Polêmico, revolucionário, genial. Nelson Rodrigues foi tudo isso em sua carreira como jornalista, romancista, cronista e dramaturgo. Nascido em Recife no dia 23 de agosto de 1912, mas carioca como poucos, o autor de clássicos do dramaturgia nacional como Vestido de Noiva (1943) — peça responsável por inaugurar o moderno teatro brasileiro — Álbum de Família (1945) e Beijo no Asfalto (1960) completaria nesta quinta-feira, dia 23, 100 anos de vida.
Poucos autores entenderam tão bem o seu tempo quanto Nelson Rodrigues. Ler, ver e assistir Nelson é encarar um retrato do Brasil dos anos 1940, 1950 e 1960, com seus maneirismos, problemas e complexos. Um Brasil do Rio de Janeiro capital e centro irradiador de cultura e de modismos, um país em que mudava de forma acelerada, passando do bucolismo rural para a rapidez da modernidade.
Modernidade arcaica que ele soube traduzir para o teatro, com suas peças psicológicas que revolucionaram os tablados brasileiros, trazendo elementos do que havia de melhor na Europa sem deixar para trás as cores e os costumes brasileiras. Peças sobre traição, honra, crimes passionais, com linguagem ágil e cinematográfica que misturava Ibsen ao Largo da Carioca.
Se foi o teatro que consagrou Nelson Rodrigues, foi o jornalismo, e especialmente na crônica, que mais lhe deu palanque. Nelson teve uma longa e prolífica carreira em redações, que começou ainda na infância, nos jornais A Manhã e Crítica, de seu pai, Mário Rodrigues, e durou até o final de sua vida, em 1980. Neste período Rodrigues passou por praticamente todos os grandes jornais do Rio de Janeiro, de O Globo até a Última Hora, de Samuel Weiner, passando por vários dos Diários Associados de Assis Chateubriand.
Em suas colunas Nelson falou de tudo, dissertando sobre seus assuntos prediletos: a alma humana, os costumes, os idiotas de ambos os sexos, o Brasil, o seu Rio de Janeiro, a revolução sexual, os militares (que ele apoiou ardentemente) e o futebol. Suas frases exprimem tão bem o sentimento nacional que se tornaram parte da linguagem comum e seu “complexo de vira-lata” sintetiza de forma magistral o sentimento brasileiro perante o mundo. Ainda hoje.
Sua máquina de escrever era afiada e não poupava ninguém. Por isso Nelson foi um dos autores mais perseguidos do Brasil contemporâneo. Era odiado pela esquerda, que nunca engoliu seu envolvimento com a Ditadura Militar, e pela direita, que via em sua peças, cheias de traições, atentados aos bons costumes. Nelson era um reacionário, um velho tarado e, mais do que tudo, um incompreendido. Foi censurado e achincalhado, mas nunca esquecido. Gostava de incomodar os óbvios e as obviedades, as manadas ruminantes e unanimemente burras, que babavam grossa e bovinamente.
Nelson Rodrigues morreu em 21 de dezembro de 1980. Tuberculoso e cardíaco, quase cego. Ao fim da vida, se declarava a maior velhice da América Latina, apesar de ter apenas 68 anos. Sua obra continua viva.
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