O que é bom em um festival de cinema são os acontecimentos inesperados. Aqueles filmes dos quais você não espera nada, não dá nada e, de repente, “no último verão”, eles explodem na tela, deixando um gostinho bacana no final da sessão. Foi assim com a exibição de Eu Não Quero Voltar Sozinho, de Daniel Ribeiro, que deve ser o vencedor do prêmio de melhor curta-metragem nacional do festival deste ano. O filme deve tirar o prêmio de outro curta, que o público e a crítica gostaram muito, o desenho animado Tempestade, de César Cabral. Talvez o júri oficial dê o prêmio de melhor direção para César.
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Mas, voltando ao curta Eu Não Quero Voltar Sozinho, que foi ovacionado no final da sessão, consegue uma empatia muito grande do público, pois toca com delicadeza um tema ainda espinhoso na sociedade brasileira: a descoberta da sexualidade na adolescência. Nesse caso, o desabrochar de sentimentos entre dois adolescentes do mesmo sexo na escola. O jovem cego Leonardo, que tem uma convivência ambígua com sua amiga Geovana, e fica balançado e confuso quando chega à escola o jovem Gabriel. A relação entre os três adolescentes é o fio condutor do bonito filme, que se desenrola (parafraseando o filme Desenrola) com desenvoltura para um final mágico, mesmo que banal.
Antes de passar para o filme de longa-metragem, Desenrola, exibido logo após o curta, aconteceu um fato que merece ser comentado: a sessão, que estava lotada, era composta de crianças, adolescentes, adultos e idosos. Quase no final do filme, acontece um beijo entre os dois adolescentes. Depois da cena, uma mãe próxima a mim, pegou a filha pelo braço com força e ambas se encaminharam para a saída. Ela ficou visivelmente aborrecida com a cena, em clara demonstração de preconceito. O filme anterior, também do diretor Daniel Ribeiro, Café com Leite, também falava sobre uma relação homossexual, nesse caso uma relação entre dois homens. Quem sabe uma das intenções do diretor seja bater nessa tecla, em seus filmes, para acostumar os olhares das pessoas sobre esse assunto e suscitar discussões.
Rito de passagem
Assim como o filme Eu Não Quero Voltar Sozinho, o longa de ficção exibido em seguida, Desenrola, de Rosane Svartman, trata do universo adolescente, com uma história da jovem romântica Priscila, que aos 16 anos se vê bombardeada pelas inseguranças que toda jovem passa na vida, principalmente quando entra a questão da sexualidade, nesse caso, a hora perder a virgindade. A diretora Svartman trata do tema com desenvoltura e conduz muito bem o filme, resolvendo suas tramas e subtramas. A história pede uma fluidez que a diretora consegue tirar de letra.
Os jovens atores estão bem à vontade, em especial, a protagonista, a Olivia Torres, e o anti-galã, Lucas Salles, que faz todos torcerem pelo seu personagem, o Boca. Outro destaque do filme é a trilha sonora, com músicas da década de 1980. A banda Simply Red, que os pais da personagem de Olivia Torres ouviam quando começaram a namorar, tem um papel importante no desfecho do filme. O cantor Ritchie também está lá, com a música A Vida Tem Dessas Coisas, que poderia ser um bom título para o filme. Mas o longa é bem-intencionado e em nenhum momento quer ser um tratado sério sobre os temas que afetam e afloram na vida desses adolescentes. Outro grande mérito do filme é que consegue uma grande empatia com o público jovem.
Acontece hoje
Os filmes exibidos nesta segunda-feira (19) no Festival de Paulínia serão os curtas Um Lugar Comum, de Jonas Brandão, e 1:21, de Adriana Câmara, o documentário Uma Noite em 67, de Renato Terra e Ricardo Calil, já exibido na abertura do Festival É Tudo Verdade deste ano e o ficcional Dores & Amores, de Ricardo Pinto e Silva, sobre o qual falaremos na terça. Não comentei o longa (documentário) de ontem, As Cartas Psicografadas por Chico Xavier, de Cristiana Grumbach, que desperdiça um bom material, em voga no cinema nacional, que é a doutrina espírita. A diretora consegue tornar o que poderia ser emotivo em enfadonho. Uma pena.
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