Anunciada a morte do Jornal do Brasil

Só falta marcar a data da morte, aos 119 anos, do melhor jornal em que já trabalhei na vida, um símbolo da imprensa brasileira do século passado.

Ainda esta semana, Nelson Tanure, o atual dono da marca, vai anunciar o dia em que deixará de circular o Jornal do Brasil, um dos mais antigos, revolucionários e respeitados veículos já publicados no país. Fosse uma pessoa, era o caso de dizer como antigamente: trata-se de uma perda irreparável. Para lembrar dele, restará apenas uma versão eletrônica.

O necrológio já havia sido muito bem escrito pelo colega Carlos Brickmann, semana passada, em sua coluna no Observatório da Imprensa. Agora, quem anunciou oficialmente o desenlace, em sua edição desta terça-feira, por ironia do destino, foi justamente O Globo, outrora principal concorrente e algoz do Jornal do Brasil.

Trabalhei por três temporadas no JB, primeiro como seu correspondente na Europa, na década de 1970, e depois na sucursal paulista, nos anos 80/90.

Para se ter uma ideia da força e do prestígio deste jornal, quando fui contratado pela grande jornalista Dorrit Harazim para ser seu correspondente na então Alemanha Ocidental, ela me alertou para a responsabilidade: “Você vai ter que se comportar como se fosse um embaixador do JB na Europa”.

No elegante restaurante da diretoria, onde fui convidado a almoçar para ser apresentado aos meus novos chefes, os homens estavam todos de terno e havia tantos copos e talheres à minha frente que não sabia nem por onde começar – ainda mais, depois da advertência da Dorrit, a chefe dos correspondentes internacionais do jornal.

De roupa esporte, me senti um verdadeiro caipira sentado à mesa da rainha da Inglaterra. Meses depois, participaria com Dorrit de uma reunião dos correspondentes do JB na Europa, um timaço com mais de dez jornalistas na época, convocada para acontecer num grande hotel de Paris – vejam que chique

O JB deste tempo ainda reunia a seleção brasileira da imprensa. Não havia limite de despesas para se fazer uma boa reportagem. O grande sonho de todo jornalista era trabalhar lá um dia. Tinha vários craques em cada editoria. Ouso afirmar que nunca mais se montou uma redação daquela qualidade em jornal algum.

Não vou me meter a elencar os nomes, como fez o robusto Carlinhos em sua coluna, “O circo da notícia”, porque eram tantas as estrelas que não vou me lembrar de todos os mestres com quem convivi. Basta apenas lembrar, por exemplo, que fui colega de Walter Fontoura, Elio Gaspari, Ancelmo Góis, Zuenir Ventura, Ricardo Setti, Célia Chaim, Renato Machado, Augusto Nunes e Evandro Teixeira, entre tantos outros cobras do jornalismo.

O que mais me fascinava no Jornal do Brasil era o ameno ambiente de trabalho e a absoluta independência editorial. Para se ter uma ideia, a dona era uma condessa, a condessa Pereira Carneiro, e o diretor, um lorde, o seu genro Nascimento Brito.

Nunca os vi de perto e jamais recebi uma “ordem da diretoria” para fazer ou deixar de fazer determinada matéria. Mais tarde, as coisas mudariam, e o jornal entraria numa crise financeira e editorial que o levaria à decadência, até ser arrendado para o empresário Nelson Tanure, em 2001. Começava ali a sua agonia. Em 2009, Tanure levou à morte de outro grande jornal, a Gazeta Mercantil.

Teria mil histórias a contar sobre o meu trabalho no JB, que não cabem num blog, mas podem ser encontradas no meu livro de memórias “Do Golpe ao Planalto – Uma vida de repórter”, da Companhia das Letras.

Ao ver a notícia do falecimento esta manhã, fiquei muito triste. Foi como se estivessem apagando da paisagem e levando embora para sempre o lugar onde passei a melhor fase da minha já longa vida profissional.

Restavam lá trabalhando apenas 60 jornalistas, a circulação vinha minguando abaixo dos 20 mil exemplares, o jornal já tinha encolhido de tamanho e o passivo chegava a 100 milhões de reais. Alguns dos seus antigos craques hoje ainda podem ser encontrados nas páginas de O Globo. A imprensa brasileira deveria decretar três dias de luto.

Em tempo 1: alguns leitores me cobraram por não ter publicado um post sobre a decisão da Copa em que a competente Espanha levantou o caneco diante da irreconhecível Holanda, que mais parecia um time de fazenda dando pernadas e pontapés a três por quatro. Nada escrevi porque nada tinha a acrescentar aos comentários dos meus colegas do iG. A Espanha jogou melhor e mereceu o título, só isso. Foi o que disse hoje de manhã em entrevista ao meu amigo Sergio Canova, que apresenta o programa “Bola na Trave”, que pode ser visto no www.nauweb.tv, a partir das 9 horas desta quarta-feira.

Em tempo 2: uma bela notícia desta terça-feira foi a chegada à Espanha dos primeiros sete dissidentes cubanos libertados, de um total de 52 presos de consciência que o governo dos Castro prometeu soltar até o final do ano. A notícia sobre as negociações entre o governo e a igreja católica de Cuba para a libertação destes presos foi antecipada pelo Balaio no último dia 16 de junho.

Em tempo 3: mais uma vez, peço encarecidamente aos queridos leitores que não escrevam seus comentários só com letras maiúsculas. Isso prejudica a leitura e aborrece os demais leitores. Ninguém precisa gritar para ser ouvido. Não somos surdos. Vou começar a deletar os comentários de leitores que não atenderem a este apelo. Também peço que se evite o interminável bate-boca entre alguns internautas sobre as suas preferências partidárias, qualquer que seja o tema do post. Chega uma hora que fica chato. E ninguém vai convencer ninguém a mudar de candidato a esta altura do Fla-Flu da eleição.

Em tempo 4: meu colega Guilherme Barros, que entrevistou Nelson Tanure, informa no iG que o enterro do Jornal do Brasil impresso já tem data marcada: 1º de setembro. Na verdade, o velho JB já morreu faz tempo. Só faltava mesmo enterrar.


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