À primeira vista, na espaçosa e sóbria sala da presidência da Petrobras, no 23o andar de seu edifício-sede, no Centro do Rio de Janeiro, a recém-empossada no 1 da estatal de petróleo, Maria das Graças Silva Foster, ou apenas Graça Foster, corresponde à imagem geralmente associada a grandes executivas. Ela veste um adequado terninho preto, usa pouca maquiagem e tem gestual comedido. Só não é a discrição em pessoa por conta de sua altura. De fato, uma mulher alta, imponente, penso, mas ainda sem abertura para perguntar quanto mede. Ao final da entrevista, ela sacia minha curiosidade: “Tenho 1,78 m e adoro um salto alto”.
Graça Foster, a primeira mulher no mundo a comandar uma empresa de petróleo desse porte, com investimentos de 75 bilhões de reais por ano no Brasil, definitivamente não se comporta como uma dama de ferro, com frieza e formalidade em excesso. Bastam apenas alguns minutos de conversa para perceber que essa mineira de Caratinga, carioca de vida toda, consegue manter sua mineirice na prosa bem contada (até mesmo quando fala sobre assuntos estritamente profissionais) e uma carioquice pontuada por momentos descontraídos e espontâneos, como quando comento sobre esculturas de santos do candomblé na prateleira de sala. “Sou católica, tenho aqui também o meu oratório, mas ganhei esses orixás de um pessoal das nossas fábricas da Bahia. O Gabrielli (o baiano José Sérgio Gabrielli, seu antecessor na presidência da Petrobras) disse: ‘Você vai botar a Iansã ali? Você já é braba pra caramba, ninguém vai te aguentar!’. Mas tem um orixá que é o do amor, da calma, da paz, então, é um mix de energias”, diz, aos risos.
Aos 58 anos de idade e 32 de Petrobras, a prata da casa que começou como estagiária, quando ainda cursava Engenharia Química na Universidade Federal Fluminense (UFF), e galgou todos os patamares hierárquicos na companhia, garante que jamais sonhara em chegar à presidência. “Não planejei isso. Sempre trabalhei muito, dei muita sorte de ter escolhido uma carreira de que gosto, a Engenharia. Na verdade, sempre precisei trabalhar, não era por esporte, mas sim por necessidade. E fui gostando cada vez mais. A Petrobras sempre me deu todas as possibilidades.”
Ela diz que se emocionou ao preparar o discurso, na véspera de sua posse, realizada no dia 13 de fevereiro. “Quando lia o que escrevia, chorava, lembrando de todos esses anos e de todos os meus colegas. Naquele momento, tive a absoluta clareza de que este posto era consequência deles também, do trabalho que fizemos juntos. Eu rodei essa empresa toda. Em todos os cargos que assumi, contei também com a competência do resto da equipe. Por isso me emociono, mas digo que me sinto muito segura e preparada para esta função.”
Antes de se tornar a presidente, Graça era diretora de Gás e Energia da Petrobras e exerceu a função de secretária de Petróleo, Gás Natural e Combustíveis Renováveis do Ministério de Minas e Energia, entre 2003 e 2005, quando a presidente Dilma Rousseff era a responsável pela pasta.
Sua trajetória profissional bem-sucedida é resultado de muita tenacidade e dedicação, qualidades que a acompanham antes de ter se tornado a adulta Graça Foster, que dorme apenas quatro horas por noite e diz não entender por que as pessoas precisam de mais horas de sono. Ainda menina, quando morava no Morro do Adeus, na zona suburbana do Rio, com os pais e a única irmã, Rita, em uma casa bastante humilde, ela já sentia o peso da responsabilidade futura. “Saímos de Minas quando eu tinha dois anos. Meu pai era vendedor, minha mãe, dona de casa, e também costurava para fora. Tínhamos uma vida muito simples, de muita batalha, mas com muito carinho e amor. Não nos faltava o alimento, mas era o sapato da prima, a roupa de não sei quem, as tias mandavam dinheiro…”
Graça lembra que ajudava vizinhos portugueses não alfabetizados a se corresponder com parentes distantes. “Lia e escrevia cartas para eles e ganhava um dinheirinho. Usava para comprar coisinhas. Adorava comprar presentes para minha mãe e gostava muito de poder ter uma caneta mais bonitinha, de ter uma borracha nova, de poder comprar um livro.”
