Corações desterrados

O escritor americano Dee Brown (1908-2002) descobriu a América. Entenda-se essa ação como um desnudamento. Um mapeamento histórico, e não geográfico. Há 40 anos, com seu livro Enterrem Meu Coração na Curva do Rio (Editora LPM) – no original: Bury My Heart at Wounded Knee, 89 páginas, da primeira edição em 1970 -, o autor colocou sob os olhos do mundo a verdadeira tragédia dos nativos americanos. Acredite, pouca gente sabia. Antes da obra, conheciam-se apenas duas imagens dos povos do continente: a de psicopatas ou a de índios de porta de charutaria.

Brown traçou o calvário de 19 tribos em capítulos separados. Mas se os personagens variam, suas histórias repetiam-se, como os movimentos de uma máquina eficiente. Roubo, traição, tortura, assassinato e mentiras são a matéria-prima para o modus operandi nas delimitações das fronteiras dos Estados Unidos. Ou, como de resto, de todo o novo mundo, incluindo o Brasil. O autor, porém, concentrou atenção principalmente no Oeste americano, em meados do século XIX. Mas não se restringiu àquelas longitudes. O próprio título original remonta a certa região do então território de Dakota, por onde passa o rio Wounded Knee. Pela primeira vez, imprimiu-se a verdade sobre um massacre lá ocorrido.
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Dezembro de 1890 trouxe um inverno particularmente gelado no território de Dakota do Sul. O Chefe Spotted Elk, também conhecido como Big Foot, enfrentava uma pneumonia que poderia matá-lo. A doença, porém, não teve a rapidez do Sétimo Regimento de Cavalaria dos Estados Unidos da América. Trezentos e sessenta e cinco cavaleiros – com duas peças de obus – sob o comando do coronel James Forsyth, chegaram à aldeia dos Miniconjou e Hunkpapa Sioux, no dia 28. A missão era a de realocação para o forte de Pine Ridge, de 340 homens, mulheres, crianças e velhos das tribos acampadas em uma curva do rio Wounded Knee. Na manhã de 29, foi feita uma reunião entre o comando militar e o conselho tribal. Tratariam dos detalhes daquela que era, na verdade, uma rendição.

Para a reunião, foi exigido que os nativos depusessem suas armas. Em meio às conversas, um guerreiro – que era surdo, segundo os sioux – disparou um tiro do rifle que manteve sob um cobertor. Foi um sinal para o início do massacre do povo de Big Foot. De uma população de 340 pessoas, sobraram quatro homens e 47 mulheres e crianças. Todos feridos. Esses sobreviventes foram levados para Pine Ridge e aprisionados em uma igreja sem aquecimento. Sobre o altar estava uma faixa onde se lia: “Paz na Terra aos homens de boa vontade”.

Antes do livro de Brown, a narrativa desse episódio estava confinada aos guetos para onde foram levadas as diversas nações indígenas.

“A história de Wounded Knee não é tão antiga para o povo Lakota de hoje em dia. Muitos tiveram avós que morreram ali. Minha avó e meu avô, por exemplo, viviam em Kyle – a curtíssima distância de Wounded Knee. Escaparam por pouco do massacre. Minha avó era adolescente quando o crime aconteceu e lembrava-se bem do dia 29 de dezembro de 1890”, diz Tim Glago, um Oglala Lakota, um dos fundadores e primeiro presidente da Associação de Jornalistas Nativo-Americanos.

Até a publicação da obra de Brown, a maioria do povo americano ignorava a história e acreditava nas invencionices de Hollywood. E, ironicamente, foi um dos filmes produzidos pela indústria do cinema o que provocou a curiosidade e carreira do escritor de Enterrem Meu Coração na Curva do Rio. Originária do Estado da Louisiana, a família Brown mudou-se para o Arkansas, quando o autor era menino. O condado de Ouchita, onde residiam, era antigo território da tribo Creek. Dee jogava beisebol em um time com vários meninos daquela etnia, e fez amizade especial com um deles, chamado Moses Yellowhorse. Em uma tarde de verão, os garotos foram assistir a um filme no qual os índios, como sempre, eram representados como sociopatas sanguinários. No fim de um tiroteio mais aguerrido, Yellowhorse virou-se para o amigo e disse: “Esses não são índios de verdade. Índios não queriam guerra”. Constatando a realidade de que seus amigos nativo-americanos eram as pessoas mais gentis que ele conhecera, Dee acreditou na afirmação. Passou o resto da vida estudando documentos esquecidos e colhendo histórias dos povos originais de sua terra.

