“O que nós estamos vendo no Brasil é o abandono do princípio republicano que rege o Judiciário”, foi o que disse a filósofa Marilena Chaui à Brasileiros, momentos antes do Ato Pela Legalidade Democrática, evento que reuniu juristas, intelectuais, artistas e lideranças de movimentos sociais, no teatro TUCA, da PUC-SP. O evento foi organizado pelo Centro Acadêmico 22 de Agosto da universidade e o Fórum 21. Marilena Chaui mostrou preocupação com a atual “ameaça à democracia brasileira”. “Esse trabalho ideológico da busca de um chefe, de uma figura que universalize a sociedade e passe por cima de todas as divisões, tradições e conflitos é a marca não apenas de uma sociedade autoritária ou de uma política autoritária, é também um risco de produzir um caldo de cultura fascista”, disse ela, referindo-se aos grupos que pedem o impeachment da presidenta Dilma Rousseff.
Segundo a filósofa, o poder Judiciário no Brasil está corrompido. Para ela, o que define o Judiciário é o cumprimento da lei, neutro e imparcial. “Hoje o suspeito já é considerado culpado sem nenhum julgamento. Você não precisa de provas, não presume a inocência. Coloca a culpa como ponto de partida. Isso é a destruição do Judiciário.”
Marilena Chaui foi a última participante a discursar no ato de ontem. Em sua fala, ela pediu a união da esquerda brasileira para lutar contra o golpe e alertou para a falta de articulação da direita. “A ameaça política do golpe é apenas a superfície. O que temos efetivamente é a consolidação de uma perspectiva conservadora e reacionária que aparece nessa multidão que sai às ruas para xingar e gritar, mas não tem uma proposta, um programa.” Em meio a um clima de tensão e resistência, a filósofa convocou todas as gerações presentes no encontro a ir para as ruas: “A luta continua!”.
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O contexto político atual é de uma gravidade imensa. Eu havia ficado muito preocupada com a terceira manifestação de 2013 em São Paulo, quando os jovens do Movimento Passe Livre saíram para comemorar a vitória e foram agredidos, massacrados, ensanguentados por jovens embrulhados na bandeira brasileira que diziam meu “meu partido é meu país” ,“fora política”. Eu comentei em vários lugares o risco que significava essa violência da direita. A manifestação de domingo aumentou minha preocupação. Na hora em que os manifestantes vaiaram e agrediram as lideranças do PSDB, ficou evidente que você tem uma multidão que não está articulada a nenhum movimento social, nenhum movimento popular e a nenhum partido político. É uma multidão sem freio, sem trava de segurança e que está à procura de um líder, um líder que apareça com essa universalidade, transcendência e o poder de unificação que impede a existência efetiva das contradições se manifestarem e impedem o coração da política democrática. Estamos em um momento político muito grave, porque esse trabalho ideológico é obra da classe média. Esse trabalho ideológico da busca de um chefe, de líder, de uma figura que universalize a sociedade e passe por cima de todas as divisões, tradições e conflitos é a marca não apenas de uma sociedade autoritária ou de uma política autoritária. É um risco de você produzir um caldo de cultura fascista
Na divisão dos três poderes, o que define o Judiciário é que ele tem de ser neutro e imparcial para cumprir a lei. O que nós estamos vendo no Brasil é o abandono do princípio republicano que rege o Judiciário. Estamos vendo um judiciário parcial que toma partido. Um Judiciário que não cumpre lei, mas persegue as pessoas. O que caracteriza o terror é: aquele que é considerado suspeito é por isso culpado e não é submetido a nenhum julgamento. Você não precisa de provas, e você não presume a inocência. Você não parte da inocência para provar a culpa. Você coloca a culpa como ponto de partida. Isso é a destruição do poder Judiciário.
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