Depois de listarmos os grandes filmes brasileiros que atingiram às telas em 2013, BRASILEIROS também fez sua lista das grandes dez produções internacionais deste ano. São filmes que se destacaram em festivais, na crítica especializada e nas salas de cinema. Se você ainda não os viu, não deixe de dedicar um tempinho a eles.
1. Tabu – Direção Miguel Gomes
“O verdadeiro paraíso perdido talvez seja a juventude”, disse o diretor português Miguel Gomes em entrevista à imprensa brasileira na época do lançamento de Tabu. A poesia da frase diz respeito ao próprio filme, dividido em duas partes, a primeira intitulada Paraíso e a segunda Paraíso Perdido. Filmado em preto e branco, com uma parte falada e outra muda, Tabu é um daqueles filmes que te deixam meio sem chão quando sobem os créditos finais. Na primeira parte conhecemos Aurora, uma senhora cuidada por uma empregada africana e por sua vizinha. Mostrando sinais de confusão mental e próximo de sua morte, Aurora pede que as duas outras mulheres localizem um amigo de seu passado. Ele é Ventura, o homem que narrará toda a segunda parte do filme. É em um flashback contínuo que Ventura revela ser parte fundamental no passado de Aurora, quando os dois se apaixonaram em um cenário africano, selvagem tanto a eles quanto ao amor dos dois.
2. Frances Ha – Direção Noah Baumbach
O que fazer quando todas suas expectativas dão errado? Bem, para Frances Ha só há uma saída: continuar, mesmo que isso fuja muito mais do controle do que ela gostaria. Frances é uma jovem de 27 anos (não tão jovem assim segundo um de seus amigos) e sonha em ser bailarina. O problema é que ela não é tão boa a ponto de não ser escalada para uma apresentação de natal. Além disso, por mais que não se sinta inadequada, Frances demonstra certa sensação de não pertencimento, latente a tudo. Ela está longe de ter uma vida adulta sob controle, diferente de seus amigos, que aparentemente, parecem estar com a vida nos eixos: têm um namorado, um apartamento cool e um emprego legal, por exemplo. Do mesmo diretor de A Lula e a Baleia, Noah Baumbach e co-escrito com a atriz que interpreta Frances, Greta Gerwig, Frances Ha é um filme que fala sobre uma geração, mas não na tem a pretensão de retratá-la. Talvez mais do que isso, fale sobre as dificuldades da vida contemporânea em uma abrangência maior. Amadurecerimento, inadequação, quebra de expectativas e reinventar-se, bem, são temas que acabam falando sobre e com todo mundo, não?
3. Blue Jasmine – Direção Woody Allen
No último longa de Woody Allen, a protagonista Jasmine se encontra em uma história contemporânea sobre golpes financeiros e suas consequências, que, no caso, destroem a vida de uma mulher que saiu da pobreza, mas volta a ela, sem conseguir manter a cabeça no lugar. Cansada das traições do marido, o empresário Hal, na pele de Alex Baldwin, Jasmine, vivida por Cate Blanchett, rompe seu casamento. Sem dinheiro, ela deixa uma sofisticada Nova York para morar no modesto apartamento com a irmã Ginger, em São Francisco. Destruída e emocionalmente perdida, Jasmine vive a sua nova realidade com distância, se recusando a fazer parte dela e projetando novos planos grandiosos para aquela vida que pensa que tão logo irá viver. A fragilidade, as neuroses e a sensação de deslocamento, temas recorrentes à obra de Woody Allen também estão em Blue Jasmine.
