Brasil terá de dobrar oferta de energia em 15 anos

O Brasil precisa dobrar sua oferta de energia para sustentar o crescimento econômico nos próximos 15 anos para fazer frente à perspectiva de crescimento econômico de 4% ao ano. A expectativa é a implantação de 81 mil megawatts/hora em projetos novos. Isso vai exigir investimentos de R$ 1,15 trilhão, equivalente a 2,3% do Produto Interno Bruto (PIB) em dez anos e 11% da formação bruta de capital fixo – a parcela da riqueza nacional destinada a investimentos. A afirmação foi feita por Altino Ventura Filho, secretário de Planejamento e Desenvolvimento do Ministério das Minas e Energia, na abertura do seminário Energia Brasil + 10. Reflexões sobre a Matriz Energética Nacional, organizado por Brasileiros.

Os investimentos vão promover uma profunda alteração da matriz energética nacional nos próximos anos, disse o secretário. O país tende a se afastar do consumo de combustíveis fósseis, embora a maior parte dos investimentos (72,5%) seja destinada à produção de petróleo e gás, em função da exploração do pré-sal. O petróleo deve recuar de 39% da matriz até 2022, enquanto a hidroeletricidade deve recuar de 70% para 47%. A energia éolica, hoje em menos de 3%, passará para 20%%, a o passo que a biomassa pode chegar a 22%.

De acordo com Ventura Filho, o fato de o Brasil ter uma matriz muito diferente da mundial decorre da crise do petróleo da década de 1970, que pegou o país em um momento de fragilidade econômica e com importação de 45% da energia consumida – hoje são apenas 12%. O secretário do Ministério de Minas e Energia disse ainda que o país deve migrar para uma maior participação da energia termelétrica depois que o país esgotar as possibilidades de construção de usinas hidrelétricas, dentro de aproximadamente 30 anos.

Para que isso ocorra é preciso melhorar o desempenho do setor, afirmou Luciano Losekann, professor Universidade Federal Fluminense. Segundo ele, as termelétricas “foram concebidas para serem complementares” à hidroeletricidade. Isso faz com que sejam pouco usadas, com custo elevado. Segundo ele, o momento mostra que essa situação não é mais favorável. Ele disse que o País teria de enfrentar a questão com investimentos em térmicas mais eficientes, que entrassem na política energética como auxiliares na preservação dos reservatórios das hidrelétricas. “É urgente construir uma situação que leve a um desenvolvimento termelétrico que vise preencher os reservatórios”, disse.

De acordo com Losekann, o papel que se espera das térmicas pode ser preenchido pela oferta de gás, embora o preço hoje seja desfavorável. Isso vai depender da produção da nacional, principalmente a partir do pré-sal, já que o País precisa reduzir suas importações de combustíveis.

O gás natural ganhou importância no Brasil nos últimos anos, porque os reservatórios tiveram problemas e foi preciso ligar as térmicas, disse Adriano Pires, sócio-fundador Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE). O uso não térmico do gás natural, considerado mais nobre, porque empregado na indústria como matéria prima e cogeração industrial. Pires defendeu uma melhor definição do papel da Petrobras na exploração e comercialização do gás.

O especialista defendeu também uma política de preços relativos que olhasse também para o gás. “O governo insiste em controlar preços de gasolina, diesel e gás de cozinha, enquanto o gás natural é o único que pratica preços internacionais”, disse. Ele acha que, como principal fonte de energia na transição para a economia de baixo carbono, o gás deveria ter tratamento especial.

Está na hora de discutir como fazer uma inserção maior das térmicas na matriz, em uma discussão livre de preconceitos, disse Joisa Dutra, coordenadora do Centro de Regulação e Infraestrutura Fundação Getulio Vargas (FGV). A questão que perturba os líderes do setor energético é preço, e isso precisa entrar na discussão também no Brasil. Ela defendeu a integração hidrelétrica com outros países da América Latina, desde que se tenha o arcabouço legal e o entendimento entre esses países.

Para Elbia Melo, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), a política energética requer ajustes para contemplar as novas fontes renováveis que estão surgindo, cada vez mais competitivas, como a eólica e no futuro próximo a solar. Segundo ela, a eólica tem potencial para geração de 360 mil megawatts/hora. A capacidade instalada do setor é de 4 gigawatts e deve fechar o ano em 7 gigawatts. Até 2018 a capacidade de geração deve chegar a 14 gigawatts.

