De olho no futuro

Um importante passo foi dado em favor do meio ambiente com a criação do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Governança Participativa, na Serra da Papuã, em Ibirapitanga (BA). O local está dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) do Pratigi, uma das cinco APAs que compõem o Baixo Sul da Bahia – região formada por 11 municípios onde vivem 260 mil habitantes, a maioria jovens. O núcleo é o resultado da parceria entre a Fundação Odebrecht e a ONU, representada na cerimônia de abertura oficial do projeto, no final de outubro, por Jose Manuel Sucre, do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais (DPADM).

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O objetivo principal do núcleo é servir como um pólo de apoio e divulgação de experiências bem-sucedidas de desenvolvimento comunitário no Brasil e em outros países da América Latina. “Poderemos analisar por que algumas comunidades tiveram sucesso. Não é o que se faz, mas como se faz”, diz Rogério Arns, responsável pelo núcleo e um dos principais especialistas brasileiros em desenvolvimento comunitário. Todas as experiências serão catalogadas para consultas e as metodologias extraídas serão repassadas ao público em cursos com a participação de especialistas mundiais. “Muitas vezes, há palestras e workshops em outros países e os profissionais e estudantes brasileiros não têm condições de participar, principalmente pela questão financeira”, lamenta Arns. A idéia é trazer esses eventos para o Pratigi. Para isso, foi construído um centro hoteleiro, um restaurante e instalações específicas para aulas teóricas e práticas, que serão oferecidas a interessados na área ambiental. Como se trata de um projeto social, todos os jovens trabalhadores do hotel e do restaurante foram captados nas cidades vizinhas e receberam treinamento com professores do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac). É o caso de Maiara dos Santos Jesus, 21 anos, que trabalha como recepcionista e hoje pensa em cursar faculdade de turismo. “Aqui é puxado, moro nos alojamentos e só vou para casa uma vez por semana, mas vale a pena”, diz.

A escolha pelo APA do Pratigi para instalar esse núcleo não foi aleatória. Além de estar em uma das regiões mais pobres do Estado, ela é a única em todo o Brasil que envolve três ecopolos distintos: cordilheiras, vale e estuário. Ela foi constituída em 1998 para proteger apenas a faixa litorânea, mas, em 2001, foi estendida até o topo da serra. “Não adiantava proteger só lá embaixo se as nascentes dos rios estão na serra. E trabalhar junto com essas comunidades é uma maneira de mostrar que é possível desenvolver uma agricultura sustentável sem prejudicar o meio ambiente. Temos de fazer um trabalho de inclusão”, acredita Maurício Medeiros, presidente-executivo da Fundação Odebrecht. O maior problema da região é o desmatamento causado pelo sistema de agricultura itinerante, no qual os pequenos agricultores vão criando novas áreas de plantação de acordo com a necessidade. Para reverter a situação, a Associação Guardiã do APA do Pratigi (AGIR) – entidade da sociedade civil responsável pela APA – criou dentro da própria sede viveiros de mudas para reflorestamento, que serão distribuídas entre os agricultores. Antes, eles receberão orientação sobre a maneira correta de plantio e como ajudar na recuperação das áreas devastadas. Até agora a Fundação Odebrecht já investiu R$ 120 milhões no projeto, que atraiu a atenção da ONU pelo seu modelo capaz de abranger, direta ou indiretamente, os Oito Objetivos do Milênio (leia box abaixo). “Isso é fantástico. É uma maneira de acabar com a pobreza de maneira permanente”, diz Jose Manuel Sucre, da ONU.

LÍDERES NATOS
Maria Celeste Pereira de Jesus tem 25 anos, é filha de agricultores, mas desde adolescente se interessa por tudo que diz respeito à sua comunidade. Muito articulada, começou a trabalhar como voluntária na cooperativa dos produtores de mandioca aos 16 anos. “Meus pais achavam aquilo um absurdo, pois eu pagava para trabalhar. Precisava pedir dinheiro a eles para pagar o ônibus e não almoçava para economizar”, lembra. Hoje é presidente-executiva do IDC. Ela formou-se em pedagogia e em 2009 pretende fazer um curso de pós-graduação em ética, educação e cidadania na Universidade do Rio Grande do Sul, em São Leopoldo. “O meu sonho foi realizado. Adoro o que eu faço, não tenho síndrome da segunda-feira. Quero fazer essa pós-graduação para poder dar aula em uma faculdade, quero passar meu conhecimento adiante.”

