Brasília mal adentrava sua maioridade, na década de 1980, e já se deparava com uma enorme responsabilidade: após anos de ditadura militar, assumir as rédeas da redemocratização política do País. Nessa época de mudança, a cidade cumpriu o seu papel de “mãe gentil” em relação à música. De seu ventre nasceram ícones como Paralamas do Sucesso, Legião Urbana e Plebe Rude, um dos núcleos-base que deflagraram o boom do rock nacional, cujos arquétipos sonoros derivavam do punk e do pós-punk britânico. Dessa fase, porém, fora álbuns antológicos e mil lembranças, pouco sobrou além da homogeneidade sonora que, certo dia, conectou uma geração inteira. Outra coisa que já não mais condiz com a realidade: o título (nem sempre tão verdadeiro) de “capital do rock brasileiro”.
Em 2008, a amplitude da música que cresce em Brasília é muito maior e sua semente tem outro nome: diversidade. O rock virou apenas uma fração do todo – esse, hoje, muito mais sortido e complexo que duas décadas atrás. Nessa nova safra musical destaca-se a banda Casa de Farinha. Ela é cria legítima dos novos tempos e do Planalto Central, ao dar voz, em suas pesquisas musicais sobre cultura popular brasileira, a um formidável personagem local: o candango. O candango é a representação do povo nordestino que há 48 anos botou Brasília de pé. As três vocalistas/percussionistas da banda, Andréa Siqueira, Débora Aquino e Marta Carvalho, com muito orgulho se definem como “candangas valorosas”.
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Global e local se combinam perfeitamente nas fusões da trupe, que também conta com a batida pesada dos percussionistas André Togni e Lupa: “No Carnaval do Recife deste ano estreamos novas composições, combinando na mesma base riffs eletrônicos e folclore argentino”, explica Marta. Sempre bebendo, frisa a cantora, na fonte da cultura popular do Brasil. A rica mistura cultural brasileira mais vocalizações, timbres, ritmos contemporâneos e a valorização da percussão como base instrumental fizeram com que a Casa de Farinha conquistasse o 3º Prêmio Tim na categoria Regional, em 2005. A premiação resultou na maior glória do grupo até agora: a gravação do DVD de estréia na Sala Villa-Lobos do Teatro Nacional.
Segundo o jornalista Fernando Rosa, proprietário do selo Senhor F Discos, Brasília apenas criou seus filhos, depois os despachou para o eixo Rio-São Paulo. “É lá onde tudo acontece até hoje. Somente agora Brasília começa a incrementar um caldeirão de influências e a cozinhar uma identidade sonora própria. A Casa de Farinha está em busca dessa identidade”. A cantora Marta Carvalho concorda: “Cultura não é imutável. A Casa de Farinha não está aí para achar um caminho, mas para mudá-lo, se preciso for”. Que assim seja, então.
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