Como Meirelles foi parar no BC

Com o dólar, a inflação e o risco Brasil subindo assustadoramente no período entre a eleição e a posse de Lula, no final de 2002, tornava-se cada vez mais urgente, para acalmar os mercados, que o novo presidente indicasse logo o ministro da Fazenda e o presidente do Banco Central. Foi preciso dar logo nomes aos bois para provar que a Carta aos Brasileiros, lançada em meio à campanha, era para valer.

O problema é que ninguém queria aceitar o cargo de presidente do Banco Central de um governo do PT. Após alguns convites recusados, Lula chegou ao nome de Henrique Meirelles, ex-presidente mundial do Banco de Boston e recém-eleito deputado federal pelo PSDB de Goiás, por indicação de Aloizio Mercadante, seu antigo assessor econômico, que acabara de se eleger senador pelo PT de São Paulo.

Já naquele momento não era fácil para Meirelles tomar uma decisão, como acontece agora com o suspense em torno da sua permanência ou não no Banco Central: para aceitar o convite de Lula, ele teria que renunciar ao seu mandato de deputado federal. Como sabemos, o poder de convencimento de Lula funcionou naquela ocasião.

Meirelles e Mercadante se conheceram em 1995, após a derrotada campanha presidencial de Lula no ano anterior, durante a implantação do Projeto Travessia, um programa social para menores de rua do centro da cidade, criado por iniciativa do Sindicato dos Bancários de São Paulo, no qual eu também trabalhei.

Então presidente do Banco de Boston no Brasil, Meirelles aceitou logo de cara o convite que lhe foi feito pelo presidente do sindicato na época, o hoje deputado federal Ricardo Berzoini (PT-SP), e vestiu com gosto a camisa do Projeto Travessia, que existe até hoje, e é considerado um modelo no atendimento a menores carentes.

Participamos juntos de várias reuniões para viabilizar o projeto e surgiu daí a admiração mútua entre Meirelles e Mercadante. Nem o homem do Boston estava nos planos iniciais do presidente eleito, muito menos Meirelles poderia esperar este convite, tendo sido eleito pelo PSDB, o partido derrotado pelo PT em 2002.

Da mesma forma como ninguém esperava que o médico sanitarista Antonio Palocci, então prefeito de Ribeirão Preto, fosse convidado por Lula para assumir o Ministério da Fazenda, a indicação de Meirelles só surpreendeu quem ainda não conhecia os critérios do novo presidente para montar seu governo.

Lula tinha deixado claro para sua equipe, antes mesmo antes da eleição, que pretendia chamar para o governo os que considerava melhores em cada área, independentemente do partido a que pertenciam ou do candidato que tenham apoiado.

Foi assim que ele convidou o agrônomo Roberto Rodrigues, que havia se engajado na campanha presidencial do tucano José Serra, para o Ministério da Agricultura, ao descobrir que ele se encontrava hospedado no mesmo hotel em Araxá, onde Lula participava de uma reunião convocada por Aécio Neves com os governadores eleitos pelo PSDB.

Pelo mesmo motivo, convidou também outro apoiador de Serra, o empresário Luiz Furlan, então presidente da Sadia, para o Ministério do Desenvolvimento, encarregando-o de exercer o papel de grande mascate dos produtos brasileiros no exterior com a missão de abrir novos mercados.

No governo, Antonio Palocci (depois substituído por Guido Mantega) e Henrique Meirelles seriam os principais responsáveis, primeiro, pela estabilidade e, depois, pelo crescimento econômico registrado pelo país nos dois mandatos de Lula.

Por isso, a insistência do presidente Lula para que Meirelles permaneça à frente do Banco Central até o final do governo. Meirelles ainda não anunciou oficialmente o que pretende fazer da vida, mas tem tempo até esta quinta-feira para dizer se fica ou se sai do BC. Se depender do presidente Lula, que é muito grato a ele, e reconhece a sua importância para o bom momento econômico vivido pelo país, tenho certeza que Meirelles fica.


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