Foi mais uma crônica do embargo anunciado. No dia 31 de janeiro, a União Européia (UE) informou ao Brasil que, a partir do dia 1º de fevereiro, iria suspender as importações de carne do País. Desta vez, não era por causa de algum surto de febre aftosa (como já ocorreu há pouco tempo) ou outro tipo de doença do gado. Era pela inexistência da chamada rastreabilidade, termo inventado pelos tecnocratas que significa saber por onde o boi ou vaca andou nos últimos 90 dias antes de ir para o matadouro.

Segundo os europeus, a lista de mais de 2 mil fazendas enviada a Bruxelas (sede da UE) pelo governo brasileiro não atendia a essa rastreabilidade. Parece maluquice mas, para países que sabem a vida pregressa do gado desde o nascimento, essa exigência é uma defesa para garantir que o rebanho abatido não estava doente. Segundo especialistas ouvidos por Brasileiros, esse é na verdade o prazo mínimo para que doenças como a temida aftosa se manifestem no gado, dando a segurança necessária à qualidade das exportações.

O embargo, que coloca em risco nada menos que 40% das exportações brasileiras de carne (porcentual vendido aos europeus) – negócio mais do que milionário, que rendeu ao país nada menos que US$ 4,5 bilhões no ano passado -, provocou choro e ranger de dentes no país. “Esta é uma decisão injustificável e arbitrária”, reclamou o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes. A reação zangada do governo foi seguida no mesmo tom pelo setor privado. O ex-ministro da Agricultura Marcus Vinicius Pratini de Moraes, que hoje preside a poderosa Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne Bovina, considerou o embargo europeu “uma brutal agressão à pecuária brasileira”. Até o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi flagrado comentando com o governador de Mato Grosso do Sul, André Pucinelli, durante solenidade em Campo Grande, capital do estado, que os europeus “não têm autoridade moral” para impor esse tipo de sanção ao Brasil.

Mas, na verdade, tudo não passou de jogo de cena. A tal megalista que irritou os europeus e que contava com mais de 2.600 fazendas, elaborada pela Secretaria Nacional de Defesa Agropecuária, órgão do Ministério da Agricultura, foi, em comum acordo, reduzida para 600 fazendas. Os europeus ainda reduziram a lista para 300 propriedades rurais, das quais escolheram, por amostragem, 30 que já começaram a ser vistoriadas no final de fevereiro por uma equipe de veterinários e fiscais europeus. Mas, enquanto o trabalho dos técnicos não termina, os europeus já liberaram, no dia 28 de fevereiro, a importação de carne proveniente do gado de 106 fazendas, depois de checarem os dados que confirmaram a rastreabilidade dos rebanhos. A maior parte dessas fazendas, 87, fica em Minas Gerais, 11 no Rio Grande do Sul, quatro em Mato Grosso, duas em Goiás e duas no Espírito Santo. O número de fazendas deverá ser ampliado à medida que as inspeções dos veterinários forem sendo concluídas e confirmarem que os padrões exigidos estão sendo obedecidos. Ao Brasil, só resta mesmo fazer com que todo o setor da pecuária se enquadre. Afinal de contas, para manter os níveis de exportação de carne nos padrões de 2007, é preciso que 5 mil fazendas estejam fornecendo gado para abate. E, antes que se pense que o Brasil está sendo submisso aos ditames do Velho Mundo, deve ser lembrado o ditado: “O freguês sempre tem razão”. Quem pagou a fantástica quantia de US$ 1,8 bilhão pela carne brasileira mandada para a Europa no ano passado tem bilhões de boas razões.


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