“A documentação que revelava a verdade sobre as monstruosidades cometidas contra cada nação nativo-americana estava em arquivos púbicos espalhados pelo país. Brown primeiro colheu depoimentos de vários indígenas, passando para o papel as histórias transmitidas entre gerações de forma oral. Depois, foi confimar os fatos nos papéis do governo e ampliar detalhes das visões dos dois lados da questão”, diz Gerard Barrow, historiador e antropólogo da Universidade do Arizona. “Infelizmente, os historiadores do país não faziam seu trabalho com relação à cultura nativa. Foi preciso sair o livro de Brown para que se abrisse o campo de pesquisas nessa área.”

A obra foi às livrarias em momento especialíssimo. O país estava em guerra não declarada no Vietnã e as notícias que chegavam do sudeste asiático eram assustadoras. Os americanos ainda não haviam se recuperado do choque da chacina de My Lai, em 1968. O paralelo entre os massacres de civis vietnamitas e de nativo-americanos não passou despercebido. A oposição à participação dos Estados Unidos em um confronto nacionalista na Ásia havia adquirido características de fenômeno popular. A revolta provocou também reivindicações de maiores direitos civis para minorias da nação.

A exemplo do movimento negro, ganharam fôlego os grupos feministas, homossexuais e também de índios. “Nos anos 1970, o movimento nativo-americano explodiu no país. Foi muito popular entre os navajos, uma das oito tribos que encabeçaram as primeiras lutas por restituição econômica, a ser dada pelo Governo Federal, pelos danos causados aos nativos. Também participaram ativamente nas exigências de salários comparativos, entre trabalhadores brancos e índios”, diz Deswood Tome, 47, diretor executivo da Comissão de Regulamentação Navajo, ex-liaison entre o governo dos Estados Unidos e a Nação Navajo, além de um dos fundadores da Universal Communication Union, órgão da Organização das Nações Unidas, que reúne indígenas de todas as Américas, em um trabalho conjunto para melhoria de suas condições de vida.

“Eu tinha 17 anos quando li o livro. Entre os nativo-americanos de todo o país, houve concordância de que a obra de Brown relatava com muita precisão o sofrimento das nações. E a mesma obra serviu de instrumento didático sobre a história desses povos. Como já estávamos organizados em protestos, o livro teve sua importância aumentada”, diz Tome.

E não foram apenas os nativos da América do Norte que se beneficiaram com Enterrem Meu Coração na Curva do Rio. A obra foi traduzida em 17 idiomas. Por todas as Américas, indígenas leram suas páginas e aprenderam as histórias de outros nativos. Um exemplo disso é Marcos Terena, membro da nação Terena e amigo de Tome (leia seu relato para Brasileiros, abaixo).

“O que mais me impressiona no livro é que ele prova que as nações nativas protegeram a cultura de seus ancestrais. Ainda hoje, temos exemplos de vários aspectos das antigas culturas tribais que estão sendo mantidos. Muitas tribos ressurgiram por causa disso e estão prosperando”, diz Tome. Mas enquanto seu povo se apegava a conceitos estabelecidos em suas culturas, o restante do país, nos anos 1970, mergulhava em incertezas sobre seu próprio caráter.

Com a guerra do Vietnã, surgiu o inevitável questionamento geral de ideários fundamentais ao espírito da Nação. O primeiro deles é o conceito da chamada Excepcionalidade Americana. Trata-se da teoria – ainda hoje dogmática para vários círculos políticos – extraída de um discurso de um líder religioso. John Winthrop, pastor puritano e um dos primeiros colonos a chegar à Baía de Massachusetts, em um sermão de 1630, afimou que sua congregação fora escolhida especialmente por Deus para a criação de um novo mundo. Eram, portanto, o “povo de Deus na terra prometida”.

