Quem é quem de cada lado do muro em Brasília

Do lado direito do muro da vergonha, camisetas amarelas estampavam mais que o símbolo da CBF. Manifestantes a favor do impeachment da presidenta Dilma Rousseff carregavam no peito mensagens como “Quero meu Brasil limpo”, “Cunha, meu malvado favorito”, “Super Moro”, além das tradicionais “Basta” (com a imagem de uma mão com quatro dedos) e “Fora PT”. Em clima de “já ganhou”, famílias inteiras ocupavam o gramado diante do telão para acompanhar a votação da admissibilidade do impeachment.

A cada voto favorável, gritos e comemorações. Quando os deputados votavam “não ao golpe”, ouviam-se vaias e xingamentos como “Dilma, filha da puta” ou “Vai tomar no cu”, seguida de “vendido!”, pelas caixas de som. Isso tudo diante de muitas crianças, várias delas envolvidas pela bandeira brasileira.

“Estou aqui porque quero o impeachment da Dilma”, afirmou Lídia Alves de Faria, 63 anos, bancária aposentada. Ao ser perguntada sobre um possível governo Temer, usou uma metáfora médica: “Primeiro você tira o tumor, depois você trata as metástases”. Para ela, Eduardo Cunha e Dilma “sempre negociaram a favor” do governo, estavam de acordo. Lídia acha que Cunha não é responsável por viabilizar o processo de impeachment. “Não foi Cunha, foi o povo na rua, porque de partidos a gente não vive neste País”, completa.

Ao mesmo tempo, do lado esquerdo do muro, um telão também mostrava a votação do processo de impeachment. Milhares de trabalhadores rurais assistiam a todo o tempo deputados evocando palavras como “sonho”, “família”, “filhos” e “esperança” para, justamente, tolherem as expectativas por um País mais justo. Os semblantes, muitos deles trincados do trabalho ao Sol, foram ficando preocupados.


O batuque deu lugar ao silêncio. Mas cada voto contra o impeachment foi comemorado com punhos cerrados e sorrisos de quem sabe o quanto vale a democracia. Para quem sempre esteve na luta por direitos humanos e sociais, a etapa atual é mais um motivo para resistir. “Estamos aqui felizes, independente de conseguirmos barrar o golpe. Estamos defendendo a democracia”, diz o estudante Sadrak Oliveira, 30 anos, que foi a Brasília de ônibus desde Palmas (TO). Antonia Eliene Araújo, 30 anos, paraense moradora de Goiânia, foi com filhos e sobrinhos “lutar a favor da Dilma”. A mais nova da família é Gabriele, de 4 meses, filha de Maria Charlene Araújo de Lima, 16 anos. “Minha vida mudou bastante. Ela ajudou muito os pobres”, afirmou, orgulhosa.

Antonia recebe Bolsa Família para garantir o mínimo de condições de vida. Ela sabe que o impedimento é uma ameaça aos direitos conquistados e que a troca de presidentes – cujo programa de governo não é objeto de escolha da população, mas, sim, uma imposição – significa um retrocesso que terá impacto direto sobre sua vida e de seus filhos. Ao contrário das mensagens das camisas amarelas do outro lado do muro, as pessoas seguravam a Constituição Brasileira, os adesivos pediam “mais emprego, direitos e salários” e avisavam: “Meu voto merece respeito”.

Enquanto isso, dentro da Câmara dos Deputados, o jovem do Movimento Brasil Livre Kim Kataguiri acompanhava o voto a voto em um telão dentro do Salão Verde. A sala oval de carpete verde foi hoje um disputado espaço onde normalmente só adentram jornalistas (os que conseguiram a cobiçada credencial com o selo verde) e autoridades. Sinal dos tempos?


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