Até o algodão é chanel

Na noite de lançamento do livro Luxo & Crime, a autora Angela Klinke usou um carimbo antes de deixar a mensagem manuscrita em cada exemplar. “Dedicatória exclusiva, cara e feita à mão”, garantia a marca carimbada em tinta preta. A irreverência não podia ser mais coerente com o universo retratado no romance de estreia de Angela. Jornalista há mais de 20 anos, ela vinha há tempos colecionando informações sobre as tendências, negócios e bastidores do mercado do luxo no País. Planejava escrever um livro sobre o setor dominado por nomes como Hermès e Manolo Blahnik, que deve faturar cerca de R$ 20 bilhões no Brasil em 2012. Aos poucos, porém, a ficção falou mais alto.

Angela acertou ao deixar fluir os personagens. A trama começa antes mesmo do amanhecer, quando Brigite Campos de Orleans acorda no bairro do Morumbi, em São Paulo, com a mansão cercada por homens de preto. São 20 agentes da Polícia Federal, acompanhados por dois fiscais da Receita, dispostos a revirar cada cômodo de ponta-cabeça, atrás de documentos comprometedores. Um helicóptero não para de sobrevoar a mansão. Com um figurino preto e sapatilhas, Brigite é algemada e levada para o seu “momento xadrez”.

Junto com a irmã Catherine, Brigite é dona da megabutique Loja, frequentada pela elite “grifada” que desfila pelo romance. Assim como ocorreu em 2005 na vida real da empresária Eliana Tranchesi (1955-2012), antiga dona da Daslu, Brigite se vê às voltas com uma série de acusações, a começar pela de sonegação fiscal. Nada que Giorgio Armani não tenha enfrentado. Só que o estilista italiano tratou de acertar logo as contas com o fisco e se livrar da encrenca. Na ficção, Angela acrescenta um detalhe que faz toda a diferença: uma morte violenta.

O assassinato ocorre justamente quando a Loja promove uma festa para se reerguer. No templo do consumo está a blogueira Lula Peçanha, filha única de um milionário, que escreve dicas de consumo como se estivesse fazendo história. No blog Lulu Peçanha diz, ela só recomenda produtos de primeiríssima linha, devidamente experimentados. É o caso da caixa de algodão Chanel para demaquilagem, que comprou pela “pechincha” de US$ 20: “Três camaaadas. A do meio é de fibra elástica australiana. E as de fora de algodão egípcio. Fofo, delicado. Chanel é tudo. Queira!”. Com domínio total do universo e da linguagem dos consumidores do luxo, fina ironia e ritmo frenético, Angela constrói em Luxo & Crime um romance que prende a atenção do começo ao fim. De leitura leve e fluída, é diversão na certa, mesmo para aqueles que jamais usaram um spray de água termal


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