Em 21 dias, governo Temer acumula recuos em todas as áreas

Logotipo inicial do governo Temer, calcado na bandeira usada na ditadura - Foto: Divulgação
Logotipo inicial do governo Temer, calcado na bandeira brasileira usada na época da ditadura militar – Foto: Divulgação

Desde que tomou posse, em 12 de maio, o governo Michel Temer vem colecionando uma série de recuos. Talvez para se distinguir do governo Dilma Rousseff, considerado intransigente, a gestão do interino adotou um perfil diametralmente oposto: muda de posição sobre um assunto assim que surgem as primeiras críticas ao interino.

O último recuo aconteceu nesta quarta (1º): o ministro das Cidades, o tucano Bruno Araújo (que havia revogado a contratação de 11.250 moradias do Minha Casa Minha Vida no dia 18 de maio) anunciou a retomada da contratação de residências nessa modalidade logo depois que o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto) ocupou a sede da Presidência da República em São Paulo.  

Antes da aprovação do impeachment de Dilma no Senado, Temer sinalizou que montaria “um ministério de notáveis”. Mas fracassaram todas as tentativas de nomear intelectuais, como o médico Raul Cutait, e o presidente interino entregou as pastas aos políticos indicados pelos partidos. Dentre eles estavam três nomes citados nas investigações da Operação Lava Jato (Romero Jucá, Henrique Eduardo Alves, Geddel Vieira Lima) e quatro deputados incluídos na lista da Odebrecht: Mendonça Filho (DEM), Raul Jungmann (PPS), Bruno Araújo (PSDB) e Ricardo Barros (PP).

A nomeação de tantos políticos investigados logo trouxe problemas: Romero Jucá caiu após ter sido flagrado dizendo que era preciso derrubar Dilma Rousseff para deter a  Lava Jato: “Tem que resolver essa porra. Tem que mudar o governo para estancar essa sangria”, disse Jucá. Uma semana depois caiu o ministro da Transparência, Fabiano Silveira, depois de ter feito críticas à Procuradoria-Geral da República. No caso da Silveira, sua queda foi selada por um protesto de servidores da extinta Controladoria-Geral da União (CGU), que lavaram as escadas do prédio que abriga o órgão.

Ainda na fase de montagem do ministério, Temer desistiu de nomear o deputado Newton Cardoso Jr. (PMDB), filho do ex-governador mineiro Newton Cardoso, para o Ministério da Defesa, o que motivou o ex-governador a dizer que, se o presidente interino decidisse visitar Minas, seria “recebido a pontapés”. Temer também desistiu de nomear o jurista Antonio Claudio Mariz de Oliveira para o Ministério da Justiça quando foi lembrado de que ele tinha assinado um manifesto criticando a Lava Jato.

O número de pastas do novo governo oscilava conforme o dia. Temer anunciou inicialmente que cortaria 11 ministérios. Dadas as dificuldades para atender as muitas promessas aos aliados, ele voltou atrás e disse que cortaria só três pastas. Criticado pela grande imprensa, cortou nove. Uma vez concluída a montagem do governo, os protestos dos artistas levaram Temer a recuar da decisão de extinguir o Ministério da Cultura.

Incomodado com as críticas a um ministério formado apenas por homens, Temer a princípio culpou seus aliados, mas depois tentou colocar uma mulher na Cultura, mas fracassou. No segundo escalão, porém, conseguiu emplacar uma deputada na Secretaria de Políticas para as Mulheres. Só que a indicação de Fátima Pelaes (PMDB-AP), evangélica, acabou sendo muito criticada pelos movimentos feministas em razão de sua posição contrária ao aborto, mesmo nos casos de gravidez decorrente de estupro. As reações provocaram novo recuo: a secretária divulgou nota afirmando que “a mulher vítima de estupro, que optar pela interrupção da gravidez”, terá total apoio do Estado.

Nas outras pastas, os novos ministros não cessavam de emitir declarações polêmicas. O novo titular da Justiça, Alexandre de Moraes, disse que o governo não precisaria nomear para a Procuradoria-Geral da República o nome mais votado no Ministério Público Federal. Assim que a entrevista de Moraes foi publicada, Temer se apressou em divulgar uma nota afirmando que manteria o critério de nomear o nome mais votado.

A situação se repetiu no Ministério da Saúde. O novo ministro, Ricardo Barros (PP), que teve sua campanha a deputado parcialmente financiada por operadoras de planos de saúde, disse que era preciso cortar o SUS (Sistema Único de Saúde): “Nós não vamos conseguir sustentar o nível de direitos que a Constituição determina. Em um determinado momento, vamos ter que repactuar”. Segundo ele, “quanto mais gente puder ter plano, melhor”. No dia seguinte, Barros voltou atrás: “O SUS está estabelecido, estamos atendendo o máximo de pessoas possíveis, com o maior número de procedimentos que podemos autorizar e remédios, mas evidentemente que isso é insuficiente para a proposta constitucional do SUS, que é saúde universal para todos”.

Na parte econômica, o governo assumiu prometendo reequilibrar o Orçamento. No dia 14 de maio, o novo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, admitiu recriar a CPMF para reduzir o déficit do governo. A proposta foi atacada dentro do próprio governo. O chefe da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, afirmou que não era a hora de recriar a CPMF, e o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, outro aliado de Temer, também fez críticas à proposta. O governo então parou de falar no assunto.

Sem a CPMF, o governo cogitou aumentar a Cide (Contribuição de Intervenção de Domínio Econômico), cobrada sobre os combustíveis, mas desistiu em seguida.

As propostas de cortes no Orçamento Federal também não prosperaram. Em vez de promover um ajuste profundo, Temer pediu para que o Congresso Nacional elevasse a previsão de déficit para R$ 170 bilhões, um número muito acima do que pedia o governo Dilma (R$ 96,7 bilhões). Em algumas pastas, os novos ministros chegaram a dizer, com a nova meta, nem seria preciso cortar nada.

As promessas de austeridade fiscal sofreram um novo abalo: para não desagradar os ministros do Supremo Tribunal Federal, o governo deu seu aval à aprovação de um megapacote de reajustes salariais que custará pelo menos R$ 58 bilhões até 2019. Todos esses aumentos tinham sido barrados por Dilma, antes criticada por sua frouxidão fiscal.

Na esfera política, Temer tentou nomear o deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ) como líder do governo na Câmara. Os aliados do presidente afastado da Casa, Eduardo Cunha, reagiram, e Temer teve de indicar André Moura (PSC-SE). Moura é réu em três ações no STF e responde a outros três inquéritos (um por tentativa de homicídio e outro por envolvimento na Lava Jato). Já foi condenado pelo Tribunal de Contas da União quatro vezes por irregularidades na gestão de dinheiro público.

Nem o logotipo do governo interino permaneceu intacto: a imagem divulgada inicialmente pelo novo governo tinha apenas 22 estrelas, pois tinha sido calcada numa bandeira brasileira da época da ditadura militar (1964-1985). Após as críticas, o publicitário Elsinho Mouco disse que aquilo era apenas “um layout” ainda não finalizado e refez o logotipo, agora com as 27 estrelas da atual bandeira.


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