantir as mudanças estruturais necessárias, que são a própria razão de existência da esquerda. O desfecho do impeachment da Dilma coloca em jogo os caminhos que serão escolhidos pelo PT e a necessidade de mudar radicalmente essa rota e construir caminho independente junto com os movimentos sociais, a juventude, os direitos LGBT, as mulheres, negros e negras. O PSOL está vivendo dessas lições e se fortalecendo como alternativa para esse novo caminho. Eu não acho que vamos fazer isso sozinhos, temos de ampliar muito o leque de forças políticas, mas somos parte importante nessa construção.

Como que a população brasileira deveria reagir a um governo composto sem representatividade de mulheres, negros e movimentos sociais?
Primeiro é preciso aproveitar essa oportunidade das eleições municipais para, por meio do voto, manifestar sua indignação e não votar nos candidatos que representam esse projeto político reacionário do Temer. Ao mesmo tempo, incrementar as mobilizações porque temos um desafio enorme de barrar a reforma da Previdência e a reforma trabalhista. Vai ser preciso uma unidade do movimento sindical e popular para barrar essas reformas.

A senhora acredita na consolidação do impeachment?
Eu não vejo que haja reversão desse processo porque Dilma inverteu o discurso de sua campanha. Ela afirmava que não havia crise e que Aécio Neves iria prejudicar o Brasil, mas, ao ganhar, nomeou reacionários como o [economista] Joaquim Levy. Ela perdeu credibilidade, legitimidade do apoio social, tanto que as mobilizações contra o impeachment têm sido pífias. Acredito que não haja reversão e que a grande luta que poderia estar travando agora, que seria luta por eleições gerais, o PT não quis comprar.

A proposta de novas eleições não legitima o golpe?
Seria uma forma de reconhecer que é hora de devolver a soberania ao povo, mostrar que, para que haja condições de governar, é preciso ter respaldo popular, e nem Dilma nem Temer têm. Eu acho que seria um excelente gesto, acho que ela vai voltar para fazer isso.

A Dilma traiu a confiança de seus eleitores?
Ter 54 milhões de votos naquele momento não significa ter apoio hoje. Ela traiu os compromissos que fez na campanha, então seria legítimo que ela devolva a soberania para o povo decidir.

A senhora lidera as pesquisas de intenção de voto em Porto Alegre. O que precisa mudar na cidade?
São 12 anos do mesmo grupo político dominando a cidade. O que nós vimos foi uma desestruturação completa dos serviços públicos. Um processo intenso de terceirização, falta de quadros qualificados do serviço público para fiscalizar os contratos, tanto das obras, quanto dos serviços terceirizados, que ocasionou em um  problema de gestão muito grave que envolve corrupção em várias cargos públicos. Um exemplo é o Departamento de Esgotos Fluviais. A falta de fiscalização da empresa terceirizada conseguiu fraudar o número de bueiros que eram limpos, uma coisa escandalosa. Ainda não se sabe se algum agente político se beneficiou. Há um problema grande com a falta de médicos especialistas. Pacientes podem levar até 10 anos para conseguir uma consulta. Na área da segurança pública há um problema grave com o Estado, que está cortando diárias e diminuindo o efetivo policial. Não existe um projeto consistente de prevenção da violência por meio da cultura, esporte, trazendo a juventude para programas sociais que possam evitar a cooptação para o crime, o narcotráfico. 

E o que a senhora propõe?
Primeiro queremos reverter o processo de desestruturação do serviço público. É preciso fazer um planejamento para aumentar o efetivo do jornalismo público concursado. Fazer com que o servidor público seja o gestor dos principais programas para que eles tenham continuidade para além do governo. Na área de segurança, queremos aumentar o efetivo de guarda e fazer com que ela não seja apenas para cuidar de prédios, mas que se torne uma guarda comunitária, inserida na comunidade e que conheça a realidade de cada bairro. Na área da saúde, queremos contratar mais médico. Outra proposta é o atendimento telefônico para população. O cidadão pode ligar para um profissional de saúde que pode dar orientações em determinadas situações. Não substitui uma consulta presencial, mas vai dar orientações básicas para o paciente. Uma orientação que um médico particular presta. Queremos criar um comitê de cidadãos que possa fiscalizar os contratos e os serviços, uma fiscalização externa, e uma maior participação da população nas decisões da cidade. É necessário que a população participe diretamente das grandes decisões da cidade. Um plebiscito pode, por exemplo, decidir sobre a realização de obras que envolvam impactos ambientais, urbanísticos. Também vamos criar uma plataforma na internet onde as pessoas poderão colocar suas propostas, como está sendo feito na prefeitura de Madri e Barcelona, na Espanha. A pessoa faz sua proposta, se ela tiver 2% de adesão do eleitorado da cidade em apoio, ela vai a plebiscito. Se for aprovada, ela é encampada pelo governo. Isso é uma maneira de driblarmos o problema da minoria na Câmara Municipal, que é apresentar projetos que venham da população e não só do governo.

Você foi convidada a participar dos debates?
Eu tive a confirmação da Record e da Band. O problema é que, além das emissoras convidarem, dois terços dos candidatos têm de aprovar. Vou fazer uma rodada de conversas com os candidatos para reivindicar esse direito. Minha ausência nos debates vai prejudicar o processo eleitoral e a minha campanha. É uma candidatura relevante no cenário eleitoral. Me deixar de fora prejudica a democracia. Eu vou fazer um escândalo caso não participe e usar todos os instrumentos possíveis que tenho a minha disposição. Mas realmente não posso crer que um candidato pode ser tão covarde de me excluir do debate, ainda mais sendo a única candidata mulher.

Haddad (PT) e Erundina (PSOL) em São Paulo, Marcelo Freixo (PSOL) e a Jandira Feghali (PC do B) no Rio, você e o Raul Pont (PT) em Porto Alegre. Você não acha que existe uma clara divisão entre chapas semelhantes?
O PSOL nunca se alinhou a esse campo do PT e do PC do B. Nós nascemos em processo de ruptura com esse campo no governo Lula e depois com a Dilma. Nós sempre buscamos constituir um terceiro campo, um campo de oposição de esquerda ao governo do PT. Então eu acho natural que as chapas estejam separadas, embora se possa discutir eventualmente um apoio no segundo turno em que não se trate de construir aliança, e sim apoio contra um inimigo maior. Mas agora acho absolutamente saudável e necessário que esses projetos se apresentem separadamente no primeiro turno, até porque são projetos diferentes e que representam ambições bastante distintas.

 


Comentários

Uma resposta para “Erro do PT foi acreditar em governo de “conciliação de classes”, diz Luciana Genro”

  1. Avatar de Newton Carneiro
    Newton Carneiro

    na realidade que vem junto com nossa democracia faliu o sistema e pior ainda o político do Brasil ,passamos a pior fase de todos os tempos do Brasil, e neste atual momento não existe um político bom e pior ainda confiável ,pós como se diz na vida ,todos farinha do mesmo saco ,foi mais de 13 anos de uma farra danada ,e pior estavam todos juntos e felizes ,se não fosse o povo sair nas ruas e lutar pra tentar tirar está bravata política com certeza ja seriamos a segunda Venezuela , e agora como sempre estão tentando esconder que sabiam de tudo ,outubro vem ai ou votamos direito ,ou seremos sempre escravo desta gente

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