Atos de um velho safado

“Eu tinha 50 anos e há quatro não ia pra cama com nenhuma mulher.” A primeira frase de Henry Chinaski, alterego do escritor Charles Bukowski (1920-1994), dá o tom de Mulheres, apontado como um dos melhores romances do autor norte-americano. No Brasil, a obra em prosa mais conhecida do “velho safado” foi lançada pela Editora Brasiliense em 1984, com tradução do também escritor Reinaldo Moraes. Em 2011, Mulheres ganhou nova edição pela gaúcha L&PM.

Agora, a história do elogiado livro chega aos palcos paulistanos pelas mãos do dramaturgo Mário Bortolotto e da diretora Fernanda D’Umbra, fãs declarados de Bukowski, que nasceu na Alemanha, mas viveu a maior parte da vida nos Estados Unidos.  Além de adaptar o texto, Bortolotto fará ainda o papel do escritor na peça.

Interpretar um de seus ídolos na literatura não é uma novidade para o paranaense de Londrina, que em outra oportunidade escreveu e atuou na peça Kerouac, inspirada no escritor mais famoso da geração beat, Jack Kerouac. “É uma realização muito grande poder interpretar esses dois caras que mudaram a minha vida. Faço esses papéis com verdadeira devoção”, diz.

Cena – A atriz Maria Tuca, que faz parte do elenco de Mulheres, e Mário Bortolotto

Em Mulheres, Chinaski/Bukowski aproveita as glórias de ser finalmente reconhecido como escritor para se envolver em relacionamentos com diversas mulheres. Apesar de sua prosa cômica e repleta de passagens humoradas, o livro também reserva espaço para temas mais profundos, como o vislumbre da mortalidade e a relação amorosa de Chinaski com a personagem Lydia Vance, inspirada na escultora e poeta Linda King, uma das namoradas que exerceram maior influência na obra do escritor.  Na peça, a própria Fernanda D’Umbra assumirá a responsabilidade de interpretar a complexa personagem. “Ela é uma mulher ciumenta, muito possessiva, e eu não estou tendo medo de encarná-la, porque a mulher possessiva é chata muitas vezes. Ela é uma mulher apaixonante em vários momentos e chata em outros, como uma mulher intensa.” Outras atrizes interpretam outras mulheres do escritor.

Bortolotto e Fernanda devem levar aos palcos a intimidade adquirida ao longo dos anos para auxiliar na interpretação de um casal tão conturbado como o do livro. O dramaturgo e a diretora, que já foram casados, mantêm estreita relação de amizade dentro e fora dos palcos. “Temos uma afinidade em cena absurda e isso ajuda muito na hora de viver o papel desse casal na intimidade. Quem é próximo da gente sabe que minha relação com Mário também foi intensa”, conta Fernanda, que ensaia diariamente com o elenco para a estreia no dia 16 deste mês de janeiro.

Para Bortolotto, a experiência com esse espetáculo é desafiadora. “Fazer um personagem como esse é dar a cara pra bater, porque cada pessoa imagina a história de um jeito. Eu sei que muita gente vai gostar da minha leitura dessa peça, mas outros podem não gostar. De qualquer forma,  essa é a minha visão, a maneira que considerei para interpretar Bukowski. Posso até não agradar a todo mundo, mas …”


Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.