O filósofo francês Alexis de Tocqueville, depois de uma viagem de dois anos ao território americano, em 1831, elaborou uma radiografia político-social do país. Em seu livro Democracy in America (1835), ele cunhou a frase “Excepcionalidade Americana”, explicando como e por que aquela república, na época com 50 anos, teria papel especial na história da humanidade. Sua teoria não tinha nada a ver com a divina providência. Era um manifesto a favor da democracia em contraposição às monarquias europeias autoritárias e decadentes. Seu ideário liberal, porém, seria transformado em crença mística.

Dessa teoria surgiu também o conceito de Destino Manifesto, que justifica ações políticas ou de força nos campos doméstico e internacional. (A frase foi criada pelo jornalista nova-iorquino John L. O’Sullivan que pedia a anexação do Texas.) Estabeleceu-se a ideia de que os descendentes de europeus radicados nos Estados Unidos estavam destinados a se espalhar pelo continente norte-americano. O direito a essa conquista havia sido dado, por ninguém menos que o “Todo-Poderoso”. A ocupação de terras de nações nativas era legitimada desse modo. Ao longo dos anos, a mesma racionalização seria aplicada na política externa de Washington.

O presidente (1829-1837) Andrew Jackson (aquele da efígie na nota de US$ 20), combateu índios, como soldado, e lançou ofensiva grileira e genocida, com as justificativas do Destino Manifesto. E o último jacksoniano a ocupar a Casa Branca, o presidente (1845-1849) James Polk fez o mesmo com o México, em uma guerra que acabou com a anexação da Califórnia e Novo México pelos Estados Unidos.

“Os conceitos de Excepcionalidade Americana e Destino Manifesto são os motores da política do país, desde os tempos dos colonos pioneiros. Primeiro serviram de justificativa para a tomada de terras na Nova Inglaterra e eliminação de quem se opunha a isso. Depois, espalhou-se para o resto da América do Norte, extrapolou suas fronteiras e ganhou dimensões globalizadas”, diz o linguista, filósofo, e ativista político, Noam Chomsky, professor do Massachusetts Institute of Technology (MIT).

“Até Jackson, os tratados com os nativo-americanos propunham, de modo geral, que as tribos fossem realocadas para oeste do rio Mississipi. Imaginava-se que as fronteiras do país fossem parar ali. Mas com a chegada de mais 30 milhões de imigrantes europeus no século XIX, começou a faltar terra. A população branca foi buscar território para além do rio. O governo apoiou essa invasão e quebrou acordos com nativos, sem cerimônia. E, quando se descobriu ouro e prata no Novo México e na Califórnia, a corrida em busca de metais aconteceu como o rompimento total de uma represa que já vazava”, diz o professor Gerard Barrow.

O extermínio foi tão impressionante, que ganhou a admiração de ninguém menos que Adolf Hitler. O Fuhrer achava uma balela a história de Destino Manifesto e Excepcionalidade Americana, porque o país era muito miscigenado. Mas reconhecia com inveja a capacidade de execução de genocídio de grupos étnicos específicos. O ditador alemão calculava, assim como outros historiadores depois dele, que nada menos do que 100 milhões de índios americanos foram mortos, desde o período de colonização inglesa. O número pode ser exagerado, mas não se erra por muito. A Nação Semiole, da Flórida, por exemplo, foi totalmente eliminada, juntamente com os negros – escravos fugitivos – a quem abrigavam e protegiam.

Muitos daqueles que lutaram para manter seu modo de vida, não tive-ram trégua nem na morte. Pegue-se o exemplo do famoso líder guerreiro e pajé Gerônimo. Era um chiricahua apache, que combateu tanto mexicanos como americanos para preservar seu povo no território do Novo México. Fabuloso estrategista militar, ele deu enorme trabalho para as tropas dos Estados Unidos. Foi preciso que os cavaleiros, comandados pelo capitão Henry Lawton, cruzassem ilegalmente a fronteira do México e perseguissem os últimos comandados de Gerônimo, sem dar trégua nem durante a noite. Exaustos, os poucos nativos que restavam se renderam no dia 9 de setembro de 1866.

