Emidio não teme Palocci

Emidio de Souza tem 50 anos, quatro filhos e um a caminho. Nasceu em Núbia Paulista, pequena cidade do Estado de São Paulo, perto de Andradina, foi criado em Marília e depois mudou-se para Osasco, onde se formou advogado. Antes, foi torneiro mecânico e hoje exerce a função de prefeito. Emidio é do PT e pretende concorrer ao cargo de governador do Estado de São Paulo. Ele recebeu o repórter da Brasileiros em seu gabinete em Osasco, cidade de 718,6 mil habitantes, com PIB de R$ 17,7 bilhões. A seguir sua entrevista.

Brasileiros – O senhor quer ser governador de São Paulo?
Emidio de Souza – Quero. Eu estou tendo uma experiência muito boa como prefeito de Osasco, que é uma das maiores cidades do Estado e do País. E acho que é hora do PT botar alguém com outra cabeça para poder enfrentar os velhos problemas do Estado.

Brasileiros – O que diz o presidente Lula sobre suas pretensões? O senhor já conversou com ele sobre isso?
E.S. – Conversei com vários assessores dele, e ele sabe, pois é um homem bem-informado e a minha candidatura tem muito apoio dentro do PT. Como ele me conhece e trabalha com vários cenários, acho que é bom ele saber que pode trabalhar também com o cenário do meu nome como candidato a governador.

Brasileiros – Como é praxe por aqui nos períodos que antecedem eleições, os ânimos estão se acirrando e as regras do jogo político vêm sendo jogadas no lixo, tanto pelos partidos como por boa parte da imprensa. Como é que o senhor vê o PT e os episódios recentes no Congresso Nacional?
E.S. – Eu acho que a elite brasileira nunca se conformou com a eleição do Lula. Por mais que o País venha exibindo índices que há tempos perseguia e que, vamos dizer, vem demonstrando uma capacidade gerencial importante, projetando o Brasil de forma tão autônoma no cenário internacional, e gerando emprego como nunca. A verdade é que os números mostram que o País está indo bem, ao contrário do período dos tucanos. Ou seja, eles estão tentando se apegar a qualquer coisa para poder desgastar o presidente Lula. Então, essa crise do senado tem um bocado desse interesse, de desgastar o presidente. Hoje, o que ganhou importância é se a secretária (ex-secretária da Receita Federal Lina Maria Vieira) foi ou não foi recebida pela Dilma (Rousseff, ministra-chefe da Casa Civil). Não se quer discutir os rumos do País. Olha, se o PSDB e o Democrata tivessem algum apego à ética tal como ela é entendida, eles já tinham botado para fora a governadora Yeda Crusius do Rio Grande do Sul, tinham expulsado quem comprou deputados para aprovar o segundo mandato do Fernando Henrique (Cardoso), teriam aprovado CPIs (Comissão Parlamentar de Inquérito) em São Paulo.

Brasileiros – O senhor, como Lula, também é ex-torneiro mecânico?
E.S. – Sou ex-torneiro mecânico, trabalhei nisso o tempo todo e em várias empresas. Depois fui vereador, fui deputado. Sou filho de pai e mãe cearenses, da cidade de Icó. Éramos 14 irmãos e meu pai foi um imigrante que veio para cá nos anos 1950. Eu nasci em São Paulo, no interior, em Núbia Paulista, perto de Adamantina. Fui criado em Marília e depois, ainda garoto, vim para Osasco. Mais tarde me formei em Direito aqui em Osasco. Na universidade de Osasco.

Brasileiros – E a política?
E.S. – Entrei na política em 1980. Início da fundação do PT. No início, fui um filiado comum, até 1988. Nesse ano, eu fui candidato a vereador pela primeira vez, me elegi e daí tive uma carreira, vamos dizer, mais propriamente política. Mas fiz aquele caminho natural de quem era sindicalista na área metalúrgica, de quem trabalhava no movimento sindical e vi no PT uma oportunidade de crescer. Então, se eu puder resumir, sou fruto daquela efervescência política que houve no Brasil no fim dos anos 1970, começo dos anos 1980, final da ditadura militar. Eu nasci exatamente naquele momento para a política.

