Arte contemporânea na América Latina

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Os participantes do terceiro painel

Com a presença de quatro nomes de destaque da crítica internacional, o terceiro painel do seminário “Arte Contemporânea no Século XXI”, realizado nesta quinta-feira (4) no Auditório Ibirapuera, teve como foco a arte contemporânea na América Latina. Andrea Giunta, Augustin Pérez Rubio, José Roca e Julieta Gonzáles falaram tanto sobre a produção artística quanto sobre instituições e estruturas, em mesa que teve mediação de Leonor Amarante. “A produção latino-americana demorou para ser reconhecida internacionalmente. (…) Só nos últimos 20 anos tivemos um número razoável de artistas inseridos em exposições internacionais importantes, nos circuitos das galerias, nas feiras internacionais e nas revistas especializadas”, disse a editora da ARTE!Brasileiros na abertura do debate.

A primeira apresentação foi da historiadora Andrea Giunta, pesquisadora da Universidad de Buenos Aires e da University of Texas, que fez um histórico das últimas Bienais de São Paulo para exemplificar a complexidade das relações entre instituições, patrocinadores e a produção artística. Segundo ela, acontecimentos como a “invasão” da chamada “Bienal do Vazio” por pichadores ou o recente protesto de artistas contra o patrocínio de Israel, na 31ª Bienal, mostram que essas relações, por vezes contraditórias, devem ser mais pensadas e discutidas no campo da arte contemporânea.

A historiadora citou também o caso de uma exposição retrospectiva do artista argentino León Ferrari (1920-2013), em 2004 – da qual foi curadora –, quando o então arcebispo Jorge Bergoglio se manifestou contra a mostra e uma série de empresas retiraram os patrocínios. “É impossível separar a arte de contemporânea dos assuntos contemporâneas”, afirmou Giunta. E, segundo ela, por mais que os conflitos tenham sempre a ver com contextos específicos e não possam ser antecipados, curadores, historiadores e artistas devem refletir sobre as implicações de apoios e patrocínios nos dias de hoje.

O segundo a falar foi o colombiano José Roca, curador adjunto da Tate Modern de Londres e diretor do FLORA ars+natura, que traçou um panorama da produção artística colombiana nas últimas duas décadas. Segundo ele, a arte do país neste período se voltou fortemente para questões sociais e políticas, em diálogo estreito com o momento histórico de conflitos entre governo, guerrilhas e narcotraficantes. Além disso, a globalização aproximou os artistas colombianos da produção do resto do mundo, o que teve implicações inclusive no conteúdo dos trabalhos. “Nos anos 90 surge a real possibilidade dos artistas acharem seu espaço na cena internacional”, disse.

Roca afirmou também que, apesar de ver aspectos comuns na arte latino-americana como um todo, “já que temos todos um passado colonial” e que “a internet tendeu a eliminar peculiaridades locais”, é possível notar diferenças entre as produções dos países. Neste sentido, o curador disse que quando esteve no Brasil anos atrás, se deparou, de modo geral, com uma arte menos política do que a colombiana. “Vi que muitos artistas estavam olhando mais para um dialogo com a arte concreta e neoconcreta, por exemplo.”

A terceira palestrante, Julieta Gonzáles, curadora do Bronx Museum e do Museo Rufino Tamayo, dedicou sua fala menos a casos específicos e mais a uma compreensão da arte contemporânea na América Latina de modo geral. Segundo ela, é necessário olhar a história da modernidade na região – e sua coexistência com o subdesenvolvimento – para compreender a produção artística atual. “A construção do contemporâneo na América Latina passa por dois momentos: nossa entrada na modernidade; e uma saída rápida, por volta dos anos 60. Ou seja, o reconhecimento de que o moderno talvez não fosse o ideal para nós.” Nesse sentido, a curadora deu exemplos de diversos artistas que trabalham, nos dias de hoje, com uma revisão critica dessa modernidade, como Gabriel Serra, Pablo Accinelli e Tamar Guimarães, entre outros. “Há uma recuperação dessa ideia da modernidade por artistas jovens, que nem viveram ela.”

O último a falar foi o espanhol Augustín Peréz Rubio, que assumiu há poucas semanas a direção do MALBA (Museo de Arte Latinoamericano de Buenos Aires). Rubio falou sobre a necessidade de se criar uma estrutura mais consistente para as artes nos países da América Latina, tendo cuidado com as questões políticas e éticas envolvidas. Segundo ele, é preciso pensar como se constroem as relações entre museus, galerias, artistas, colecionadores etc. “Público e privado tem que compor, mas com cuidado. Deve-se pensar de onde vem o dinheiro, como se reparte, quem está por trás… Não podemos querer falar de ser éticos e tal, com dinheiros que não sabemos de onde vem.”

O espanhol ressaltou também a necessidade de se criar políticas que incentivem colecionadores a expor e doar obras, e não a deixar inacessíveis trabalhos de importância pública. “Além disso, tem muita gente daqui doando ao MoMA, ao Reina Sofia, e não a museus do Brasil, Argentina, México. Falta uma responsabilidade política que vai desde os políticos que fazem legislações até o colecionador”, disse ele. Nesse sentido, Rubio falou sobre a carência de recursos não só nas grandes instituições, mas também nos pequenos museus espalhados pelos variados cantos dos países latino-americanas. “Sempre falamos de Caracas, Bogota, Buenos Aires e São Paulo, mas há muitas ‘Américas Latinas’.”


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