István Gárdos, diretor de assuntos corporativos do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), disse que o operador não pode ter preconceitos em relação às fontes de energia, embora deva preferir as mais baratas, renováveis e limpas. Ele defendeu a complementariedade da matriz, com uso de diferentes fontes, porque as hidrelétricas vêm perdendo a capacidade de armazenamento devido à construção de usinas de fio d’água. Em 2001, a capacidade dos reservatórios era para seis meses de abastecimento, mesmo que a água não fosse repostas. Em 2020, pelo que está previsto, a capacidade é de apenas três meses.

O futuro da energia a base de biomassa está ficando comprometido com a falta de investimentos, porque o setor sofre com a falta de sinalização da política energética e com a falta de correção dos preços dos derivados de petróleo, afirmou Zilmar José de Souza, gerente de bioeletricidade da União Brasileira da Indústria da Cana de Açúcar (Unica). Ele destacou o papel do setor, que em 2013 chegou a 25% da geração elétrica e em agosto do ano passado bateu o recorde de geração, no período mais crítico da geração hidrelétrica, com 22% do consumo residencial brasileiro.

Zilmar defendeu uma política especial dedicada às fontes renováveis e a retomada do planejamento. O país processa hoje 650 milhões de toneladas de cana e deve chegar a 1 bilhão de toneladas em 2022. Para isso, seriam necessárias dez ou doze novas usinas. Apesar disso, não existe nenhuma usina planejada, devido à crise do setor.

Para Charles Lenzi, presidente da Associação Brasileira de Energia Limpa (Abragel), o país deixou de investir em pequenas centrais hidrelétricas (PCHs). Mesmo assim, desde o ano 2000 o segmento elevou em cinco vezes sua capacidade de produção e hoje representa 3,6% da matriz. Ele criticou o fato de essa modalidade de geração não estar no plano de desenvolvimento energético dos próximos anos. Segundo Lenzi, as PCHs têm hoje projetos aguardando licenciamento de cerca de 900 usinas PCHs capazes de geral 10 mil megawatts/hora nas regiões de maior demanda: Sudeste, Sul e Centro-Oeste. Isso, segundo ele, reduz o impacto sobre o custo de distribuição e ainda permite o uso dessa energia me horários de maior consumo, dando mais segurança ao sistema.

A energia solar deve passar nos próximos dez anos por um processo que foi vencido pela eólica nos últimos dez anos, disse Rodrigo Sauaia, diretor da Associação Brasileira de Energia Fotovoltáica (Abesolar). Segundo ele, o segmento tem a maior capacidade de geração elétrica, superior à soma de todas as demais. O problema para o desenvolvimento do setor é a falta de produto nacional porque a tributação sobre os insumos da indústria é excessiva e acaba sendo mais fácil importar.

Jerson Kelman, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e ex-diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), afirmou que a existência cada vez maior de fontes sazonais ou intermitentes na matriz brasileira é um grande desafio. O País está perdendo a oportunidade de melhorar sua matriz e regular a geração hidrelétrica e transformá-la no grande moderador do sistema ao produzir apenas hidrelétricas de fio d’água. “Estamos abrindo mão da grande vantagem brasileira, que é estocar água”, disse. Segundo ele, a sociedade brasileira não discute a questão a fundo.

Para Othon Silva, presidente da Eletronuclear, afirmou que há espaço para todas as formas de energia. A preocupação deve ser a garantia de fornecimento, segurança, menor preço médio e menor impacto ambiental. Sistema de distribuição poderia ser integrado em um grande anel. A capacidade hidrelétrica cresceu, mas a capacidade dos reservatórios tem se mantido desde a década de 1990. Ele defendeu a segurança e a viabilidade econômica da energia nuclear, que hoje é capaz de fornecer energia ao custo próximo a R$ 148 por megawatt/hora. “Nenhuma térmica tem esse custo”, disse. Segundo ele, a questão da segurança depende de escolha correta e da tecnologia, o que está bem contemplado no Brasil. “Se fizermos a nuclear da forma certa e nos lugares corretos, é um risco aceitável e produziremos energia de base para ajudar a manter os reservatórios de água abastecidos.”

Fernando Luiz Zancan, presidente da Associação Brasileira de Carvão Mineral (ABCM) também reclamou da ausência da carvão na matriz e nos planos para os próximos anos. O carvão é dinâmico e pode produzir energia, gasolina, gás, e matéria prima para indústria química, defendeu. Ele afirmou que a Alemanha, país com maior preocupação em termos de produção de energia limpa, reviu seus planos e está construindo 17 plantas de carvão até 2018. Segundo Zancan, o Brasil está gastando US$ 500 milhões a mais por mês por estar utilizando térmicas a gás e óleo em vez de térmicas a carvão.


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