Um estudo da revista científica PNAS (Proceedings of the National Academy of Sciences.) publicado nesta semana mostra que o abuso de remédios controlados para a dor (os opióides) podem ter efeitos indesejados para além da dependência. Em experimento em ratos, cientistas mostraram que esse tipo de analgésico faz parte do problema e piora a dor a longo prazo.
A pesquisa, realizada pelo professor-assistente Peter Grace e a professora Linda Watkins, da Universidade do Colorado (EUA), mostrou que apenas alguns dias de uso do morfina em cobaias levou a uma crise de dor crônica que se estendeu por meses.
Segundo a pesquisa, essas substâncias “desajustam” as células de defesa presentes na medula, que não param de emitir sinais de dor. “É como se esses compostos girassem o interruptor da medula espinhal”, disse Peter Grace, em nota da Universidade de Colorado.
Como foi feito o estudo
Pesquisadores fizeram uma lesão em um nervo periférico das cobaias. Esse machucado, então, emitiu sinais para células do sistema imune. Essas estruturas ativaram o sistema de defesa.
Depois, os cientistas trataram o ferimento com opióides. Ao examinar os ratos, porém, pesquisadores perceberam que esses compostos deixaram as células de defesa “desequilibradas”. O estado de alerta foi tão forte que uma cascata de ações desnecessárias se pões em curso, incluindo a inflamação da medula espinhal.
O sinal da lesão, combinado com o medicamento, fez com que células do sistema imune ficassem emitindo a interleucina-1 beta (IL-1B). Essa substância aumenta a atividade das células nervosas que reagem a dor no cérebro. O processo faz com que a dor perdure por vários meses: a célula do sistema imune emite sinal por meio da interleucina, o cérebro responde, o indivíduo sente dor… e por aí vai.
Em nota da Universidade de Colorado, Linda Watkins afirmou que “as implicações para as pessoas que fazem uso de morfina, oxicodona e metadona são grandes”. Watkins atesta que o estudo mostrou que, mesmo uma decisão de uso de curto período, pode levar a piora da dor.
O time de pesquisadores agora testa uma droga que pode prevenir esse “desequilíbrio” das células do sistema de defesa. A ideia é fazer com que as células do sistema imune deixem de responder a ação dos analgésicos depois de cessada a causa da dor.
O estudo foi financiado pela American Pain Society, pelo National Medical Research Council da Austrália, pela Fundação Nacional de Ciência Natural da China, pelo Instituto Nacional de Abuso de Drogas, pelo Instituto Nacional de Pesquisa Dental e Craniofacial e pelo Instituto Nacional de Abuso de Álcool e Alcoolismo.
O uso de analgésicos controlados derivados de opióides é um problema crônico nos Estados Unidos. Segundo o National Institue on Drug Abuse, 20.000 norte-americanos morreram em 2015 por overdose desse tipo de composto.
Sobre os opiáceos
O que são?
São medicamentos feitos a partir de substâncias derivadas do ópio (como a morfina e a codeína). Também há versões sintéticas, como a metadona, a meperidina, e propoxifeno.
Como atuam
Esses compostos têm um efeito analgésico (tiram a dor) e um efeito hipnótico (dão sono). Por esses dois efeitos, essas substâncias também são chamadas de narcóticas. De modo geral, elas diminuem a atividade do cérebro e, sob abuso, podem interferir em todas as atividades que garantem a sobrevivência: dos batimentos cardíacos à respiração.
Fontes:
Morphine paradoxically prolongs neuropathic pain in rats by amplifying spinal NLRP3 inflammasome activation. Disponível aqui.
Ópio, opiáceos/opióides, morfina. Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid Unifesp). Disponível aqui.
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