Murilo Mendes (Juiz de Fora, 1901-Lisboa, 1975) dedicou-se à literatura por praticamente 50 anos, período em que conciliou notável e copiosa produção de textos com a atribulada vida que levou em diversos postos de trabalho, tanto na burocracia estatal, quanto na iniciativa privada; tanto na imprensa, quanto em missões culturais e, ao final da vida, na docência.
Em mais de uma oportunidade, afirmou que começou a escrever muito cedo. Tinha apenas 9 anos, quando a passagem do cometa Halley o teria supostamente “despertado para a poesia”. Filho de um modesto funcionário público, perdeu a mãe com 1 ano, mas logo foi consolado pelo amor da segunda esposa de seu pai, que o levou a riscar “do vocabulário a palavra madrasta”.
Ao fugir do Colégio interno Santa Rosa, em 1917, seguiu com o irmão para o Rio de Janeiro, em 1921, onde começou a trabalhar como arquivista na Diretoria do Patrimônio Nacional, mediante arranjo propiciado por seu irmão, àquela época, engenheiro. No ano anterior, Murilo Mendes dera início às suas atividades regulares em periódicos, principiando na redação do jornal A Tarde, ainda em Juiz de Fora.
Entre 1924 e 1929, o escritor conciliou o emprego de escriturário no Banco Mercantil do Rio de Janeiro com intensa leitura e novas colaborações à imprensa, como a Revista de Antropofagia, sob a coordenação de Oswald de Andrade, em São Paulo, e a Revista Verde.
Seu livro inaugural, Poemas (1925-1929), foi publicado pelo Editorial Dias Cardoso, em Juiz de Fora, no ano de 1930. A coletânea é encabeçada por uma divertida paródia que Murilo Mendes faz da conhecida Canção do Exílio, de Gonçalves Dias, em que o poeta mineiro sentencia: “Os filósofos são polacos vendendo a prestações”.
Dois anos depois, saem seus célebres e polêmicos poemas-piada, enfeixados em História do Brasil – uma compilação feita no Rio de Janeiro pela Edição de Ariel, que marcou a incursão do Murilo Mendes em versos que esbanjam irreverência, escapando tanto ao lirismo quanto ao caráter mais reflexivo e introspectivo. É o que lemos no dístico Homo Brasiliensis: “O homem/É o único animal que joga no bicho”.
Além de escrever proficuamente, a década de 1930 seria marcada por diversas parcerias, especialmente com o seu amigo Ismael Nery, artista plástico cujas obras o escritor apresentara no Rio de Janeiro, durante uma exposição realizada em 1929. Cinco anos depois, a morte do pintor o levou a uma depressão profunda, que o teria reaproximado do fervor religioso. Nesse mesmo ano (1934), profundo conhecedor e adepto do Surrealismo, aproximou-se do grupo francês que organizava a revista Esprit.
Em 1935, dividiu o livro Tempo e Eternidade com Jorge de Lima e colaborou nas revistas Lanterna Verde e Dom Casmurro. No ano seguinte, saiu O Sinal de Deus, livro em prosa; e em 1937, A Poesia em Pânico, em que se percebem frequentes alusões à mitologia e à religião, o que inclui o hipotético diálogo com Deus, em A Esfinge: “Com um pé no limbo, o coração na estrela Vênus e a cabela na Igreja/Espero tua resposta desde o princípio do mundo”.
Murilo Mendes perdeu o pai em 1943, mesmo ano em que o escritor havia sido internado para tratar de tuberculose. Em 1947, ele se casou com Maria da Saudade Cortesão, filha do historiador e poeta português Jaime Cortesão, ocasião em que foi publicado Poesia Liberdade, pela Editora Agir, no Rio de Janeiro.
A exemplo da década precedente, os anos 1940 contaram com diversas publicações do escritor, com destaque para Janela do Caos – reunião contendo 11 poemas ilustrados com litografias de Francis Picabia (autor do famoso Manifesto Dadaísta), no ano de 1949.
Entre 1952 e 1956, ele realizou a primeira viagem à Europa, em missão cultural com destino a Bélgica e Holanda. Durante esse período, proferiu uma conferência na Universidade Sorbonne, Paris, em memória de seu amigo Jorge de Lima, falecido em 1953.
Tendo-lhe sido negado o visto para permanecer na Espanha, em 1956, onde seria professor de Literatura Brasileira, o escritor regressou ao Brasil. Voutou à Europa no ano seguinte, dessa vez com destino à Itália, para atuar como professor de Cultura Brasileira, na Universidade de Roma.
Durante o período em que viveu em Roma, diversas coletâneas vertidas para o italiano foram publicadas, tanto por editoras nacionais quanto italianas. Em 1972, Murilo Mendes retornou ao Brasil para receber o Prêmio Internacional da Poesia Etna-Taormina, oportunidade em que publicou Poliedro, pela Livraria José Olympio, no Rio de Janeiro. Três anos depois, faleceu em Lisboa, deixando grande quantidade de textos inéditos.
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