O Brasil não é para principiantes. A frase atribuída ao maestro Tom Jobim foi lembrada pelo diplomata americano Thomas Shannon em palestra recente sobre a economia brasileira, na Universidade George Washington, nos Estados Unidos. “Eu tenho um adendo para esta frase. O Brasil não é para quem tem visão de curto prazo”, disse Shannon, que esteve à frente da embaixada americana em Brasília por mais de quatro anos. Quando ele deixou o País, em setembro de 2013, os saguões dos aeroportos estavam lotados, devido às transformações sociais que continuavam a levar novas parcelas da população à classe média.
De lá para cá, não passaram nem 20 meses. O cenário mudou. A mobilidade social diminuiu, a economia entrou em processo de estagnação e o segundo mandato da presidenta Dilma Rousseff viu quebrada a tradição dos 100 dias. Esse era o prazo que analistas de todos os matizes costumavam dar aos governos para começar a dissecá-lo – para o bem ou para o mal. Desta vez foi diferente, não só devido à falta de visão de médio e longo prazo. Há também um profundo desaprendizado sobre como fazer política. De um lado, quem perdeu não soube perder. Do outro, quem ganhou não soube ganhar. Senão, o que explicaria sair da boca da oposição frases como “tentativa de salvar o que não merece ser salvo” ou “não quero o impeachment, quero ver Dilma sangrar”? E como justificar a inação do governo? Tem-se a impressão de que uma imensa crise político-econômica tomou conta de um País dividido como nunca.
Como se não bastasse, a insegurança diante do futuro passou a assombrar o cotidiano. A mudança de cenário fez até a agência de classificação de riscos Standard & Poor’s se antecipar e entrar em campo em março, para avaliar o grau de investimento do Brasil. Qual é mesmo o tamanho da crise? Para o desalento dos que apostam no caos, a agência manteve a nota do Brasil em BBB-, ou seja, atestou que o País é um bom pagador. No relatório, a agência se disse satisfeita com as investigações de desvio de dinheiro na Petrobras e com o pacote fiscal preparado pela equipe econômica. Para a S&P, a maior fragilidade da economia brasileira é a incapacidade, até agora, de cumprir metas de superávit primário.
Na história recente, as contas do País já estiveram muito mais cambaleantes, sem abalar as ruas nem provocar panelaços. O componente político da crise é tamanho que o psicanalista Christian Dunker, professor livre-docente da USP, antevê “um tempo novo de divisão social, não no real, mas na representação, das pessoas produzirem uma situação geopolítica parecida com a que o Chile viveu até bem recentemente, de estreitamento do centro e polarização de todos os tipos”.
Essa polarização é mais perceptível nas grandes cidades, onde os protestos contam até com saudosistas da ditadura militar. Em contrapartida, não falta perspectiva nem memória àqueles que criam alternativas para seguir em frente. Vão de empresários – como Deusmar Queirós, da rede Pague Menos, que defende ser a hora de gerar empregos e crescer, ao engenheiro Michel Friedhofer, que criou no Facebook a página Um Convite à Civilidade, para estimular alterações no comportamento que podem gerar bem-estar.
Iniciativa coerente com as propostas do filósofo Renato Janine Ribeiro, que em entrevista na edição de março da Brasileiros lamentou a perda do discurso ético e questionou o fato de a inclusão social no Brasil ter sido vinculada apenas ao consumo. “Faltou estruturar uma sustentação além do bolso”, disse Janine. A revista estava nas bancas quando o filósofo foi convocado a assumir o Ministério da Educação. “São 50 milhões de alunos e dois milhões de professores”, resumiu. “É o Brasil subindo a ladeira.”
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