Após horas de negociação no Palácio do Planalto, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva assume o cargo de ministro-chefe da Casa Civil, nesta quarta-feira (16). A ida da maior liderança do PT ao governo de Dilma será fundamental para fortalecer a articulação política do Planalto com o Congresso e dar uma sobrevida ao mandato da presidenta. É o que diz Maria do Socorro Sousa Braga, cientista política e pesquisadora da Ufscar (Universidade Federal de São Carlos): “Se ele soubesse que a coisa já estava para furar, ele não ia entrar. Esse é um lado positivo da entrada dele. É a percepção de que ele entrou porque pensa que tem condições de fazer alguma coisa com essa capacidade que ele tem de negociar com setores ambíguos. Ele entra para fazer esse jogo intra-governo e principalmente na base do governo. Não ia entrar para afundar o governo ou só para tentar se livrar da Justiça. Para mim tem muito mais do que isso. Ele entra para dar mais governabilidade ao Executivo”.
Leia a entrevista na íntegra abaixo:
Revista Brasileiros – A senhora acha que a entrada de Lula no governo é um passo acertado?
Maria do Socorro Braga – Para o governo vai ser importante. Lula é um articulador político, ele tem muito traquejo com a classe política e a Dilma não tem conseguido dar essa mesma dinâmica. Isso vai ajudar. É capaz de acalmar o PMDB, acabar com essa discordância entre os grupos que querem ficar e querem sair do governo. É possível que ele ajude o governo a permanecer por um tempo. Vai ficar mais tranqüilo, pelo menos na base aliada. Ele com certeza vai ser um ator importante para dar estabilidade nessa base e isso vai ter reflexos no Legislativo. Agora, tem um outro lado que a gente vai ter que esperar um pouco. Só as urnas em 2018 vão dizer como que o eleitorado vai receber essa notícia. Como ele tem esse envolvimento, essas denúncias, cria sempre no imaginário popular a ideia de que ele pode estar se beneficiando do fórum político privilegiado. Na verdade, ele não fica sem ter que dar satisfação. A imprensa fala como se ele agora tivesse um manto protetor. Não é isso, mas pode ser que seja assim no imaginário popular dos setores mais críticos ao governo, ao PT e ao Lula. Para o lado que tem preferência pelo PT e pelo Lula, é uma forma de proteger uma liderança na qual eles acreditam.
Lula dará uma guinada à esquerda no governo?
Tenho minhas dúvidas. Ele nunca foi à esquerda. O papel dele é muito mais de articulador, ele tem essa capacidade de negociar com setores bastante contraditórios dentro da lógica de uma democracia liberal como a nossa. Se ele fosse muito para a esquerda, ele acabaria dificultando essas negociações, com o mercado, com esses setores mais conservadores do PMDB. Ele sabe que a base não é à esquerda, é mais à direita. Não conseguiria visualizar ele indo à esquerda, ele vai ser muito mais conciliador. Seria criar mais dificuldade para dar continuidade a uma agenda que precisa ser colocada para o governo para andar. Eu sei que tem um lado complicado dessa história, que é a relação do PT com a CUT e com setores que não querem a reforma da previdência e outras questões voltadas para o mercado. De todo modo, eu penso que ele tem muito mais capacidade de fazer esse discurso, esse meio de campo entre essas várias forças e colocar mais dinamismo nos próximos dois anos do que a Dilma, se ela realmente permanecer no governo.
Mas o PT e o próprio Lula fizeram críticas à política econômica de Dilma, né?
Uma coisa é você estar fora do governo, mas ao mesmo tempo ser do principal partido que elegeu a presidenta e não ser favorável a algumas questões. Outra coisa é você passar para um governo desse, ter realmente que governar e ter que chegar a um denominador comum. Como que você vai fazer isso sem acirrar ainda mais a polarização que já está aí, as manifestações, esse último passo do PMDB querendo sair do governo… Esse contexto todo dificulta o Lula ir para algo mais à esquerda. Eu penso que ele até gostaria, e aí temos que ver na sexta-feira o quanto ainda a organização da esquerda e dos movimentos mais tradicionais vão para a rua. Uma força como Lula tem mais respaldo. Mas mesmo assim, pelas outras variáveis nesse tabuleiro de xadrez, ele não tem muitas condições de tomar atitudes muito mais radicalizadas. A tendência é assumir um posicionamento mais de centro, talvez uma outra reforma, não a que Dilma queria, mas ceder em algumas questões. Vai haver novas negociações, com certeza, mas não diria que vai haver condições suficientes para a esquerda assumir com muito mais pujança porque não tem hoje um cenário favorável para isso.
A ida de Lula para a Casa Civil o aproxima da Presidência em 2018?
Tudo vai depender do desdobramento da Lava Jato, das denúncias que virão, como que o governo e as outras forças vão responder às várias delações que vêm. Ao mesmo tempo, os candidatos da oposição também estão ameaçados, então tudo vai depender dos próximos passos. Eu penso que ele ainda é um candidato fortíssimo. Com as manifestações de sexta-feira a gente vai avaliar como está esse apoio. Fora as disputas intrapartidárias, porque nessas não tem outro candidato a não ser o Lula, ou mesmo nas forças de esquerda – o que traz um vácuo para esse campo. Ciro Gomes também poderia ser candidato. Mas tudo depende dos próximos passos, do Legislativo, tem o Cunha, e ainda tem a crise economia. Ele não vai querer ser candidato numa conjuntura onde o governo atual se mantiver com uma avaliação negativa. Se não melhorar o cenário econômico, se outras questões da Justiça também virem contrárias ao PT, maior a dificuldade dele ser candidato.
E o risco do governo cair com o Lula junto?
Se ele soubesse que a coisa já estava para furar, ele não ia entrar. Esse é um lado positivo da entrada dele. É a percepção de que ele entrou porque pensa que tem condições de fazer alguma coisa e mais no nível dessas relações que ele fez, essa capacidade de negociar com setores ambíguos. Ele entra para fazer esse jogo intra-governo e principalmente na base do governo. Não ia entrar para afundar o governo ou só para tentar se livrar da Justiça. Para mim tem muito mais do que isso. Ele entra para dar mais governabilidade ao Executivo.
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