O momento no Ministério da Cultura (MinC) é de balanço. Hora de olhar no retrovisor, fazer uma avaliação do que foi feito e transformar tudo em relatórios e prestações de contas. A sobrecarga é imensa, segundo o secretário executivo do MinC, Alfredo Manevy, mas ele acredita que o saldo é positivo.
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Às vésperas de uma rodada de reuniões com a equipe de transição formada pela presidente eleita, Dilma Rousseff, Manevy está com a agenda cheia, mas entre relatórios, reuniões e outros compromissos, conversou por quase uma hora com a reportagem do site da Brasileiros. Por telefone, o secretário, feito um goleiro, defendeu o trabalho realizado nos últimos oito anos e afirmou: “O fato é que avançamos”, diz. “O MinC foi refundado, e a cultura, enfim, ganhou status de direito básico.”
Acesso à cultura, segundo ele, foi o que norteou e esteve presente na essência de todos os projetos e ações. Um primeiro número que Manevy saca da manga é o do orçamento, que cresceu seis vezes. De R$ 300 milhões, em 2003, saltou para R$ 2,2 bilhões este ano – o dobro que a educação, por exemplo. Incentivos fiscais também avançaram, de R$ 200 para R$ 800 milhões. Salto considerável também.
Distribuir os recursos de maneira mais equilibrada foi outra meta perseguida pelo MinC. Para isso, criaram uma política de editais públicos. “Dinheiro era entregue sem critério, por isso estabelecemos regras claras, criamos comissões independentes”, afirma o secretário. Segundo o MinC, foram mais de 280 editais.
Nessa mesma direção, foi criado um programa de apoio a pequenos grupos culturais de periferias e regiões de baixo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). Hoje, são atendidos 4.500 projetos em todo o País. Além de recursos financeiros para a produção e circulação, iniciativas também recebem capacitação tecnológica.
As mais diferentes áreas foram contempladas, como teatro, música independente, produção audiovisual, povos indígenas, ciganos, entre outros. “Permeiam as ações um cuidado, um zelo com a diversidade cultural, que até então não existia”, argumenta o secretário.
Apesar de destacar avanços, Manevy reconhece que não faltaram pedradas. “Faz parte do debate”, diz. Na maior parte, cacetadas vieram quando assuntos eram postos na pauta. Caso das mudanças propostas na Lei Rouanet, colocada em consulta pública e que resultou no Pró-Cultura, em tramite no Congresso a todo vapor. Ainda assim, Alfredo Manevy mantém o otimismo numérico: “99% do setor é favorável às mudanças.”
A expectativa é de que seja aprovado ainda em 2010. E com isso, quem sabe mudar cenário desértico da cultura no Brasil, sobretudo fora do eixo Rio-São Paulo. De acordo com levantamentos recentes, somente 13% dos brasileiros vão ao cinema, 6% vão a museus e galerias de arte, isso para ficar em apenas dois exemplos. “É um apartheid entre quem pode e quem não pode consumir cultura”, arremata Manevy.
“Não há mecenato no País”
Um estudo foi realizado antes de dar início ao processo de debates sobre as mudanças na Lei Rouanet, principal fonte de incentivo ao setor cultural. Confirmou-se o óbvio: volume de recursos não chegava a quem mais precisava. Mais uma vez, Manevy recorre aos números para destacar distorções no fomento à cultura. “Apenas 3% de proponentes, de duas cidades, conseguiam de fato botar a mão no dinheiro para viabilizar seus projetos”. Lógico que essa porcentagem de projetos bem-sucedidos refere-se a Rio e São Paulo.
Só essa parcela ficou com 80% de tudo que foi patrocinado por meio do incentivo fiscal, a maior parte dele, 80%, é dinheiro público. “Logomarca de empresas em cartazes distorcem a realidade, não há mecenato no País”, explica o secretário.
Um dos principais pontos da mudança em trâmite proposta pelo governo é o de fortalecer o Fundo Nacional de Cultura (FNC). “É uma espécie de SUS da Cultura”, compara. Trata-se, na prática, de um fundo público de investimento direto, que passa a ser o principal mecanismo. Segundo Manevy, recursos do FNC serão sempre superiores ao da renúncia fiscal.
Outro estímulo pretende criar novos consumidores de produtos culturais. É o Vale Cultura, também previsto para este ano. Com um valor de R$ 50, o beneficio poderá ser utilizado em uma rede conveniada de diferentes segmentos.
Os impactos do digital e suas interfaces culturais também ganharam espaço de destaque na agenda do MinC. Áreas e temas polêmicos estiveram no centro de intensos debates. Uma série extensa de encontros percorreu o País para discutir com a sociedade mudanças na lei de direitos autorais.
Os desdobramentos desse processo geraram uma proposta de mudança que esteve em consulta pública e que deve ser encaminhada ainda em 2010 ao Congresso. Internet e digital, segundo informou o secretário do MinC, ganharam um artigo especifico. “É preciso atualizar legislação em função de novas tecnologias”, diz.
Por um lado a cibercultura foi acolhida no MinC e cresce forte e saudável. O Fórum da Cultura Digital, realizado em novembro em São Paulo, deu uma amostra da força dessa nova tribo. Entretanto, em outras esferas políticas, a liberdade na internet está na mira de um projeto de lei que pretende criminalizar a internet.
Apesar da autoria do PL 84/99 ser do deputado Luiz Piauhylino, o projeto ganhou o nome de Lei Azeredo – graças ao empenho dispensado pelo deputado eleito, Eduardo Azeredo, no sentido de fazer avançar a proposta.
Indiferente ao barulho que gerou no ano passado, o PL 84/89 já foi aprovado na Câmara, remetido ao Senado, onde Azeredo, então senador e relator da matéria deu sua contribuição, fazendo o projeto voltar a Câmara onde segue em regime de urgência.
A proposta atropela outro debate, no âmbito do Ministério da Justiça, sobre a criação de um marco civil para a internet. Manevy ressalta que o PL trata do mesmo assunto, mas vai pelo caminho errado. “A Lei Azeredo quer penalizar usuário e reduzir liberdades, enquanto o marco civil cria uma grande carta de princípios, estabelecendo primeiro os direitos de internautas”.
A matéria estava na pauta para ser votada essa semana, mas foi retirada, segundo informou a assessoria do MinC. A orientação do governo é não votar devido à falta de consenso em torno da questão. No último Fisl (Festival Internacional do Software livre), o governo Lula garantiu: “Se for preciso, eu veto”.
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