Boxe: Baltazar nunca foi nocauteado

O presidente da Federação Paulista de Boxe, Newton Campos, garante que viu Erotildes Ferreira do Carmo, o Baltazar, como lutador, nos anos 1950. “Assisti a umas sete ou oito lutas dele pelo Cobraseixos, de Osasco, na Grande São Paulo, mas a vocação do Baltazar era ser treinador. Apesar disso, lembro que nunca foi nocauteado”, afirma. Mais do que isso, o velho treinador ficou conhecido por ajudar os outros a se levantarem.

Lutador e auxiliar de Baltazar no Clube Escola do Tatuapé (zona leste de São Paulo) desde 1988, Nei de Lima Andrade diz que o professor se orgulhava de jamais ter colocado um aluno para fora da academia simples, com equipamentos antigos. Até por isso, transformou meninos de rua em lutadores de boxe. “O Baltazar dizia que formava campeões não quando eles ganhavam títulos, mas quando conseguia afastá-los dos perigos das ruas”, afirma Nilson Garrido, seu discípulo desde 1970. Ele lembra que muitos alunos chegavam a dormir embaixo do ringue, pois não tinham teto. O próprio treinador morou por oito anos dentro do clube municipal.
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Simone Duarte, filha de Baltazar, afirma que, além de criar os 52 filhos (entre naturais e adotivos), ele ainda levava seus atletas que precisavam de um teto para dentro de casa. Campeã sul-americana de boxe, ela se prepara para disputar o título mundial no ano que vem.

Garrido tinha apenas 10 anos quando começou a treinar com Baltazar, em uma academia sem água encanada e iluminada por velas onde hoje é a estação Itaquera do metrô, na zona leste. “Ele trabalhava fazendo calçamentos de ruas e depois ia lá dar aulas de graça para nós. Como material de boxe sempre foi caro, usávamos troncos como sacos de pancada e enrolávamos as mãos com panos, pois não havia dinheiro para comprarmos luvas”, recorda-se. Com o mesmo sistema de porta aberta a todos e quase com a mesma precariedade, Garrido teve sua academia na zona leste e mantém hoje seu trabalho debaixo de dois viadutos na região central de São Paulo.

Há três anos, Garrido criou o torneio para iniciantes que leva o nome do treinador. Foi sua homenagem a quem lhe ensinou que não é preciso estar em boa situação para ajudar os outros.

Mesmo aposentado pela prefeitura, Baltazar insistia em ensinar boxe e permanecia na academia do clube escola. No último dia 23 de março, depois de 78 rounds, de um ano cada, o gongo final soou para Baltazar, que foi embora sem ser nocauteado.


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