Debate sobre mídia fica fora da mídia

Fiquei frustrado ao ler hoje a Folha e o Estadão. Não encontrei nenhuma linha falando do debate de ontem sobre os rumos da mídia, promovido pela Mega Brasil, do qual participaram seus diretores de redação, Otavio Frias Filho e Ricardo Gandour, respectivamente, além de Josemar Gimenez, do Correio Brasiliense.

Como se trata de fato raro um encontro desses, anunciei o evento na véspera aqui no Balaio, saudando o ineditismo da iniciativa (texto do dia 26, quarta-feira), no qual também publiquei um artigo de Geneton Moraes Neto, editor e repórter do “Fantástico”, da TV Globo, em que ele acusa jornalistas de assassinarem o jornalismo nas redações.

“A mídia que tudo sabe, julga e contesta, não gosta de discutir a mídia”, escrevi neste post, citando Alberto Dines. Desta vez, eles até discutiram bastante, mais de três horas, mas nada publicaram em seus veículos (não li o Correio Braziliense, que não chega por aqui).

Fosse qualquer outro setor da economia brasileira, ainda mais um ramo importante como é a indústria da comunicação num cenário de crise econômica mundial, com a participação de três dos principais protagonistas da nossa imprensa, certamente seus repórteres seriam escalados para cobrir o debate e nós todos poderíamos saber o que aconteceu em seus jornais no dia seguinte.

Aproveito este registro da não-notícia dos jornalões para tocar num assunto que ficou de fora da minha matéria de ontem sobre o debate – aliás, muito bem mediado pela Fátima Tucci -, tantos foram os temas tratados, que encheram meu bloco de anotações.

O diretor do Estadão, Ricardo Gandour, que durante dez anos trabalhou na Folha, me surpreendeu ao apresentar uma tese no mínimo bastante curiosa: a de que, em 2006, na campanha de reeleição do presidente, na falta de um projeto de oposição no país, o governo Lula resolveu antagonizar com a mídia.

Escrevi várias vezes aqui neste nosso espaço no Balaio e nas colunas do iG exatamente o contrário. Foi justamente diante da inanição do discurso e falta de bandeiras dos partidos de oposição, que setores da mídia, blogueiros e colunistas coroados resolveram assumir este papel – inclusive dando sugestões de como deveriam fazer a campanha para derrotar o governo (como não foram ouvidos, passaram a criticar também os líderes da oposição, qualificados de frouxos).

Seja lá quem for que tenha atirado primeiro, a verdade é que a disputa política, a partir de um determinado momento no primeiro mandato de Lula, passou a se dar entre governo e mídia, e não entre partidos de situação e de oposição, certamente uma anomalia do atual estágio da nossa jovem democracia.

Já quase no final do debate, Gandour surpreendeu novamente a platéia ao dizer que “os nossos jornais nunca foram tão lidos” (vendem hoje um terço do que chegaram a ter de circulação uma década atrás), para logo em seguida acrescentar: “se agregarmos a leitura na internet”. Ah, bom

Segundo Gandour, o Estadão tem hoje 7 milhões de leitores: 2,5 milhões no papel e 4,5 milhões na tela do computador. Na web, até pode ser, embora seja difícil medir (o Ibope só vai começar a fazer no próximo ano a medição de audiência da internet, hoje feita apenas nos domicílios, também nos locais de trabalho).

Mas, para se chegar a este número de leitores no papel, cada exemplar do Estadão teria que ser lido por 8 pessoas, já que a circulação média do jornal anda em torno de 300 mil. Deve dar uma briga danada para ver quem lê primeiro o caderno de esportes, que é muito bom…


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