A homenagem feita pelo deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) ao torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra na Câmara dos Deputados no último dia 17, durante a votação do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff, provocou o repúdio generalizado dos setores da sociedade que defendem a legalidade democrática e os direitos humanos. Milhares de mensagens de protesto contra Bolsonaro acabaram obrigando o Ministério Público Federal a abrir uma investigação sobre o caso. No exterior, a fala de Bolsonaro foi duramente criticada na CNN, no The Guardian, no El País, no Clarín e nas revistas The Economist e Der Spiegel.
Agora, organismos internacionais liderados pela Rede Latino-Americana de Justiça de Transição elaboraram uma nota de repúdio a Bolsonaro, que será encaminhada à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, à Procuradoria-Geral da República e ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados. O manifesto recorda que o deputado é “conhecido por suas declarações racistas, homofóbicas” e por sua “defesa da ditadura civil-militar de 1964”, e assinala que Bolsonaro “prestou homenagem a um torturador que chefiou a repressão política no Brasil”. As entidades expressam “o seu repúdio a esse discurso de ódio e esperam que sejam tomadas as medidas legais cabíveis contra o deputado”. A íntegra da nota está reproduzida abaixo, em português e em espanhol, mas ainda está aberta a novas adesões de pessoas físicas e organizações. A petição pode ser acessada aqui e as organizações que desejem aderir à mobilização podem fazê-lo pelo e-mail redelajt@gmail.com
Leia a seguir a íntegra da nota e seus signatários:
NOTA DE REPÚDIO À DECLARAÇÃO DO DEPUTADO FEDERAL JAIR BOLSONARO
No último domingo (17), durante a sessão, na Câmara dos Deputados, que votava a admissibilidade do processo de impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff, o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) dedicou seu voto favorável ao afastamento da presidenta “pela memória do Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff”. Conhecido por suas declarações racistas, homofóbicas e em defesa da ditadura civil-militar de 1964, o deputado prestou homenagem a um torturador que chefiou a repressão política no Brasil, ofendeu a memória das vítimas da ditadura e, particularmente, ao se referir à presidenta, violentou todas e cada mulher, independente de sua nacionalidade.
A Secretaria-Executiva da Rede Latino-Americana de Justiça de Transição (RLAJT), sediada na UnB e na UFMG, demais membros da RLAJT, organizações e coletivos que subscrevem a presente nota repelem veementemente a declaração do deputado e consideram o seu conteúdo incompatível com um regime democrático. Ao dedicar o seu voto a Ustra, o deputado Jair Bolsonaro fez um discurso de ódio, em apologia à ditadura e ao uso da tortura, o que constitui um abuso e uma usurpação do direito à liberdade de expressão.
O ex-coronel Brilhante Ustra, homenageado na fala do deputado, comandou o DOI-CODI do II Exército, em São Paulo, de 1970 a 1974, e foi responsável pela prática de inúmeros crimes contra a humanidade, como torturas, execuções sumárias e desaparecimentos forçados. Ustra torturou mulheres que, como Dilma, lutaram para restabelecer a democracia no Brasil e que, por isso, tiveram seus corpos estuprados, eletrocutados, violados por objetos e por ratos. Em 2008, o ex-coronel foi declarado torturador pela justiça brasileira, em decisão confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça, em 2014. Réu em 6 (seis) ações penais do Ministério Público Federal, Ustra faleceu em outubro de 2015, sem ter respondido pelos crimes que cometeu.
Pelo compromisso com a democracia conquistada no Brasil e nos demais países da América Latina, que passaram por diversas ditaduras e rupturas institucionais no último século, as entidades abaixo-assinadas expressam o seu repúdio a esse discurso de ódio e esperam que sejam tomadas as medidas legais cabíveis contra o deputado. Na atuação em defesa dos direitos humanos e na luta por memória, verdade e justiça, não se transige nem se aceita que um discurso, como o do deputado, que legitima a violência praticada no passado e continuada no presente, tenha lugar em um espaço público democrático. Ditadura e tortura NUNCA MAIS!
CARTA EN REPUDIO A LA DECLARACIÓN DEL DIPUTADO BRASILEÑO JAIR BOLSONARO
En la sesión del último domingo 17 de abril, cuando la Cámara de Diputados de Brasil decidió la admisibilidad de los procedimientos de juicio político (impeachment) contra la presidenta Dilma Rousseff, el diputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) dedicó su voto en favor de la destitución de la mandataria a la “memoria del coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, el terror de Dilma Rousseff”. Conocido por sus declaraciones racistas, homofóbicas y en defensa de la dictadura cívico-militar de 1964, el diputado rindió homenaje a un torturador que dirigió la represión política en Brasil, ofendiendo la memoria de las víctimas y con su particular referencia a la presidenta violentando a todas las mujeres, independientemente de su nacionalidad.
