Durante a última quarta-feira (28), a Câmara dos Vereadores de São Paulo aprovou o fim do rodízio municipal de veículos, em votação simbólica (quando as lideranças entram em acordo sobre um projeto antes de votá-lo). Apesar disso, as bancadas do PSD, PSDB e do PT já haviam avisado que se a votação fosse nominal a medida seria rejeitada. Ao todo as três siglas somam 27 dos 55 parlamentares. Na sexta-feira (30), o prefeito Fernando Haddad (PT) afirmou que irá vetar o projeto.
Mesmo assim, o autor do projeto Adilson Amadeu (PTB-SP) considerou que a votação “serviu para alertar a cidade sobre o que se pode esperar do trânsito em um futuro próximo”. Em entrevista à Brasileiros, o vereador ainda defendeu que o rodízio é uma forma ultrapassada de restrição.
A proposta de Amadeu – na pauta de votações da câmara desde 2006 – vai contra as últimas ações e discursos do prefeito Fernando Haddad e da gestão da Secretaria de Transportes, que tem dado prioridade ao transporte público. Em dezembro do ano passado, Jilmar Tatto (PT), secretário municipal de transportes, reafirmou que a gestão já estava estudando aumentar o perímetro da restrição, que hoje abrange apenas o chamado “centro expandido”, para outras vias importantes da cidade. Alguns desses projetos estão tramitando na Câmara dos Vereadores. Outros, nas mesas de Tatto e Haddad.
Para Adilson Amadeu, 63 anos, dono da SODESP, um dos maiores despachantes do País, o problema está na ausência de semáforos inteligentes e de agentes de tráfego que orientem os motoristas nas principais vias. “A CET deveria ter mais pessoal principalmente em grandes avenidas onde estão os corredores de ônibus criados pelo [Fernando] Haddad. Quando não tiver ônibus passando nestas pistas, os agentes poderiam autorizar a passagem de veículos. Isso já diminuiria o trânsito consideravelmente. Nós, que temos nossos carrinhos podemos nos organizar no trânsito”, completa.
O professor do Departamento de Engenharia de Transportes da Universidade de São Paulo, Hugo Pietrantônio, critica a forma como o legislativo paulistano lidou com o tema. “O principal ensinamento a ser tirado da iniciativa dos vereadores é a fragilidade da sociedade diante de iniciativas oportunistas – referindo à clara motivação eleitoral que a medida sugere – ou inoportunas, como a ação do Ministério Público sobre a regulamentação do uso dos corredores de ônibus pelos táxis. Em ambos os casos, a atribuição do Poder Executivo municipal foi contestada por ações de áreas alheias, o legislativo e o judiciário, que arrogaram seu poder superior ao intervir em temas corriqueiros da gestão da cidade sem base técnica e impondo responsabilidades ao Executivo”, argumenta.
O assunto repercutiu negativamente nas redes sociais nesta quinta-feira (29), principalmente com pedidos de alternativas práticas para substituir o rodízio. Procurada pela reportagem, a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) informou, por meio de nota, que não vai se pronunciar sobre o assunto. O secretário municipal de transportes da cidade, Jilmar Tatto, não retornou o contato.
O vereador Adilson Amadeu conversou com Brasileiros. Veja abaixo os principais trechos:
Brasileiros: Quais os motivos para você propor o fim do rodízio municipal em São Paulo?
Amadeu: Quando o rodízio de carros foi implantado, em 1997, eu achei a ideia boa. Naquela época a frota era de quase 4 milhões de carros. Hoje estamos com cerca de 7 milhões, sendo que mais de 2 milhões destes estão em situação irregular. Além disso, os semáforos não funcionam, os educadores de trânsito só estão nas ruas em alguns horários – de manhã e no fim da tarde -, e a CET não tem guinchos suficientes, demorando para tirar um veículo quebrado de uma rua, por exemplo. Eu fico ouvindo especialistas que só falam no papel, papel, papel, e na verdade não ajudam nada. Nós precisamos melhorar, senão será um caos em breve. O pico de tráfego de veículos já está gerando depressão nos condutores, que perdem exames em hospitais, compromissos, etc.
Brasileiros: E você vê um culpado nisso?
Amadeu: O governo deu incentivos para a compra de carros nos últimos anos e as classes média e alta compraram dois, três veículos apenas para burlar o rodízio. Junte isso com a ausência de transporte de excelência: não tem metrô, não tem ônibus. Na verdade, o prefeito precisa fazer alguma e vocês, jornalistas, precisam cobrá-lo por isso. A arrecadação de impostos precisa ser destinada para melhorias da cidade, incluindo o transporte. Precisa ser feito por pessoas competentes. Eu acho que causei alguma coisa na cidade com esse projeto.
Brasileiros: As críticas direcionadas ao seu projeto argumentam que, se o rodízio acabar, o trânsito só tende a crescer.
Amadeu: Discordo. Essa semana alguns funcionários da CET ficaram em greve e o trânsito ficou bom. O povo conseguiu resolver uma situação que o Poder Executivo não consegue. Mas o problema são os semáforos, que travam o trânsito, e a ausência de agentes da CET orientando o tráfego corretamente. Sem essa estrutura, tudo vai parar mesmo. Quando acontece um acidente com caminhão, então, é ainda pior. Não tem guincho para tirá-lo e daí a CET precisa alugar um veículo adequado para este tipo de serviço. A situação só vai melhorar com transporte de excelência: metrô e ônibus. Isso está comprovado. Ajudaria também se tivéssemos orientadores sugerindo a entrada de carros nas faixas exclusivas quando não estiver passando ônibus, por exemplo.
Brasileiros: Você está sugerindo que as pessoas podem se organizar no trânsito?
Amadeu: Eu tenho certeza. Todos nós que temos um carrinho podemos nos organizar no trânsito.
Brasileiros: Você cita cerca de 2 milhões de carros irregulares. Este dado corresponde a que tipo de veículo?
Amadeu: Cidadãos que não pagam IPVA, DPVAT, licenciamento, por exemplo, e continuam rodando com seus carros. Pergunta para um motorista qualquer quantas vezes ele foi parado em uma blitz e teve seus documentos conferidos. Quase ninguém! E ainda quando são pegos, recebem uma guia para regularizar a situação em 30 dias…
Brasileiros: Sobre o projeto, o prefeito Fernando Haddad já disse que vai vetá-lo.
Amadeu: Então ele que crie uma alternativa melhor para o problema. Ele deve estar bravo pelo fato de o projeto ter passado na Câmara.
Brasileiros: Você falou com ele depois da aprovação?
Amadeu: Não falei, mas eu quero ajudar. Eu acho que o [Fernando] Haddad vai fazer uma ótima gestão nestes anos finais que ele tem como prefeito.
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