Juscelino de Souza Macedo, 26 anos, é amigo de Celeste. Juntos, trabalharam como voluntários, estudaram e hoje dividem as responsabilidades pela comunidade de Tancredo Neves. Mas começou sua trajetória nas salas de aula da Casa Familiar Rural de Tancredo Neves, onde se formou em técnico agrícola e hoje é presidente-executivo. Fala com orgulho de suas conquistas. “Apesar de meus pais serem agricultores, eu nunca tive vocação para agricultura. Estudei aqui, mas hoje atuo ajudando outros jovens.”

O Núcleo de Estudos e Pesquisas em Governança Participativa é apenas um dos projetos da Fundação Odebrecht, que desde 1998 se dedica a programas sociais. “Quando o doutor Norberto entrou aqui, ele quis direcionar os projetos da organização para a Bahia, sede da companhia”, diz Marta Castro, responsável pelas relações institucionais da Fundação. Entre eles estão as Casas Familiares, como aquela onde estuda André, as Cadeias Produtivas e o Instituto de Defesa da Cidadania (IDC), uma organização voltada à cidadania.

Baseadas num conceito de alternância nascido na França, as Casas Familiares estão hoje distribuídas no campo e no litoral do Baixo Sul. Na Casa Familiar Rural de Tancredo Neves (CFRTN), por exemplo, os filhos de pequenos agricultores passam uma semana em regime interno na escola, onde aprendem as técnicas de plantio e matérias de economia e administração voltadas para a realidade do campo. Depois, passam duas semanas em casa colocando em prática o que aprenderam nas aulas. “Os alunos saem como técnicos agrícolas. É um investimento na educação”, acredita Juscelino de Souza Macedo, 26 anos, ex-aluno que hoje é diretor-executivo da CFRTN. Já as Cadeias Produtivas oferecem aos agricultores uma oportunidade de se desenvolverem de maneira sustentável. Por meio de cooperativas, eles recebem orientação sobre novas técnicas de plantio capazes de aumentar a produtividade. Entre as principais cadeias no Baixo Sul estão a da mandioca, do palmito e da piaçava, muito usada em artesanato. No Campo Demonstrativo de Tecnologias para Cultivo de Mandioca da CFRTN, por exemplo, é aplicada uma técnica desenvolvida pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), na qual a mandioca é plantada na horizontal, o que resulta em maior quantidade de raiz. Depois, os pequenos produtores rurais plantam, colhem e vendem a mandioca para a fábrica de farinha. Lá, ela é processada, assim como suas folhas, que se transformam em matéria-prima para ração de animais. O cooperado recebe tanto pela raiz como pelas folhas.

METAS DO MILÊNIO
Em 2000, 191 Estados-Membros das Nações Unidas, incluindo o Brasil, comprometeram-se a cumprir as “8 Metas do Milênio” até 2015. São elas:
1. Acabar com a fome e a miséria
2. Educação básica de qualidade para todos
3. Igualdade entre sexos e valorização da mulher
4. Reduzir a mortalidade infantil
5. Melhorar a saúde das gestantes
6. Combater a aids, a malária e outras doenças
7. Qualidade de vida e respeito ao meio ambiente
8. Todo mundo trabalhando pelo desenvolvimento

O Instituto de Defesa da Cidadania (IDC), entre outras ações, oferece apoio para que as pessoas tenham acesso a documentos como certidão de nascimento, carteira de identidade e de posse de terra. “É um centro de difusão dos direitos do cidadão”, diz Maria Celeste Pereira de Jesus, diretora-executiva do IDC. Ainda há muito o que fazer para melhorar as condições de vida na região, mas alguns resultados desses projetos já são visíveis. A expectativa, agora, é que o Baixo Sul da Bahia possa ser referência mundial em desenvolvimento sustentável e berço de vários outros “Andrezões”.


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