Ainda permanece o debate se Gerônimo se rendeu incondicionalmente. Ele morreu alegando que só se entregou na condição de “prisioneiro de guerra” e citava testemunhas que nunca o contestaram. O líder foi mandado para várias prisões em fortes americanos, em uma peregrinação que durou anos e terminou em Fort Sill, em Oklahoma. Na velhice, o velho chefe virou uma curiosidade de feiras livres. Em 1904, por exemplo, foi levado à Feira Mundial de St. Louis, onde vendeu fotos autografadas. Em 1905, foi obrigado a participar da parada das festividades da posse do presidente Theodore Roosevelt. Depois desses eventos, era sempre reconduzido à Fort Sill, onde tinha liberdade de movimen-tos, mas estava proibido de voltar à sua terra natal. Chegou a ditar sua autobiografia para um jornalista, que publicou o livro.

Em fevereiro de 1909, Gerônimo vol-tava para o forte depois de um passeio, quando caiu do cavalo. Foi obrigado a ficar toda a noite deitado no frio. Na manhã seguinte, um amigo o encontrou. O chefe apache morreria, dias depois, de pneumonia. Suas últimas palavras foram de arrependimento por ter se rendido. Seu corpo foi enterrado no cemitério de prisioneiros dos Estados Unidos, no Fort Sill.

Em 2009, no centenário da morte do guerreiro, seus familiares entraram com uma ação judicial em Corte Federal, exigindo que a Sociedade “Skull and Bones”, de estudantes da Universidade de Yale, devolvessem o crânio de Gerônimo, roubado em 1918, da tumba em Fort Sill. Segundo alegam, a caixa craniana é usada em rituais festivos de reuniões desse clube – da qual pertenceram vários presidentes e presidenciáveis, além de políticos de alto escalão. Entre os ladrões, todos membros da confraria estudantil, estava o futuro senador Prescott Bush – avô do ex-presidente George W. Bush. Teria sido ele quem cavou a sepultura para o saque.

“Acredito que o espírito de Gerônimo nunca teve descanso depois desse furto”, diz Harlyn Gerônimo, 61, bisneta do chefe apache. A “Skull and Bones” nega a acusação. Porém, Marc Wortman, um historiador da própria Yale, descobriu em 2005 uma carta escrita em 1918 por um dos membros da sociedade estudantil. No texto, revela que não apenas o crânio do guerreiro fora levado para a sede do clube, mas também os dois fêmures e um pedaço da sela do cavalo usado pelo índio.

O processo judicial ainda está correndo, mas a julgar pelo que conta Dee Brown em seu livro, a justiça do país nunca favoreceu os índios. Teria sido melhor se os apaches tivessem enterrado seu grande líder, na curva do rio Gila, no Novo México. Local, lembre-se, para onde Gerônimo nunca mais foi permitido retornar. Sua história, porém, está viva nas páginas do clássico Enterrem Meu Coração na Curva do Rio.

CABEÇA ABERTA

A leitura de Enterrem Meu Coração na Curva do Riocausou uma reviravolta na vida de Marcos Terena, considerado, hoje, a maior liderança indígena do País

por Eduardo Hollanda

Foto: 1. Arquivo pessoal – Detalhe. Eduardo Hollanda
1. Terena pilotando uma aeronave islandesa em 1983. Para ele, o livro revelou a realidade de seus antepassados
Final da década de 1970. Recém-formado piloto pela Academia da Força Aérea (AFA), o jovem indígena Marcos Terena, nascido no dia 15 de julho de 1957 em uma aldeia Terena no Pantanal mato-grossense, chegou a Brasília procurando emprego. Seu plano era somar mais horas de voo para candidatar-se a piloto em uma das três grandes empresas aéreas que dominavam o mercado brasileiro na época: Varig, Transbrasil e Vasp.