La Secretaría Ejecutiva de la Red Latinoamericana de Justicia de Transición (RLAJT), con sede en la Universidad de Brasilia (UnB) y en la Universidad Federal de Minas Gerais (UFMG), otros miembros de RLAJT así como otras organizaciones que adhieren a este planteo repudian los dichos deldiputado y consideran que su contenido es incompatible con un régimen democrático. Al dedicar su voto a Ustra, Bolsonaro produjo un discurso de odio, apologético de la dictadura y del uso de la tortura, lo que constituye un abuso y una usurpación del derecho a lalibertad de expresión.
El ex coronel Ustra, reivindicado por el diputado, dirigió el DOI-CODI del II Ejército en São Paulo, entre 1970 y 1974. Fue responsable de numerosos crímenes contra la humanidad, incluyendo la tortura, las ejecuciones sumarias y las desaparicionesforzadas. Ustra torturó mujeres que, como Dilma, han luchado para restaurar la democracia en Brasil. Los cuerpos de estas mujeres fueron violados, electrocutados y ultrajados con objetos y ratones. En 2008, los jueces brasileños condenaron al ex coronel por su responsabilidad en casos de tortura, una decisión que fue confirmada por el Supremo Tribunal de Justicia (STJ) en 2014. Acusado por seis (6) acciones criminales por el Ministerio Público Federal, Ustra murió en octubre de 2015 sin responder por los crímenes que cometió.
Por el compromiso con la democracia conquistada en Brasil y en otros países de Latinoamérica que han atravesado dictaduras y rupturas institucionales en el último siglo, las organizaciones abajo firmantes expresan su más amplio repudio a este discurso de odio y manifiestan la esperanza de que se apliquen acciones legales contra el diputado. La defensa de los derechos humanos así como la lucha por la memoria, la verdad y la justicia impide aceptar que un discurso como el del diputado — que legitima la violencia del pasado y que continúa en el presente — tenga lugar en el espacio público democrático.
Dictadura y tortura: ¡NUNCA MÁS!
Assinam:
Secretaria da Rede Latino-Americana de Justiça de Transição (UFMG/UNB) – Brasil Comissão de Anistia do Ministério da Justiça – Brasil Grupo de Estudos sobre Internacionalização do Direito e Justiça de Transição (IDEJUST) – Brasil Centro de Estudos sobre Justiça de Transição (CJT/UFMG) – Brasil Núcleo de Preservação da Memória Política – Brasil Memoria Abierta – Argentina Comisión Mexicana de Defensa y Promoción de los Derechos Humanos A.C. (CMDPDH) – México Observatorio de Justicia Transicional de la Universidad Diego Portales – Chile Observatorio Latinoamericano para lainvestigacionen Politica Criminal y en las Reformas en el Derecho Penal, Universidad de la Republica (OLAP) – Uruguai Associação Nacional de Direitos Humanos, Pesquisa e Pós-graduação (ANDHEP) Coletivo Aparecidos Políticos Coletivo Político Quem Instituto Outubro Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania de Marília (NUDHUC) Núcleo de Direitos Humanos da PUC-PR Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos da Universidade Federal da Paraíba (NCDH/UFPB) Red Latinoamericana de Sitios de Memoria
Benjamin Cuellar – Membro afiliado da RLAJT (El Salvador) Cath Collins – Professora na Ulster University (Reino Unido) Francesca Lessa – Professora da University of Oxford (Reino Unido) Iris Jave – Coordenadora do Instituto de Democracia e Direitos Humanos da PUC-Peru (Peru) Jair Krischke – Presidente Movimento de Justiça e Direitos Humanos (Brasil) Jo-Marie Burt – Professora na George Mason University e Assessora Principal da WOLA (EUA e Peru) Nina Schneider – Centro de Estudos Sobre o Sul Global (Global South Study Center, GSSC) (Alemanha) Valeria Barbuto – Memoria Abierta (Argentina)
Caso outras organizações queiram aderir ao manifesto, entrem em contato através do e-mail: redelajt@gmail.com
A adesão também pode ser feita através de petição pública, acessada aqui
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