Brasileiros – De lá para cá houve uma forte deterioração da imagem da classe política perante a população. O que o senhor acha disso?
E.S. – Eu vejo de maneira muito preocupante. Vejo mesmo, porque acho que nós temos instituições que precisam ser melhoradas, o senado é uma delas…, independentemente do que aconteceu, do que possa acontecer, acho que é evidente que precisa de um novo padrão de relacionamento entre representantes e representados. Eu sou atento a isso, acho que nós não podemos perder de vista o que vem acontecendo e aprender com essas lições. Quer dizer, quando se desvaloriza as instituições democráticas, a própria democracia passa a correr risco. Então, acho que é hora de a gente valorizar os espaços democráticos, e as eleições vão a cada ano depurando quem está na política, vamos dizer, por vontade, por determinação, por desejo mesmo de mudar as coisas e quem está na política, por benefício pessoal.

Brasileiros – Historicamente, São Paulo é bastante avessa ao PT, avessa ao Lula e o senhor tem uma carreira muito parecida com a dele, inclusive é ex-metalúrgico. Como é que o senhor pretende quebrar esse preconceito?
E.S. – Eu acho que apesar de todo o preconceito que setores da mídia tentam impingir ao PT no Estado de São Paulo, o partido vem conquistando cada vez mais espaços importantes aqui. Nós governamos a capital já duas vezes; em Campinas e Osasco pela segunda vez; em São Bernardo, Santo André, Cubatão e Diadema, as grandes cidades do Estado, o PT já governou ou governa. Portanto, acho que não há uma rejeição em si dentro do eleitorado ao PT, há uma tentativa de um hegemonismo do PSDB em São Paulo. Eu me lembro sempre que São Paulo está passando por um processo que é uma das mais longas dinastias regionais que se tem no Brasil hoje, sabe? O Brasil superou a oligarquia na Bahia depois de quarenta anos, superou no Maranhão, superou no Ceará, superou no Pará, superou em vários Estados, e São Paulo, desde 1982, basicamente é comandada pelo mesmo grupo político. (André Franco) Montoro que era do PMDB na época tinha o (Orestes) Quércia como vice, o secretário de planejamento deles era o Zé (José) Serra, o secretário de educação dele era o Paulo Renato, os mesmos de hoje. O líder do governo na assembleia legislativa era o Aloysio Nunes Ferreira, o secretário de transportes do Quércia era o Alberto Goldman. Depois, o Aloysio foi vice do Quércia, foi vice do (Luiz Antonio) Fleury, foi candidato a prefeito de São Paulo, quer dizer, você está numa linha contínua há exatamente 27 anos no Estado de São Paulo. Então, acho que já tiveram tempo suficiente para resolver o problema da educação, não resolveram; do saneamento básico, não resolveram; da saúde e da segurança pública, e não resolveram.

Brasileiros – Mas o senhor não acha que o PT sofreu um impacto grande nesses últimos tempos em termos de imagem?
E.S. – Acho que o PT vem sofrendo impactos a vida toda e vem crescendo. Eu diria o seguinte, o pior ano da vida do PT foi 2006. Após o escândalo do mensalão em 2005, em 2006 nós reelegemos o Lula, nós elegemos quase 90 melhores deputados federais, elegemos governadores de Estado, elegemos senadores… Quer dizer, a crise de hoje é infinitamente menor do que foi a do mensalão em 2005. Hoje, o País tem resultados muito melhores. Nós estamos falando de um País que superou a crise financeira internacional, descobriu petróleo no pré-sal, conseguiu dar um sentido de geração de emprego, distribuição de renda para a economia brasileira. Nós já tivemos gente saindo do PT desde que ele foi fundado. Tem gente que sai, tem gente que entra e o PT prossegue o seu caminho.

Brasileiros – O senhor concorda que o presidente Lula é uma coisa e o PT é outra? Que o presidente Lula está acima do PT?
E.S. – Veja bem, não se trata de se estar acima ou não, mas evidentemente, o PT é o partido com maior preferência no Brasil todo, sempre foi, e ele não chega a 30% de preferência. O presidente Lula tem 80% de aprovação. Isso acontece só com ele? Não. Em Osasco também o PT tem a preferência como partido em 22%, 23%. Eu fui eleito com 50 e poucos por cento, 54% dos votos no primeiro turno. Quer dizer, o governante sempre abarca um setor maior da sociedade, todo mundo que votou em mim não é petista, todo mundo que vota no Lula não é petista. Um governante sempre conversa com o setor maior da sociedade.