Brasília fervilhava. A ditadura militar, enfim, permitia que temas, como a abertura política e a anistia, fossem discutidos com alguma liberdade. Terena e outros jovens indígenas passaram a tomar conhecimento das discussões do momento. Circulavam pela Universidade de Brasília. Perambulavam pelo Congresso Nacional. Nessas andanças, conheceram estudantes politizados, como Aurélio Rios – hoje subprocurador da República – e diversos jornalistas. Entre eles, Memélia Moreira, que deu a Terena o livro Enterrem Meu Coração na Curva do Rio, de Dee Brown. Foi marcante. Terena jamais esquecerá aquele momento: “Eu estava tomando consciência da questão indígena e devorei o livro em um dia”.

De início, porém, achou que a obra contava uma história que destoava da sua – e não só porque tratava de índios americanos e não dos brasileiros. “Eu tinha feito os estudos em escolas de brancos, onde me chamavam de ‘japonês’, havia cursado a Academia da Força Aérea, queria ser piloto de boeings. Eu me considerava um intelectual”, diz. Ou seja, embora procurasse se enfronhar nos debates sobre a questão indígena,Terena havia perdido o contato com o passado de seus ancestrais. Então, deu-se a luz. “A realidade que Dee Brown mostrava no livro era a de meus pais, de meus avós, dos parentes mais velhos”, entusiasma-se. “O que ele narrava reacendeu o meu espírito de luta.”

A leitura dessa obra provocou uma reviravolta na vida de Marcos Terena, hoje considerado um dos principais líderes indígenas do Brasil. Os planos de pilotar grandes aviões comerciais ficaram para trás. Foram substituídos pela militância e a luta pelos direitos indígenas. Um momento crucial foi a tomada de consciência de que os índios eram tutelados pelo Estado – uma situação jurídica que os equiparava a crianças, incapazes legalmente e que só acabou com a Constituição de 1988.

Terena buscou emprego como piloto na Fundação Nacional do Índio (FUNAI), mas só conseguiu a vaga anos depois,

quando a FAB confirmou que ele havia se formado na AFA. “Teve gente dizendo que índio não poderia ser piloto de avião, pois não teria condições de estudar e aprender a voar”, recorda, com um sorriso.

Na verdade, o passo inicial na militância foi a criação de um time de futebol, formado por indígenas de diversas nações. Era uma maneira de agregá-los. A equipe, em que Terena atuava como um esguio e ágil ponta de lança, foi pomposamente denominada União das Nações Indígenas, nome que logo trouxe problemas com os militares. “Primeiro, nos comunicaram que não poderia existir uma nação acima da nação brasileira”, lembra. “Depois, como eu era o líder do grupo, fui logo rotulado como subversivo.”

Mas a luta continuou. Em conjunto com os parceiros da UnB, ele procurou apoio em outros setores que começavam a mudar a política brasileira: “Conhecemos o Lula e os sindicalistas do ABC e decidimos que caciques, como o Raoni, o Mário Juruna e o Airton Krenak, já conhecidos pela mídia, seriam os porta-vozes das nossas reivindicações”. A estratégia era simples: os jovens coletavam as informações, sistematizavam as ideias e passavam o material para os caciques, que abriam o verbo.

Acabou dando certo. Embora o grupo não tenha conseguido eleger um único representante indígena na Assembleia Constituinte de 1986, um trabalho muito bem-feito de assessoria influiu decisivamente na elaboração dos capítulos sobre os direitos indígenas e o meio ambiente. Terena destaca que o entrosamento com os membros do Ministério Público – que também foi significativamente modificado pela Constituinte – também teve grande relevância na aprovação das propostas indígenas. “Muitos grupos conseguiram agir em conjunto e o resultado foi muito positivo”, recorda, passados 21 anos. “Não apenas para os indígenas. Mas, em muitas outras questões fundamentais, para o País e seu povo.”

Marcos Terena, certamente o indígena brasileiro mais conhecido hoje no mundo, destaca que fluxo, troca de informações e influência entre os povos indígenas estão mudando de mão. Diz ele: “No começo, fomos nós que, estimulados pelo livro de Dee Brown, aprendemos com os indígenas americanos. E vale lembrar que aquela construção da visão de mundo, da cosmovisão, segue atual. Mas, hoje, são os americanos que buscam se atua-lizar no Brasil em termos de questões ambientais e direitos indígenas, por exemplo”.


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