Alex Flemming e Flavio Gomes

– Um balanço de 2009. O site da Brasileiros ouviu personalidades do País para avaliarem o melhor e o pior do ano. Quais os fatos positivos e negativos nas mais diversas áreas, como esporte, política, economia, cultura, artes, entre outras. Confira o que falaram esses ilustres brasileiros.

Alex Flemming: “Bastardos Inglórias e Minha Fama de Mau

“O pior de 2009 foi Bastardos Inglórios e o melhor, a biografia de Erasmo Carlos, Minha Fama de Mau”

Alex Flemming é artista plástico brasileiro com obras nos mais importantes museus do mundo. Expõe atualmente na Pinacoteca de São Paulo a instalação Sistema Uniplanetário – in memorian Galileu Galilei


Flavio Gomes: “2009 se vai sem deixar saudades. Como todos os outros anos”

Não vi os filmes que queria, não li os livros que pretendia, não fui às peças de teatro que desejava, perdi muita coisa na TV, deixei de ver amigos e parentes, balanço de fim de ano é uma grande merda. A gente olha para trás e vê tudo o que não fez. Como se tudo que não fizemos fosse mais importante do que aquilo que fizemos.

E em geral é, mesmo.

2009 se vai sem deixar saudades. Como todos os outros anos. Para lá na frente olharmos de novo pelo retrovisor e sentirmos saudades deste e de todos os outros anos. Filosofar sobre um ano que acabou é outra grande merda.

O que de bom ou especial aconteceu em 2009? O mundo se afundou numa dessas crises econômicas que ninguém entende direito. Houve terremotos, enchentes, acidentes aéreos, guerras, assassinatos, golpes de Estado, nada que outros anos não nos tenham oferecido, também, com sua dose paquidérmica de crueldade – que só nos faz pensar que este planeta não é exatamente o melhor de todos para se viver.

Mas é o que temos. Onze anos atrás, quando meu primeiro filho nasceu, escrevi uma crônica que, um dia, espero que leia. Talvez já tenha até lido, mas não ficou muito impressionado. “Bem-vindo a este mundo. Não é grande coisa, mas é o melhor que pudemos fazer”, assim terminava o texto.

Um olhar otimista, sem dúvida. Se isso é o melhor que pudemos fazer, somos uns fracassados. Nossas vidas são feitas de pequenas alegrias, instantâneas e fugazes, e dores intermináveis. Tristeza não tem fim, felicidade sim. A história da humanidade pode ser resumida nessa frase. Ninguém precisaria escrever mais nada.

Me pedem para “destacar fatos marcantes”. OK, isso é fácil. O primeiro negro a assumir a presidência dos EUA. A morte do astro pop. Rio 2016. Recordes do homem mais rápido do mundo. Recordes do nadador brasileiro mais rápido do mundo. O piloto de sobrenome famoso que bateu o carro de propósito. O jogador de golfe que escancarou seus dramas pessoais. A luz que acabou. Os atores, locutores, atrizes, antropólogos, cientistas, atletas que morreram. É fácil fazer uma lista, também. Basta ir ao Google, este novo Grande Irmão, que tudo vê, tudo sabe.

2009 foi um ano assim. Tudo vimos, tudo soubemos. Por isso foi tão ruim. Seria tudo tão melhor e mais fácil se nada víssemos, se nada soubéssemos.

Mas estamos conectados 24 horas por dia, não? É um caminho sem volta. Mesmo quando não queremos saber de nada, alguém vem e nos conta. Alguém fotografou. Alguém filmou com o celular e colocou no YouTube. Vivemos numa era em que todos contam tudo a todo mundo o tempo inteiro. Vive-se a vida dos outros. Eu queria que o Lombardi não morresse, por exemplo. Ou: não precisava saber que o Lombardi morreu. Fazia tempo que não ouvia o Lombardi ler os números da Telesena, provavelmente nunca mais ouviria, estava bom assim, eu queria morrer achando que o Lombardi ainda lê os números da Telesena. Seria reconfortante.

Eu queria morrer vendo Kung Fu no videocassete e ser capaz de afirmar que esse cara é um grande artista. Queria morrer vendo episódios antigos de As Panteras, para achar que aquela lá está cada vez mais linda. Queria morrer viajando num Gurgel para dizer que o cara que criou esse carrinho é um gênio. Queria morrer escutando Guantanamera para garantir a quem quisesse me ouvir que essa mulher canta essa música como nenhuma outra.

Queria morrer dizendo os verbos no presente, mas a cada ano que passa, eles vão para o passado. E eu vou ficando, cada vez mais só num mundo que não é legal, não. A cascata que escrevi para meu filho era só isso, uma cascata para enganar uma criança que ainda não sabia ler.

Flavio Gomes é jornalista, dublê de piloto e escritor. Atua em jornais, revistas, rádio, TV e internet


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