Foto: Antonia Domingues |
RESISTÊNCIA: Dona Pequenita feliz em seu pedaço de terraem Pilão Arcado Velho (BA) |
Dona Pequenita não pára. Pequenita é pequena só no nome e no tamanho, mas é grande e forte na personalidade. Aos 66 anos, carrega uma enorme energia em sua fala. Memória viva do árido sertão nordestino, ama a terra em que nasceu: Pilão Arcado Velho (BA). Ela decidiu permanecer na cidade mesmo depois de o lugar ser esvaziado e parcialmente inundado pelo lago da barragem de Sobradinho, em 1974. Todos os moradores foram transferidos para uma nova Pilão Arcado, construída a 62 quilômetros de distância. Mas Dona Pequenita preferiu ficar na cidade abandonada, em companhia de suas lembranças e do noivo. Em uma casinha simples, perto das ruínas da Igreja Matriz, ela continua plantando e colhendo durante as vazantes do rio em “sua ilhota”, porção de terra extremamente fértil por conta das enchentes do rio. Essa moradora das margens do São Francisco não acredita que as águas vão parar de rolar na frente da sua casa. Para ela, a transposição de trechos do rio jamais vai se concretizar, assim como a inundação que não se deu por inteira, como estava previsto. Nos fins de semana, ela pega a canoa e segue para o novo Pilão Arcado a fim de rever os filhos e os netos. Mas sempre retorna à sua casa, apesar dos apelos insistentes da família.
Depoimento em 7 de dezembro de 2007
Origens
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“Eu nasci no dia 12 de outubro de 1941. Fui registrada como Maria do Socorro. O apelido de Dona Pequenita foi minha mãe que colocou. Fui criada e criei meus filhos tudo na roça, na beirada do São Francisco. (…) Eu era a mais velha de todas e tive 12 filhos, nove ‘home’ e três ‘mulé’. A inundação da cidade pra uns foi bom e pra outros não valeu de nada. Eu queria ficar mesmo no meu Pilão Velho. Como estou, nunca abandonei ele. Toda a vida aqui foi ótimo de morar, porque era todo mundo unido, ninguém tinha briga contra os outros. Se uma caísse doente, e as outras tivessem na casa de farinha rapando mandioca, rapava o balaio da doente, ajuntava e espremia a massa dela. Nóis era unida. Trabalhando na roça, eu fui sofrida. (…) Nóis plantava milho, feijão de corda, de arranca, abóbora, a melancia e a batata. Até hoje nóis planta. (…) Tinha muita casa aqui perto da Igreja (…) essa Igreja era rica, a Coroa do Santo Antonio era de ouro.”
A desocupação de Pilão Arcado
“Saiu porque os chefe tirou, veio na casa da gente, pra indenizar as casa da gente e ninguém queria sair. Porque nóis sabia que Pilão Velho não ia cobrir. Eles disseram que era pra nóis toda sair. Aí indenizaram o povo, meteram a mão, derrubaram tudo as casa, né? Pra botar outra na cidade nova. Eu mesmo não atulero aquele lugar, não gosto dele não. Vou porque tem meus filho lá.”
A transposição do Rio São Francisco
“Não, já ouvi essa história, mas eles não tiram, que só quem tira água aqui do rio é Deus. Eles sabem fazer barragem, mas só quem sabe fazer água é Deus. Não quero sair daqui nada, deixa eu ficar. Ói, aqui eu crio meu porco, minha galinha, tá escutando? Crio o que Deus quiser me dar eu crio aqui também e serve a mim e meus filhos. Tinha um movimento de barco, agora tem o rebocador, não pareceu mais, também o rio tá seco. Agora que ele começou a dar uma enchidinha, mas ele tava de um jeito que você passava aí era encaiando. (…) Mudou foi muito (…) o Rio de São Francisco não dá mais o que ele dava, não. Cadê o peixe? Ela atrapalhou foi muito, esse tal de barragem que eles fizeram, atrapalhou muita coisa, aqui no Pilão Velho.”
Assista ao vídeo com Dona Pequenita
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