4. A Caça – Direção Thomas Vinterberg
Thomas Vinterberg, o mesmo diretor de Festa de Família (1998), retorna ao cinema com um filme, no mínimo, incômodo. A Caça traz como protagonista um professor de uma escola primária, Lucas, interpretado pelo ator dinamarquês Mads Mikkelsen. Nele, o espectador se vê num jogo angustiante, onde não sabe se mantém sua empatia pelo personagem central ou se angustia com sua falta de intolerância. Lucas é um cidadão pacato, recém-divorciado e com um filho adolescente. Na pequena comunidade em que vive, é adorado e respeitado por todos. No entanto, tudo muda quando a pequena Klara de 8 anos, uma de suas alunas e filha de seu melhor amigo, confunde seus sentimentos pelo professor e tenta beijá-lo. Lucas a repreende e diz a ela que beijos são reservados para papais e mamães. Ingenuamente, Klara reproduz para uma de suas professoras uma palavra de teor sexual, que ouviu de seus irmãos mais velhos, associando-a Lucas. É quando ele se vê em um centro de acusações, tendo elas a pedofilia. Logo, Lucas é afastado do trabalho, dos amigos e toda a pequena cidade o olha de viés. Instala-se uma caça moral, mesmo que ninguém tenha provas do acontecido.
5. O que traz boas novas – Direção Philippe Falardeau
O filme que concorreu ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro de 2012 só chegou aos cinemas brasileiros neste ano. Nele somos apresentados à realidade de uma escola primária no Canadá, onde já no início do longa uma professora é encontrada morta em uma das salas de aula. O suicídio não parece se encaixar em um cenário onde tudo, aparentemente, deveria estar bem. Afinal, falamos de uma boa e organizada escola para crianças em um dos países modelo de boa educação. Cabe ao imigrante argelino Bachir Lazhar assumir o papel de professor substituto. Mas Bachir também causa outro desconforto ao propor uma forma de ensino retrógrada para os padrões da pedagogia de hoje. Porém, aos poucos conquista a empatia dos pequenos alunos e se afeiçoa cada vez mais a eles. E, diferente de outros professores, é ele quem perguntará aos alunos o que a morte de sua professora lhes causou. Em paralelo, o espectador recebe pistas do passado de Bachir e os motivos que o levaram a pedir asilo no Canadá.
6. Django Livre – Direção Quentin Tarantino
Tarantino revisita o gênero faroeste spaghetti em um dos filmes mais debochados e divertidos do ano. Como era de se esperar, a temática da vingança está lá dando o tom, a graça e o ritmo do filme. Django, um escravo liberto, interpretado por Jamie Foxx, se une ao caçador de recompensas, o alemão Dr. Schultz vivido pelo alemão Christoph Waltz. Juntos, eles embarcam em uma trajetória heroica e, evidentemente, sanguinolenta. Deixando o Texas, os dois viajam em direção ao Mississipi onde se encontra a esposa de Django, Brunhilda, que é mantida sob escravidão pelo cruel fazendeiro Calvin Candie (Leonardo DiCaprio). Nessa jornada, Schultz ensina a Django as técnicas necessárias para que ele também seja um novo caçador de recompensas.
7. A Espuma dos Dias – Michel Gondry
A adaptação do livro homônimo de Boris Vian para os cinemas encontrou nos deslimites criativos do diretor Michel Gondry uma versão ainda mais surrealista. Dessa forma, se torna possível coexistir em um mesmo universo, ambientado em Paris, um rato com rosto de homem, um relógio que sai andando pela casa, um chef de cozinha que mora na televisão e enguias que saem da torneira para virarem o jantar. É nesse cenário que conhecemos o protagonista Colin (Romain Duris), um jovem rico e ocioso que tem como melhor amigo Chick (Gad Elmaleh), um excêntrico engenheiro que venera o filósofo Jean-Sol Partre, em referência meio óbvia a Jean Paul Sartre. Além dele, Colin conta com Nicolas (Omar Sy), seu cozinheiro particular que também é seu conselheiro para todos os assuntos, incluindo, os sentimentais. Colin se apaixona pela delicada Chloé (Audrey Tatou, a mesma de Amélie Poulain) e os dois se casam. Tudo parece estar nas nuvens, como o passeio feito em uma engenhoca que leva o casal para passear pelo céu de Paris. Mas as coisas mudam, incluindo as cores, a iluminação e o cenário, quando Chloé é diagnosticada com uma Flor de Lótus no pulmão. Aos poucos, da mesma forma que a flor de Chlóe vai se expandindo, a escuridão e a tristeza vão tomando conta dos personagens.
