Chegamos ao número 80 da Brasileiros e desde o número zero – que saiu da gráfica em maio de 2007 – cultivamos algumas manias por aqui. Defendemos, por exemplo, olhar o Brasil com menos mau humor, preferimos torcer a favor do que contra, e isso apesar de tudo. Também nos propomos a contar histórias com honestidade, hoje olhando em volta dá para dizer que isso é mania. Teimamos em respeitar as diferenças, defendemos a alteridade, buscamos fugir de preconceitos e escapar da tradicional arrogância da profissão. Procuramos também, desde o início, agregar conhecimento. Apesar de o verbo “agregar” ter sido ridicularizado, buscamos incluir aqui na revista e dividir com nosso leitor a curiosidade e o prazer em absorver o conhecimento que garimpamos. A História, sabe-se, é grande instrumento de navegação. Ela explica o presente e ajuda a encontrar caminhos para o futuro. Conhecê-la, é fundamental para atravessar a vida com o mínimo de percalços, mesmo que esse mínimo seja cada vez mais abundante.
Esta nossa edição de número 80 abriga um especial com 29 páginas sobre os 50 anos do golpe militar. Coordenado pela nossa repórter especial Luiza Villaméa, ele traz uma boa e simbólica amostra dos personagens desse evento da História do Brasil. Há um guerrilheiro, Joaquim Câmara Ferreira, dirigente e fundador da ALN, a Aliança Libertadora Nacional, companheiro de Carlos Marighella, descrito e escrito por seu neto, um consistente e respeitado filósofo que hoje mora no Canadá e dá aula em Oxford. Do outro lado, há também um delegado, Carlos Alberto Augusto, o Carteira Preta, companheiro de trabalho de outro delegado, o sanguinário e torturador Sérgio Paranhos Fleury, de triste memória. Carteira Preta, envergando um smoking, conversou com Luiza no salão de beleza em que é chamado de Carteirinha. Há também o relato de Eduardo Hollanda, nosso editor especial em Brasília, sobre como foi iniciar seu curso na Escola Naval da Marinha, no Rio de Janeiro, nos dias que antecederam o golpe. Marcos Napolitano, professor de História na USP e autor do recém-lançado 1964 – História do Regime Militar Brasileiro, descreve, especialmente para esta edição, sua visão sobre o significado do golpe para o Brasil de hoje. Ainda, Luiza Villaméa usou preciosos documentos que compõem seu arquivo e conversou com a filha do Capitão Sérgio Carvalho para contar como esse militar evitou um banho de sangue.
Se essa data é importante pelo didatismo da história, nada há nela a se comemorar. No ano que vem sim, 2015, data redonda que jornalistas gostam, é o aniversário de 30 anos do fim da ditadura militar. A faixa pendurada aqui nas grades da Faculdade de Medicina da USP, na Avenida Dr. Arnaldo, em São Paulo, estampa a principal palavra de ordem do movimento estudantil no ano em que os estudantes voltaram às ruas. Foi 1977, o ano em que a ditadura começou a perder seu vigor. O ano em que a PUC foi invadida e depredada pelas forças policiais comandadas pelo coronel Erasmo Dias. O ano em que o general Geisel brigou com seu ministro da Guerra, Sylvio Frota e o demitiu. O ano em que os metalúrgicos de São Paulo e São Bernardo também começaram a se manifestar. Tudo isso levou ao desfecho anunciado. Em 1985, João Figueiredo, o último general da ditadura, saiu do Palácio do Planalto pela porta dos fundos.
E neste Mês da Mulher, na capa, uma tremenda mulher, a jornalista Barbara Gancia. Ela fala de sexualidade, de política, da burrice da turma da casa grande, da resistência do povo da senzala, tudo com muita contundência e sem perder o humor ácido, delicioso e impagável.
Bom proveito.
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