O ministro aposentado do STF (Supremo Tribunal Federal) Joaquim Barbosa criticou nesta quinta-feira (12) a tramitação do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Para ele, as decisões sobre o afastamento foram tomadas sem levar a em consideração a opinião da população. “Como explicar ao mundo uma troca de comando tão espetacular? Nada sutil, apenas com a estampa de normalidade, como essa que está ocorrendo no dia de hoje. Como explicar ao mundo uma mudança tão brutal sem que ele, o maior interessado, o povo, tenha sido sequer cogitado como partícipe desse debate”, disse Barbosa na Vtex Day, feira de comércio eletrônico no Parque Ibirapuera.
Segundo Barbosa, o impeachment de Dilma é “destituído de legitimidade profunda”: “Do ponto de vista puramente legal, está tudo certo, mas não é assim que se governa um país. Isso precisa de nós, o povo”: “Não somos um bando de boçais que pode ser conduzido com essa sem-cerimônia”, declarou.
“Não é estranho que o povo assista mais uma vez, como se deu no final do século 19, bestializado ao que os políticos estão a perpetrar no nosso país? Onde estão as vozes da população?”, questionou Barbosa, referindo-se ao artigo do jornalista Aristides Lobo sobre a Proclamação da República: “O povo assistiu àquilo bestializado, atônito, surpreso, sem conhecer o que significava”, escreveu Lobo em 1889.
A ascensão do PMDB e do PSDB ao poder também foi criticada por Barbosa: “Estarão no comando do nosso País a partir de agora dois grupos bem especiais de operadores políticos”, disse em referência aos dois partidos. “O primeiro grupo, nestes 30 anos de vida democrática, jamais conseguiu eleger um presidente da República. Esse grupo terá agora a Presidência da República”, disse Barbosa em referência ao partido de Temer.
Ele criticou Michel Temer: “É muito grave tirar a presidente do cargo e colocar em seu lugar alguém que é seu adversário oculto ou ostensivo, alguém que perdeu uma eleição presidencial ou alguém que sequer um dia teria o sonho de disputar uma eleição para presidente. Anotem: o Brasil terá de conviver por mais 2 anos com essa anomalia”.
O segundo grupo de operadores políticos, no prazo constitucionalmente marcado para as próximas eleições [2018], iria completar 20 anos sem ganhar uma eleição, sem ter o gosto de uma vitória. Como justificar essa anomalia? Por que os nossos acadêmicos, os nossos intelectuais e os nossos meios de comunicação têm evitado esse debate?”
Barbosa disse que é “radicalmente favorável” à convocação de novas eleições pra presidente: “Essa é a verdadeira solução. A solução que eliminaria toda essa anomalia, esse mal-estar com o qual nós seremos obrigados a conviver nos próximos dois anos e oito meses. Dar a palavra ao povo”, defendeu. O ministro aposentado reconheceu, entretanto, que a medida tem empecilhos constitucionais. A única forma de ser aplicada, na visão de Barbosa, seria se Dilma tivesse renunciado e o vice tivesse feito o mesmo.
Barbosa disse acreditar que a destituição de Dilma está servindo a interesses espúrios. “Eles querem tomar o poder a qualquer custo para continuar nas práticas ilícitas. É isso que está em jogo”: “Eu tenho sérias dúvidas quanto à integridade e à adequação desse processo de impeachment por esse motivo que foi escolhido”, acrescentou. Para o ministro aposentado, “há um problema muito sério de proporcionalidade”, uma vez que manobras contábeis e fiscais semelhantes às feitas pelo governo federal são corriqueiras em outras esferas do Executivo, como nas administrações estaduais.
Apesar das críticas ao processo e aos grupos políticos que devem assumir o poder, Barbosa também atribuiu parte da culpa pela instabilidade política à Dilma: “A presidente Dilma Rousseff não soube conduzir o país. Não soube exercer a liderança que se espera de um chefe de Estado dessa envergadura. Ela agiu como se governasse para o seu grupo político e para os seus aliados de ocasião. Ela não soube se comunicar com a nação. Ela fez péssimas escolhas e cometeu erros imperdoáveis”, disse.
* Com Agência Brasil
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