Brasileiros – Como é que o senhor acha que governaria São Paulo?
E.S. – Não há explicação para a educação de São Paulo, com a nossa força econômica, ter chegado aonde chegou. Nós temos um orçamento de 120 bilhões de reais, o segundo maior do País, só perde para a União. Não há explicação para o policial militar de São Paulo ter o nível salarial que ostenta. É pior do que a maior parte dos Estados pobres do País. Acho que precisa de uma política habitacional para ser usada, de uma política habitacional inclusiva e que melhore a qualidade do ensino, de política de desenvolvimento regional que cuide de regiões deprimidas economicamente do Estado. Nós temos ilhas de prosperidade, como São José dos Campos, Campinas, Ribeirão, São José do Rio Preto, ABC Paulista, essa região de Osasco, Barueri. Agora você tem regiões no Estado, como a região da Alta Paulista, do Vale do Ribeira, a periferia da Grande São Paulo como um todo, que convivem com níveis de violência e pobreza e de exclusão social inaceitáveis para um Estado rico como São Paulo. Então, a ideia aqui é um projeto semelhante ao que o Lula fez ao País, quer dizer, aproveitar a força econômica do Estado para fazer a vida melhorar.

Brasileiros – O que o senhor fez aqui em Osasco que o colocaria como bom candidato para governar um Estado complexo como São Paulo?
E.S. – É difícil para quem governa apontar onde ele acha que foi melhor. Mas vejo um nítido destaque na área de educação, na geração de emprego e renda. Houve uma dinamização econômica, com novo código tributário, atração de empresas e toda uma política de renovação urbana, desde obras de infraestrutura, novas avenidas, mais cuidado com o meio ambiente. E tudo isso tem produzido uma cidade com melhor qualidade de vida. Nós fizemos aqui coisas muito interessantes, relacionadas ao Bolsa Família.

Brasileiros – Do que se trata?
E.S. – O Bolsa Família é um programa federal elogiado internacionalmente, mas acusado de dar o peixe, mas não ensinar a pescar. Aqui em Osasco, além de dar o peixe, nós estamos ensinando a pescar. Por exemplo, incentivamos a profissionalização das pessoas do Bolsa Família e demos oportunidade de emprego para eles. Uma das cooperativas que criamos aqui, uma das maiores, é para produção de uniformes escolares. Ela produz uniforme para os próprios alunos da rede municipal de ensino. E isso é feito com mulheres que eram do programa Bolsa Família, que foram treinadas, capacitadas, saíram do Bolsa Família e hoje não recebem mais os benefícios do programa.

Brasileiros – Osasco esteve nos noticiários negativamente com a questão da gripe suína.
E.S. – A questão é que Osasco foi uma das primeiras cidades a ter pessoas contaminadas, a ter óbitos na questão da gripe suína. Hoje não há mais isso. Ao contrário, nós tomamos uma série de medidas contra a gripe que também serviram de exemplo para outras cidades.

Brasileiros – O que falta fazer em Osasco ainda?
E.S. – Eu acho que muita coisa. Ainda precisamos prosseguir nos esforços para melhorar a qualidade da educação e da saúde prestada à população, serviço básico na área de saúde, faltam mais investimentos na área de infraestrutura de desfavelamento. Nesse momento, por exemplo, estamos colocando em andamento os projetos que achamos que afetam a qualidade de vida de maneira mais direta, como a poluição visual, a poluição sonora. Também temos um plano-diretor para criar uma ciclovia na cidade, o que também garantirá melhor qualidade de vida, e uma mobilidade urbana de maneira mais adequada. Ou seja, investimentos em lazer, cultura, esportes, mobilidade… Tudo isso me parece que é um desafio para esse segundo mandato também.

Brasileiros – O senhor quer ser candidato ao governo de São Paulo mesmo com Palocci na disputa? Depois de se livrar no STF (Supremo Tribunal Federal), parece que ele é o preferido no seu partido.
E.S. – Primeiro, acho que é um sinal de vitalidade do PT você ter várias pessoas. Nós temos cinco ou seis nomes em condições de chegar a candidato para governador. O meu é um deles. Eu tenho uma experiência diferente, venho de experiência executiva e, além de política parlamentar, venho de uma experiência de governo, experiência administrativa que acho que conta muito em uma eleição de governador. O PT tem nomes mais conhecidos como é o caso da Marta (Suplicy), do (Aloizio) Mercadante e temos nomes menos conhecidos, mas com potencial de crescer. Portanto, não vou fazer campanha contra ninguém do PT, mas o meu nome vai ficar à disposição do partido se ele quiser uma candidatura renovada para se apresentar para a sociedade, um perfil mais adequado para esse momento. Mas repito, não vou fazer nada contra a vontade do presidente Lula. Se ele achar que o caminho que temos de seguir em São Paulo é outro, vamos por outro caminho. Agora, a minha candidatura serve para alertar o presidente também do quanto nós precisamos prestar atenção na política regional, na política do Estado.


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