8. Amor – Direção de Michael Haneke
Georges (Jean-Louis Trintignant) e Anne (Emmanuelle Riva) são um casal de músicos aposentados. Juntos, eles vivem uma vida tranquila e sofisticada. No grande apartamento em que moram, todos os elementos denotam uma vida de bom gosto: uma grande e vasta biblioteca, um piano de cauda e obras de arte pontuam as paredes. Ao se debruçar sobre a história de um casal de idosos, Haneke contempla e reflete sobre a eminência do fim e a impotência que temos diante dele. Sem anúncio prévio, em uma manhã Anne tem um derrame que a paralisa quase que completamente. Confinada a um corpo que não a responde, a até então independente Anne se limita aos cuidados de um marido devoto, que se prende a uma promessa feita a ela. Aqui, Haneke dá todos os espaços e silêncios para o espectador também contemplar e se angustiar com o derradeiro fim da vida.
9. Blancanieves – Pablo Berger
A história da Branca de Neve e seus Sete Anões já foi contada uma centena de vezes e em diferentes mídias e propostas. Então, por que a mesma Branca de Neve levaria espectadores ao cinema em 2013? Bem, se diretor espanhol Pablo Berger se fez essa pergunta não sabemos, mas fato é que ele pegou um clássico conto de fadas e o tornou em um filme belíssimo e um pouco mais cruel que o original. Filmado em preto e branco e mudo, na nova versão Branca de Neve é uma toureira que perdeu sua memória. As principais referências ao clássico estão lá, como a madrasta vaidosa (Maribel Verdú) e o pai submisso (Daniel Giménez Cacho). À pedido de sua madrasta, seu amante tenta matar Branca de Neve (Macarena Garcia) afogada. Seguro de que realmente a matou, o amante dá-lhe as costas e não percebe que a menina está desmaiada, porém viva. Quem a resgata é um grupo de anões de circo que também se apresenta em pequenas touradas. Sem memória, aos poucos Neve recebe pistas de seu passado e, ao tentar salvar um de seus pequenos amigos do ataque de um touro, descobre seu talento herdado do pai, um famoso toureiro. Porém, quando acreditamos que os personagens estão próximos a triunfarem, na versão de Berger, vemos que nem um conto de fadas dá concessões a finais felizes.
10. Azul é a Cor Mais Quente – Direção Abdellatif Kechiche
A adaptação do romance gráfico da francesa Julie Maroh para o cinema ganhou grandes proporções polêmicas neste ano. Em livre adaptação, o diretor Abdellatif Kechiche, conhecido por suas técnicas exaustivas de filmagem, conta a história da adolescente Adele (o filme em francês recebeu o título La Vie d’Adèle enquanto a graphic novel de Maroh remete ao título traduzido em português). Com longas cenas, quase que documentais, conhecemos o dia a dia de uma adolescente comum que vive no interior da França. Vemos Adéle comendo, dormindo, correndo para pegar o ônibus, comendo de novo e dormindo novamente. A repetição dessas cenas banais acabam aproximando o espectador de Adèle. Ficamos tão próximos do cotidiano da personagem, que torna-se, talvez, mais ‘natural’ o fato de vermos a intimidade tão explícita de Adèle (Adèle Exarchopoulos) e Emma (Lèa Seydoux) em uma cena de quase 10 minutos ininterruptos. É Emma, aliás, a paixão arrebatadora que Adèle encontra ao ver-se inadequada a uma relação heterossexual com um rapaz de seu colégio. Mas apesar da paixão e do amor que as duas constroem aos nossos olhos, Adèle e Emma também têm seus pequenos abismos, comuns a qualquer casal. Enquanto Emma é uma jovem artista plástica que cresceu em um contexto privilegiado – uma família que a aceita, com referências de um mundo sofisticado, Adèle é uma simples garota que não se interessa tanto pelas artes e que a felicidade para ela é ser professora do jardim da infância e ter sempre ao seu lado Emma. Mas esta quer que Adèle tenha sua independência e se integre melhor ao seu universo, aos seus amigos, todos artistas. As diferenças entre ambas, tão banais quanto uma refeição diária de Adèle, levarão as duas a uma não-anunciada distância, que aos poucos culmina em decisões premeditadas, porém humanas.
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