Edificando o olhar

Quem folheia o livro Capital – São Paulo e seu Patrimônio Arquitetônico, do fotógrafo Juan Esteves e do curador Antonio Carlos Abdalla, tem dificuldade para identificar à primeira vista a maioria dos prédios, velhos conhecidos dos paulistanos, retratada em belíssimas fotos em preto e branco.

Com status de obra de arte, as 101 imagens do livro revelam as construções em todo seu esplendor, livres da poluição visual, como fios elétricos, postes, placas e aparelhos de ar condicionado, graças a uma pequena ajuda da tecnologia. Por meio do Photoshop (programa de edição de imagens), Esteves conseguiu extrair das fotos todos esses “ruídos”. O estranhamento também se dá, segundo ele, pela falta de costume que as pessoas que moram em São Paulo têm de olhar para cima. “Creio que a função da fotografia é penetrar essa trama e revelar o que a maioria não vê, quase uma restauração de um objeto digno de preservação e estudo”, diz ele.
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O livro foi feito a quatro mãos e coube ao curador Abdalla elaborar o roteiro dos prédios que seriam fotografados. Para chegar ao resultado, foi realizado um grande volume de fotos. “Três vezes mais do que o publicado”, afirma.

Capital – São Paulo e seu Patrimônio Arquitetônico traz fotografias do chamado “miolão”, que vai da Praça da Sé ao Largo do Arouche. Seria, digamos, o Centro Velho e parte do Novo. Isso ajuda a contar a história da cidade. E como não poderia deixar de ser, a imagem que abre o livro é a do Pátio do Colégio, onde a metrópole nasceu de uma vila de pau a pique. Há um projeto de uma segunda obra a caminho, que pretende mostrar a parte restante do Centro.

Região esquecida
No início do livro, Abdalla elenca alguns fatores que fizeram com que o Centro de São Paulo fosse abandonado e começasse a se deteriorar ao longo das últimas décadas do século XX. Fatores que vão desde a sede insaciável pelos modismos do pós-Modernismo à especulação imobiliária desenfreada com o objetivo de ampliar os serviços das classes A e B, além da perpetuação de administrações municipais omissas e da falta de cultura geral.

“Também é importante lembrar um fenômeno chamado Morte do Centro, que aconteceu nas Américas. Todos os centros de cidades tendem a morrer. É a civilização do carro. Os centros são ou coloniais ou estão na década de 1920 e não foram feitos para comportar essa civilização”, afirma Abdalla. “Os centros de Nova York, Roma e Londres têm garagem? Não, mas a cabeça do brasileiro é: ‘Cadê a garagem?’. Não percebem que a melhor malha viária de transporte coletivo está no Centro. Tem outra coisa engraçada. Por que o turista brasileiro quando vai para esses lugares consegue admirar os centros, mas quando está em seu próprio país, não?”, questiona.

Abdalla também tem outra teoria sobre a deteriorização da região, na qual culpa os artistas da Semana de 22. “Os modernistas conviveram com a cidade eclética, neoclássica e colonial. Mas insistiram em só valorizar o colonial brasileiro como verdadeiro espírito da terra”, diz. “Eles influenciaram uma geração de intelectuais que mudaram a cara das construções, que, por fim, naufragaram nos anos 1950 com o domínio absoluto e injusto de Oscar Niemeyer”, completa.

» Capital – São Paulo e seu Patrimônio Arquitetônico, de Juan Esteves e Antonio Carlos Abdalla, Produtora Atitude Brasil, 254 páginas. Vendas
apenas pelo site www.operaprimacultural.com.br.

O elevado da discórdia


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