Ela também chegou a recolher material reciclável que acabava contribuindo na renda familiar. “Ficava no meio do mato, com outras crianças, catando lata, papel, que depois vendíamos como sucata. Eu tinha 8, 9 anos. Contando assim, pode parecer que eu era uma coitadinha, mas longe disso. Foi uma época excepcional da minha vida, muito feliz, a gente brincava muito. É claro que eu via a dificuldade, aquilo tudo me deixava muito preocupada, eu era uma garota pequena, mas já percebia que eu seria a única solução para os meus pais”.
Além de ter correspondido às próprias expectativas e às de seus pais, Graça observa agora que, mais do que ser um dos nomes mais influentes do País, ela tornou-se popular. “Tudo o que você faz é notícia, todas as posições que toma têm muito impacto. Tenho de me acostumar com outro tipo de visibilidade. Por exemplo, moro em Copacabana e não tenho carro há muito tempo. Então, pego táxi no ponto da minha rua. É só eu chegar que os taxistas falam uns para os outros: ‘A mulher do gás tá aí!’. É um barato, me divirto! Mas há vezes que fico um pouco constrangida, envergonhada talvez, não sei explicar.”
Ela conta que, certa vez, ao desembarcar no Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, vinda de Pernambuco, foi reconhecida por um grupo de moças dos serviços gerais e teve de posar para fotos com elas. E adorou.
Essa mulher de fibra e workaholic por natureza, que às 7h30 da manhã já está dando expediente na empresa, que só acaba às 21 horas, e ainda leva trabalho para casa, surpreende por ter mantido uma vida pessoal ao longo desses anos. Mãe da médica Flávia, de 35 anos, e de Colin, estudante de Jornalismo, de 24, e avó de Priscila, de 16, a presidente da Petrobras está em seu terceiro casamento, que já dura 26 anos, com o inglês Colin Van Foster, pai de seu caçula. “Ele é engenheiro mecânico e trabalha na área de telecomunicações. Mas atuou na área de petróleo e gás durante muitos anos, nos conhecemos na Petrobras.” E Graça ainda se desmancha com a companhia de seus gatinhos, Apollo e Thor, da raça maine coon, os famosos gatos gigantes. “Até pouco tempo atrás, eu tinha também o Amin, paixão da minha vida, morreu com 11 anos, foi muito triste. Ele morreu um pouco antes do Natal, eu tenho uma foto dele aqui (mostra o porta-retrato), mas nem posso olhar muito para ele que choro”, admite.
Se durante a semana “ela não existe” – como enfatiza – para as questões domésticas, aos finais de semana, ela se arrisca na cozinha. Sua especialidade são os pratos com frutos do mar. “Fico um pouco ansiosa se tenho algum trabalho para ler, pois gosto de preparar uma comida gostosa para eles”, diz a executiva, que ao menos três vezes por semana mantém a forma fazendo jogging de Copacabana a Ipanema.
O mar que vê adiante, ao longo de suas caminhadas pela orla, tem o peso de um dever para ela. Sem se autodenominar ambientalista, Graça afirma que, em sua gestão, a responsabilidade ambiental é absoluta. “Temos de atuar de forma técnica sempre, em um ritmo adequado, para continuarmos por 10, 50, 100 anos. As grandes estão aí há 100. A Petrobras é a mais jovenzinha das majors, tem 58. Nosso crescimento tem um ritmo, ele tem de ser planejado por conta, entre outras, das questões ambientais que exigem todo nosso investimento e tecnologia, todo investimento em análise de risco, toda a nossa atenção. Se tivermos de parar para diminuir o risco, paramos. Precisamos dessa segurança ambiental para que possamos evoluir mais um século na produção de derivados.”
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